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Jessica da Silva Correia de Oliveira
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Narrativas sobre política e a
política das narrativas: reflexões
sobre o uso de abordagens
narrativas no estudo e no ensino
de Relações Internacionais
1
Narratives about politics and the
politics of narratives: reflections on
the use of narrative approaches in the
study of International Relations
DOI: 10.21530/ci.v15n3.2020.996
Jessica da Silva Correia de Oliveira
2
Resumo
O uso de abordagens narrativas tem ganhado crescente atenção
nos estudos de RI. Uma das principais promessas é mobilizar
uma diversidade maior de interpretações e explorar a política da
contestação de maneiras que corroborem a visão das RI como reflexo
da multiplicidade de mundo(s) da política internacional e global. Este
artigo traz um mapa geral dos usos de abordagens narrativas nas RI,
conectando-as à ideia de “mundanidade”, avançada por Edward Said
em sua discussão sobre a política da escrita e da representação na
academia. Com isso, busca-se situar essa “virada narrativa” como
parte das complexidades de um contexto mais amplo de crise nas
1 Parte das reflexões contidas aqui foram inicialmente articuladas na tese de
doutoramento intitulada “(Re)imagining resistance: narratives from postcolonial
Maghreb and the limits of IR”, cuja pesquisa foi possibilitada pelo financiamento
da CAPES, FAPERJ e CNPQ.
2 Doutora em Relações Internacionais pela Pontifícia Universidade Católica do Rio de
Janeiro — PUC Rio. Professora no curso de Relações Internacionais da Pontifícia
Universidade Católica de Minas Gerais — Poços de Caldas, Brasil.
(jessicascoliveira@gmail.com); ORCID: https://orcid.org/0000-0002-0039-9416
Artigo submetido em 28/09/2019 e aprovado em 10/02/2020.
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formas eurocêntricas de conhecimento e representação. Observa-se um movimento duplo
de desencantamento e reencantamento intelectual que, por sua vez, sugere a produtividade
desse desconforto frente às práticas de representação e ao lugar do “eu” na escrita acadêmica.
Considerando essas reações e a busca compartilhada por uma relação mais empática entre
pesquisador(a) e objeto, acadêmico(a)s e público em geral, professore(a)s e aluno(a)s, a
última seção descreve brevemente a experiência do uso de abordagens narrativas em sala
de aula, e como aluno(a)s se apropriaram (ou não) da narrativa para conferir sentido ao
lugar do “eu” nas RI.
Palavras-chave: RI Narrativa; Autobiografia; Metodologia; Edward Said.
Abstract
Narrative strategies have gained growing attention in IR. One key promise is mobilizing a
diversity of interpretations and exploring the politics contestedness in ways that support
the view of IR as focused on the multiplicity of the world(s) of international and global
affairs. This article brings a broad map of the use of narrative approaches in IR and
connects it with Edward Said’s notion of “worldliness” in order to highlight the political
aspects of writing and representation within academia. It situates this “narrative turn”
within the complexities of a broader context of crisis in Eurocentric forms of knowledge
and representation. In addition, it reveals a double movement of scholarly disenchantment
and re-enchantment that signals towards the productivity of intellectual unease about
representational practices and the place of the “I” voice in academic writing. Bearing
in mind these reactions and shared pursuit of a more empathetic relationship between
researcher and researched, scholars and the public in general, teachers and students,
I thus briefly tell the experience of openly discussing and practicing a narrative approach
in the classroom and how students tended to engage (or not) with narrative as a way of
making sense of their “I” in IR.
Keywords: Narrative IR; Autobiography; Methodology; Edward Said.
Introdução
O mundo da política internacional é repleto de narrativas. Quando o governo
Bush justificou a chamada guerra ao terror, logo após os atentados de 11 de
setembro de 2001, uma história tão poderosa foi contada que nossa visão sobre
o mundo está até hoje, em muitos aspectos, condicionada pelo imaginário criado
em torno dela (Campbell et al 2007; Wibben, 2011). Em tempos de Trumpismo
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e a construção diária de muros reais e imaginados para conter “ameaças” aos
Estados Unidos, ao American-way-of-life e ao Ocidente; de mídias cada vez
mais velozes; do intenso movimento de indivíduos e populações em meio a
uma babel de motivações, necessidades e justificativas mais ou menos aceitas
pelas sociedades receptoras; de discursos concorrentes acerca do papel humano
nas mudanças climáticas e da insustentabilidade do modo de consumo atual
sobrepondo-se a imagens e dados sobre locais onde condições insalubres ou o
aumento do nível do mar já inviabilizaram a habitação humana; da constante
mobilização de imagens da violência e da desigualdade material persistentes em
certas partes do globo para, de um lado, sensibilizar e angariar doadores para
campanhas humanitárias e, de outro, servir de prova do caráter não-civilizado
e atrasado de certas sociedades justificando assim intervenções e uso da força,
é possível afirmar: seja em forma, seja em conteúdo, narrativas importam.
Em sua constituição como disciplina, as RI se baseiam em um conjunto de
narrativas sobre a formação e expansão do sistema/sociedade internacional e
sobre como os atores internacionais desempenham seus papeis nesse ambiente.
Como Bartelson (1995), Inayatullah & Blaney (2004), Walker (1993), Weber
(2009) e outros destacaram, pode-se sugerir que o campo das RI é “produto
de narrativas concorrentes, algumas das quais se tornaram tão dominantes
que foram [...] consideradas a única explicação possível para as realidades e a
natureza da vida política internacional ”(Moulin 2016, 139). Ao refletir sobre as
restrições à “nossa capacidade de imaginar” e falar sobre o mundo dos assuntos
internacionais e globais e o tipo de reação que foi sendo gerada em abordagens
mais críticas da disciplina, Wanda Vrasti sintetiza: “[a]s histórias que esse campo
gosta de contar (...) (l)idam basicamente com equilíbrio de poder, alianças de
segurança e cálculos geopolíticos em um mundo de recursos limitados e pouca
socialização”, configurando-se em narrativas “com heróis e vilões extraídos
de um elenco previsível de atores nacionais, alianças regionais e organizações
internacionais”(2017, 273, tradução livre). Ainda nas palavras de Vrasti, se, de
um certo ângulo, o resultado é uma escrita engessada e marcada pela estase
e repetição derivadas dessa imagem específica do internacional, de outro, a
linguagem da objetividade e autoridade científica pode simplesmente silenciar
pontos de vista e minar outras possibilidades do político.
A dimensão das narrativas — ou seja, das histórias que contamos/são
contadas sobre o mundo — e a mobilização consciente de estratégias narrativas
— como autobiografia, autoetnografia, storytelling, ficção etc. — vem ganhando
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crescente atenção nos estudos da política internacional e global (Brigg, Bleiker
2010; Dauphinee 2010; 2013a; 2013b; 2015; Doty 2004; 2010; Inayatullah 2011;
Mayer 2017; Muppidi 2013; Park-Kang 2015; Shindo 2012; Vrasti 2010; Wibben
2011). Histórias, para além das que ouvimos de diplomatas, líderes políticos,
pensadores canônicos, teóricos, e grande mídia, são trazidas para o centro do
palco de maneira a expor os diversos mitos que moldam o mundo da política
internacional, assim como a violência e os silenciamentos por eles encorajados.
Uma das principais promessas daquilo que Elizabeth Dauphinee (2013a) e outros
vêm chamando de “RI Narrativas” (Narrative IR) é mobilizar maior diversidade de
interpretações e explorar a política da contestação, de maneiras que corroborem
a visão das RI como um campo disciplinar dedicado ao estudo da multiplicidade
do(s) mundo(s) internacional e global.
Enquanto método para refletir/escrever sobre os objetos, sujeitos e temas de
estudo das RI, o emprego de abordagens narrativas pode ser um caminho para
pesquisadores, professores e estudantes se engajarem com aquilo que Edward
Said descreveria como os aspectos “mundanos” das teorias e conceitos de RI
— que, como se sabe, podem, por vezes, pecar pelo caráter excessivamente
abstrato, convoluto e desconectado das particularidades de tempo e espaço e
da materialidade do mundo não pouco violento da política. Além disso, essas
abordagens vêm para expor a natureza narrativa das reivindicações de verdade,
contidas no discurso acadêmico, encorajando engajamentos mais profundos
com a questão da narrativa — seja como substrato escrito, oral ou mesmo
sensorial, mobilizado pelos atores sociais para dar sentido às suas ações, seja
como formação política mais ampla convertida em “histórias de conhecimento”.
Este artigo visa examinar como a questão da narrativa tem sido incorporada
nos estudos de RI. A primeira seção explora alguns usos recentes de abordagens
narrativas em RI, discutindo algumas das suas implicações epistemológicas
e metodológicas para o estudo da política internacional e global. A segunda
seção busca conectar esse mapeamento e alguns aspectos das problematizações
acerca da escrita e da política de representação na academia com o conceito
de “mundanidade” de Edward Said (1983). Argumenta-se que, ao lermos esse
mapa em paralelo às reflexões de Said sobre a relação texto-mundo, é possível
situar essa guinada mais recente em direção às narrativas em um contexto mais
amplo e complexo de crise nas formas eurocêntricas de representação e produção
do conhecimento — bem como da subalternização de saberes daí derivada.
Nesse sentido, a noção de mundanidade da crítica nos permite compreender
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melhor as reações e a busca compartilhada por uma relação mais empática entre
pesquisador e objeto, acadêmicos e o público em geral, professores e alunos. Por
fim, a terceira seção trata da experiência do uso de abordagens narrativas em
sala de aula e como alunos e alunas de graduação se engajaram (ou não) com
narrativas e o exercício proposto de pensar o lugar do “eu” nas RI.
A questão da narrativa em RI: engajamentos recentes
A politização da linguagem e das práticas textuais, ou mesmo a problematização
de categorias interpretativas que são fundamentais para o pensamento social —
como gênero, classe, raça, poder, ideologia
3
etc. — não é algo novo nos estudos
de RI. Como se sabe, abordagens feministas, pós-coloniais e pós-modernas foram
pioneiras nos usos de uma abordagem discursiva e na articulação de estratégias
metodológicas alternativas em suas críticas à ciência, incluindo, é claro, as Ciências
Políticas e as RI. A partir da combinação de ideias que emergiram nas interseções
dos campos da Literatura, Filosofia, Antropologia e Estudos Culturais, para citar
alguns, essas vozes críticas problematizam as RI como campo de investigação que
apaga o status político das mulheres, dos povos colonizados e indígenas, e dos
objetos racializados como secundários, ‘anteriores’ ou situados ‘fora’ da política
e da normatividade estatal”(Vrasti 2017, 273, tradução livre). As estratégias e
objetivos mais específicos dessas abordagens são tão múltiplos e amplos quanto
as definições que podemos fornecer para o próprio termo “narrativa”. Contudo,
um ponto importante de conexão entre elas reside nas suas tentativas de articular
epistemologias e metodologias que reconhecem a complexidade, contingência,
multiplicidade e ambiguidade das realidades políticas.
Em um balanço sobre os compromissos com “desenvolvimentos metodológicos
e narrativos críticos em RI”, resultantes das discussões em workshop realizado na
Universidade de York (Canadá) em 2012, Elizabeth Dauphinee (2013a) relembra
como o tipo de abordagem narrativa reflexiva, inaugurado no emblemático artigo
de Carol Cohn de 1987, acabou esquecido por pelo menos duas décadas. Neste,
a teórica feminista traz um relato brilhante sobre as práticas e a linguagem
empregada por profissionais de um centro de defesa nuclear estadunidense, que
3 Sobre abordagens discursivas nos estudos de RI, ver: Campbell (1992), Der Derian & Shapiro (1989), Milliken
(1999); sobre gênero, classe e raça da política internacional, ver: Enloe (2004; 2014), Henderson (2013),
Krishna (2009; 2015), Vitalis (2005).
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ilustra como a política do cotidiano é central na produção de um modo particular
de pensar e falar sobre armas, estratégia e vidas humanas que tem sido crucial no
sustento da estratégia nuclear dos EUA (Cohn 1987). Como Dauphinee observa,
a abordagem narrativa de Cohn foi amplamente aclamada e citada, mas vista
principalmente como um comentário sobre os limites da pesquisa, e não como
contribuição acadêmica em si mesma. Nesse ponto, Dauphinee fazia referência
à atitude reflexiva mais radical de Cohn ao adotar uma postura autoetnográfica
— estratégia de escrita certamente inovadora nas RI dos anos 1980 — e escolher
expor aspectos de sua posição de pesquisadora, chamando a atenção do leitor
aos percalços ao longo do processo, em vez de optar por um caminho de mão
única em direção a uma conclusão puramente voltada aos objetivos científicos
daquela pesquisa em particular.
Como destaca Vrasti (2017), a tríade hifenizada “etnografia-autoetnografia-
autobiografia” vem sendo amplamente mobilizada e citada em intervenções
que buscam “dar conta das dimensões da diferença, subjetividade e desejo na
linguagem” na pesquisa e na escrita em RI. Embora existam diferenças consideráveis
entre essas estratégias — incluindo as formas como são empregadas no escopo
de cada projeto de pesquisa —, elas, por vezes, aparecem sobrepostas enquanto
gêneros de redação acadêmica atentas à “tradução textual” do trabalho de campo
e da experiência pessoal do pesquisador. A própria Vrasti está entre os defensores
da etnografia como um modo participativo e dialógico de escrita, em vez de mera
metodologia — especialmente no significado mais tradicional da palavra. Nesta
perspectiva, embora a etnografia seja vista como um “processo para organizar
o conhecimento e comunicar a experiência”, cujos métodos permitem às vezes
“olhar para lugares e captar detalhes que outros métodos não registrariam” —
razão pela qual se tornou corriqueira entre feministas e pós-coloniais, por exemplo
—, existe também o perigo iminente de que se torne “uma relação extrativista
com o mundo ao seu redor”. Ou seja, mesmo abordagens narrativas de inspiração
etnográfica (ou autoetnográfica) correm o risco de cair nas mesmas “tentações
documentalistas” e de busca da verdade já presentes na Antropologia realista e
nas abordagens convencionais de RI (Vrasti 2017, 275).
O tipo de postura promovida na abordagem narrativa, discutida por Vrasti,
reorienta as questões de autoridade e subjetividade por meio de esforços que podem
começar com perguntas tão simples (e, mesmo assim, inovadoras) quanto “onde
estão as mulheres?” — tal como feito por Cynthia Enloe (2004; 2014). Vistas desse
ângulo, abordagens narrativas podem ajudar a abrir o campo à “multiplicidade
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de narradores e vozes [...] que continuam deslizando pelas fendas das relações
interestatais” (Moulin 2016, 142). Além disso, como já colocado, podem abrir
espaços para questões relacionadas às “convenções narrativas” e à “autoridade
explicativa” do pesquisador (Vrasti 2010, 87). Em outras palavras, a atenção à
política da escrita, tal como sugere Vrasti, torna possível abordar a relação entre
pesquisador e objeto, narrador e narrativa, e as maneiras como se conecta a
questões de poder e autoridade. Da mesma forma, abrem-se aqui possibilidades
para abordar domínios ainda mais profundos — como da inquietação, culpa e/ou
raiva — que podem ter relação, ao menos em parte, com o movimento de busca
por verdades alternativas à encorajada pela argumentação científica positivista.
O interesse na narrativa não apenas como meio de comunicação, mas
também como material apropriado para o conhecimento acadêmico em RI, tem
sido tema corriqueiro de fóruns e revistas acadêmicas. Uma das repercussões
mais explícitas do workshop organizado pela York University, citado acima,
por exemplo, foi a publicação das reflexões de alguns de seus participantes em
um fórum sobre metodologias críticas e narrativa em RI na página eletrônica
The Disorder of Things — de considerável repercussão entre estudantes e
acadêmicos, especialmente da ala mais crítica da disciplina. Em 2010, a Review of
International Studies publicou vários artigos do fórum sobre o assunto. O mesmo
caminho foi seguido em 2016 pela Crítica Contemporánea — Revista de Teoría
Política, com o lançamento de um dossiê sobre política e narrativa. Periódicos
mais novos na área, como o Critical Studies on Security e Critical Military Studies,
por exemplo, mantêm políticas de submissão que aceitam ficção e poesia em suas
seções especiais. Um espaço também foi formalizado recentemente no Journal
of Narrative Politics, uma publicação interdisciplinar editada por Dauphinee,
Jenny Edkins, Naeem Inayatullah, Narendra Kumarakulasingam, Dan Öberg e
Paulo Ravecca.
Talvez uma das vozes mais militantes em defesa da escrita autoetnográfica
como alternativa para lidar com as questões de poder e autoridade na academia,
Doty (2004) alerta para a ausência fictícia do “eu” do(a) pesquisador(a) na escrita
acadêmica. Como problematiza a autora: “[a] voz que ecoa em nossos diários é
muitas vezes fria, desapegada, desprovida de alma e identidade humana. Como
escritores acadêmicos, não temos personalidade na página, nenhuma conexão
com o mundo dos seres humanos. Nossos escritos nos afastam de todos, exceto
de nós mesmos” (p. 381). No entanto, essa ausência do “eu” no texto acadêmico é
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profundamente política. Como salienta a autora, a série de exclusões e sanitizações
que ocorrem neste modo objetivo e “desarraigado” de narrativa nada mais é do
que uma tentativa malsucedida de ocultar as emoções e a inevitável conexão entre
escritor e o mundo que ele deseja retratar. Para além de chamar atenção para a
artificialidade e a violência inerentes à escrita acadêmica tradicional, Doty defende
o valor político de um movimento em direção à “textualidade insurrecional”
(Shapiro 1989). Ou seja, uma “prática de escrita resistente a modos familiares
de representação, e autorreflexiva o suficiente para mostrar como as práticas
de significação e escrita estão radicalmente entrelaçadas” (Shapiro 1989, 13).
Doty recorre então à terminologia de Roland Barthes para sugerir que, embora
a escrita acadêmica se pretenda uma “escrita grau zero”, a tentativa de ocultar
sua luta constante para “parecer inocente” — colocando o desejo por um “estilo
neutro” acima do compromisso ético-político que deve haver entre pesquisador
e objeto — acaba, paradoxalmente, expondo sua qualidade de “estilo desejoso
da ausência de estilo” (Doty 2004, 386). Em outras palavras, a ausência do “eu”
acadêmico é (e só pode ser) fictícia, pois “há sempre voz na escrita, mesmo
quando a voz da ausência”
4
(p. 383).
Assim como Vrasti, Doty destaca o potencial da escrita autoetnográfica em
lançar luz sobre as “outras vozes” presentes no texto. Nesse sentido, o desejo
da autora, sem dúvida, compreende, como ela mesma declara, “a necessidade
de transformar as relações internacionais em um diálogo intercultural mais
abrangente, que [...] inclua vozes marginalizadas e seja capaz de refletir sobre
os possíveis significados dessa inclusão” (Doty 2004, 381). No entanto, ainda
que afirme que abrir a disciplina às “outras vozes” (ou seja, dos numerosos seres
humanos excluídos dos espaços dominantes de produção do conhecimento) seja
um passo em direção ao caminho mais complexo de “fazer conexões em nossos
escritos” (Doty 2010, 1050), o movimento por ela proposto por vezes soa mais
como uma busca pela cura das “doenças de nossas almas [acadêmicas]” do
que uma abertura mais ampla. Nesse sentido, são duas as leituras possíveis do
argumento da autora: uma, certamente mais cética, na qual as “outras vozes” de
que fala acabam se limitando às vozes do “eu” (ainda marcadamente acadêmico),
que intelectuais são encorajados a sepultar sob a autoridade da voz acadêmica
e da “esterilidade das histórias” que contam; e outra, na qual o processo de
4 É importante notar aqui que o entendimento de “voz” em Doty não necessariamente se refere apenas ao
indivíduo autor, mas principalmente ao texto em si mesmo. Nesse sentido, deve-se levar em consideração a
orientação pós-estruturalista da autora. Sobre esse tema, ver também: Foucault (1984).
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cura das “doenças de nossas almas” deve incluir a exposição dos textos, teorias
e “identidades acadêmicas” a um compromisso e engajamento contínuo com
“pessoas reais”. “Pessoas reais” aqui incluiria não apenas um “nós” acadêmico
— “quem e o que ‘nós’ somos, como ‘nós’ nos envolvemos em ‘nossos´ esforços
acadêmicos” (Doty 2004, 381), mas também aqueles que são sujeitos das práticas
representacionais do discurso acadêmico.
O ímpeto por trás da abordagem autoetnográfica trazida por Dauphinee é
um tanto diferente. The Politics of Exile (2013b) vem com a proposta de um texto
híbrido entre romance e relato acadêmico autoetnográfico, e pode ser lido como
uma tentativa mais aberta de lidar com a culpa e a raiva da construção de carreiras
sobre as dores e os escombros da guerra. Em resumo, o livro trata do encontro
de uma acadêmica com seu objeto de pesquisa — a guerra da Bósnia e suas
consequências —, narrado em tom lírico e abertamente emocional e através dos
enigmas que envolvem e conectam a vida de uma jovem acadêmica (identificada
ao longo do livro como “a jovem professora”) e a vida de civis e combatentes
envolvidos no sangrento conflito ao qual ela dedica sua carreira de pesquisadora.
Os parágrafos iniciais da narrativa tocante de Dauphinee permitem vislumbrar a
dimensão das escolhas impossíveis que são enfrentadas quando na posição de
pesquisador(a) — especialmente diante de temas como o conflito armado. Nesse
âmbito, a mudança na forma narrativa em relação a seus escritos anteriores pode
ser concebida como uma intervenção com claros objetivos políticos e éticos por
parte da autora. Como ela mesma vai apontar certa ocasião, seu afastamento da
abordagem argumentativa predominante no anterior The Ethics of Researching
War [2007], em favor de uma narrativa construída na fronteira do que poderia
ser definido como romance ou mesmo relato autobiográfico, reflete “uma política
de esperança” (Dauphinee 2013c). Nesse sentido, a abordagem autoetnográfica
adotada parece ir mais longe, com o objetivo, também expresso em Doty, da
busca por uma ética intelectual do encontro, ou seja, de um compromisso com
a escrita como um exercício de conexão com o mundo “real”. Se o “mundo” ao
qual Doty parece se referir ainda parece largamente confinado às múltiplas vozes
do “eu” do(a) escritor(a)-acadêmico(a), a abordagem de Dauphinee sinaliza em
direção a “uma consciência da real dificuldade daquilo que essa ética tentou
cumprir, a saber, expor o pesquisador ao escrutínio do seu objeto de pesquisa
de maneria que possibilite reconhecer seu trauma (...)” (Dauphinee 2013c, 350).
O que exercícios autoetnográficos como os de Doty e Dauphinee têm mostrado
são os desafios inerentes à tentativa de entender “todas as muitas camadas de
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razões e motivações” por que agimos e escrevemos. No entanto, como a autora
vai alertar, “priorizá-las de maneira fixa ou transhistórica” também traz perigos
(Dauphinee 2013c, 349), como o risco de transformar exercícios em direção à
liberação da voz do “eu” na escrita acadêmica em exercícios de autoindulgência
intelectual, que podem acabar replicando a distância entre pesquisador e objeto.
Como bem apontam Roland Bleiker e Morgan Brigg (2010), a escrita autoetnográfica
corre sério risco de se tornar inatacável, se não deixadas explícitas as motivações
ético-políticas que a conduzem. Sob o perigo de se tornar uma questão de
“purificação autoindulgente” (Brigg, Bleiker 2010, 276), a esperança que esse tipo
de reflexividade desperta é a de, eventualmente, “quebrar a barreira e achatar
as hierarquias que separam a academia das pessoas, comunidades e lugares que
investiga” (Vrasti 2017, 277).
Motivações e obstáculos semelhantes parecem assombrar aqueles poucos
que ousaram recorrer à escrita autobiográfica como alternativa ao apagamento
da voz do estudioso-escritor e outras complexidades inerentes à dimensão do
eu” nas RI. Nesse ponto, vale destacar que, embora tanto a autoetnografia como
a autobiografia sejam formas de narrativa profundamente preocupadas com
o “eu”, há uma diferença de enfoque importante entre elas. Se, por um lado,
ambas são modos de escrita política e emocionalmente carregadas, que operam
na interface entre os componentes pessoais e profissionais na pesquisa, por outro
lado, relatos autoetnográficos normalmente são mais explícitos e exigentes quanto
ao compromisso “de fazer conexões com outros e com o mundo” (Park-Kang,
2015, p.365), especialmente no que toca à dimensão particular do encontro entre
pesquisador e objeto de pesquisa (ver Vrasti 2010, 2017).
O volume “Autobiographical International Relations: I, IR” [2011], editado
por Inayatullah, é um exemplo desse movimento. No capítulo introdutório,
Inayatullah (2011, 1) começa contando sua própria trajetória “rumo ao precipício
da autobiografia” e como as andanças individuais de outros estudiosos de RI se
interseccionam num esforço semelhante de dar sentido à dimensão do “eu” nas
RI. Como observa, “[a] escrita acadêmica supõe uma ficção precária”, na qual
a ausência do autor é um pré-requisito para a forma de narrativa autorizada,
supostamente objetiva e destacada do mundo que analisa e representa. A exposição
dessa “distância fictícia” e, portanto, da inevitável presença do “eu” na escrita
acadêmica se torna o fio condutor entre os capítulos do volume que, à sua maneira,
demonstram como as narrativas pessoais influenciam as articulações teóricas
e como os “compromissos teóricos/práticos” dos autores não estão separados
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de “suas necessidades e feridas” enquanto seres humanos e sujeitos políticos
(Inayatullah 2011, 5-6). No entanto, como aponta o próprio Inayatullah (2013,
x) em outra ocasião, essa forma autobiográfica e não convencional de escrita
não é uma tarefa fácil. De fato, como observa Park-Kang (2015), há uma tensão
perceptível ao leitor desde as páginas introdutórias até a conclusão do volume.
Peter Mandaville, autor do epílogo, confessa sua própria experiência de angústia
ao tentar lidar com sua tarefa original de escrever um capítulo autobiográfico e,
posteriormente, o alívio de a ter recusado e então assumido com maior segurança
“um papel mais familiar como comentarista” (Mandaville 2011, 196).
Mais recentemente, Inayatullah e Dauphinee co-editaram uma coleção de
ensaios em linha semelhante, porém de forma a abarcar abordagens narrativas
para além da autobiografia. No breve capítulo introdutório de “Narrative Global
Politics — Theory, History and the Personal in International Relations” [2016], os
editores reforçam a “urgência” em colocar a “questão narrativa” como problema
teórico relevante na escrita acadêmica e na relação entre intelectuais e o mundo
que buscam investigar. Nesse âmbito, a autobiografia é apenas um dos muitos
enigmas narratológicos a serem levados a sério quando se escreve sobre política
de uma perspectiva global. As linhas entre autobiografia, autoetnografia ou a
noção mais geral de narrativa não são diretamente problematizadas no volume,
já que são consideradas menos importantes do que a própria política da escrita
em RI. Na dimensão de cada um dos capítulos seguintes, adota-se a postura de
expor as sobreposições entre questionamento acadêmico e os arcos tangenciais
do ato tão humano que é contar histórias” (Inayatullah, Dauphinee 2016, 2).
Assim, conceber os relatos de RI como narrativas políticas, em vez de
explicações científicas e incontestáveis, permite não apenas expor aspectos do
que Cynthia Weber, parafraseando Clifford Geertz, chamou de “a função do
mito na teoria da RI” (Weber 2009, 7). Como defendido por aqueles que vêm
adotando esse posicionamento, tratam-se de estratégias de aperfeiçoamento
da pesquisa acadêmica menos em termos da busca por uma verdade sobre o
mundo “lá fora” e mais em termos de explicações e entendimentos possíveis
(ver Suganami 2008). A partir desta breve revisão de alguns dos trabalhos que
adotaram uma abordagem narrativa em RI, é possível então inferir que há
uma crença (ou ao menos uma esperança) compartilhada de que metodologias
narrativas permitem que pesquisadores de RI: repensem as “ficções” da verdade
científica e da escrita largamente técnica empregada; reconsiderem o lugar do
político nas RI, reconhecendo a multiplicidade de loci de enunciação e ação
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Narrativas sobre política e a política das narrativas: reflexões sobre o uso de abordagens [...]
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que molda a política global, tanto a partir dos centros de poder quanto de suas
margens; e adotem uma postura mais reflexiva e ética em relação aos objetos de
pesquisa e em relação à sua própria posição de pesquisador e sujeito político.
Nestes termos, é possível observar aqui um duplo movimento: de um lado,
um desencanto sintomático diante das deficiências e limites persistentes nas
práticas de produção de conhecimento e no campo das RI enquanto tal; e, de
outro lado, um florescer de engajamentos críticos em direção a esses limites e
acompanhados de “uma espécie de reencantamento do mundo da política global
com uma maior diversidade de vozes, personagens e histórias” (Vrasti 2017, 273).
Possivelmente, é neste duplo movimento de desencantamento e reencantamento
acadêmico que podemos traçar o crescente interesse em abordagens narrativas
e formas alternativas de pesquisa e escrita no campo das RI.
(Des)engajamento intelectual e o mundo
Como visto, os movimentos em direção à RI narrativa são fruto de
compromissos críticos e de críticas contundentes acerca de como a disciplina
tem lidado com seus objetos de conhecimento, seus vínculos com projetos e
visões de mundo fortemente opressivos e orientados para a política interestatal,
e sua “imaginação provincial”, inegavelmente enraizada em uma história de
hierarquias globais (Muppidi 2013). Nessa perspectiva, narrativas não apenas
definem ontologicamente as maneiras como percebemos e agimos no mundo,
mas podem também ser convertidas em estratégia para conhecer e questionar
os traços violentos inerentes à produção e transmissão de conhecimento
na academia, encorajando a adoção de uma atitude de não-indiferença em
relação aos sujeitos e dinâmicas que busca representar. O que está em jogo
aqui não é apenas uma ruptura epistemológica com os critérios positivistas
tradicionais de produção de conhecimento, mas a articulação de um compromisso
ético-político de encurtar a distância entre o espaço institucionalizado de produção
de conhecimento, que é a academia e o mundo que ela tenta compreender.
O tema do isolacionismo acadêmico foi amplamente explorado por Edward
Said em seus escritos, especialmente em trabalhos mais tardios nos quais aborda
a crítica literária de uma perspectiva que destaca as conexões entre textos e
o mundo com os quais se relacionam e pretendem representar. O conceito de
“mundanismo/mundanidade” [worldism/worldliness], a discussão relacionada
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sobre o que significa vincular texto ao contexto, conhecimento e (a esperança)
de transformação social, e seu apelo pela “diligência” intelectual [intellectual
wakefulness] — traduzido no conceito de “consciência crítica secular” ou
simplesmente crítica secular — são dimensões particularmente relevantes para
discussão aqui. Obviamente, as ideias de Said também devem ser recuperadas
de maneira crítica e situada. O que se sugere aqui é que algumas de suas
intervenções podem nos ajudar a situar as motivações e forças operantes —
sejam de cumplicidade ou resistência — nesse recente movimento em direção
a abordagens narrativas em RI.
Na busca por entender como os elementos das formas culturais hegemônicas
e do autoritarismo atuais tomaram forma, bem como as possibilidades de
resistência contra eles, Said chama a atenção para as maneiras pelas quais
o “conhecimento ocidental” — para usar a terminologia de Linda Tuhiwai
Smith (1999) — construiu narrativas históricas capazes de estabelecer limites
duradouros para o que é conhecimento válido. Naturalmente, são criadas aí
também as delimitações sobre quem tem o direito de conhecer e de falar em
nome desse conhecimento válido. Em “The World, the Text and the Critic”,
Said aborda alguns exemplos do cânone do pensamento europeu moderno
como “instâncias textuais” do etnocentrismo, que tem sido cúmplice e vem
continuamente reforçando a cultura hegemônica por trás dos empreendimentos
imperiais e coloniais europeus — esforço certamente análogo às discussões
inauguradas em Orientalismo (Said 1978). A continuidade dessa hegemonia
cultural é garantida, por exemplo, na forma como as ciências eurocêntricas e
a academia tradicional estabelecem e constantemente reforçam até mesmo as
circunstâncias a partir das quais pode emergir a crítica e, posteriormente, sua
chancela como a contradição que é legítima e passível de se tornar conhecimento
válido. Como destaca, a autoridade desse sistema cultural não vem apenas de seus
cânones, de sua aparência de neutralidade política, seus “jargões camuflados”
e forma instituída de crítica, mas também “do modo como essa continuidade
reproduz a continuidade filial da cadeia de procriação biológica” (Said 1983,
22). Assim, mesmo a crítica é uma instituição acadêmica, que pode facilmente
cair em exercícios contemplativos descolados do mundo, no formalismo e no
oportunismo profissional incentivados pela própria comunidade interpretativa a
que pertence.
Nessa perspectiva, o problema não está exatamente nos exercícios de alta
teorização e abstração, que são partes de fato da “coisa acadêmica”, mas na
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Narrativas sobre política e a política das narrativas: reflexões sobre o uso de abordagens [...]
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desconexão que “sistemas herméticos” como as ciências eurocêntricas tendem
a gerar (Said 1983, 25- 26). Said sugere então dois opostos para defender o que
chama de “crítica secular”, ou seja, um posicionamento que objetiva reconectar
o questionamento acadêmico ao mundo e conceber textos como formas políticas
significativas: crítica/consciência crítica secular e crítico acadêmico/intelectual
público. A busca aqui é por salientar a dimensão ética e política — ou mundana
— do ofício intelectual ou, em outras palavras, repensar textos — o que, claro,
inclui a escrita acadêmica — em seus contextos. A noção de “consciência crítica
secular”, como o termo já sugere, traz à tona a ênfase de Said no secularismo
ou, em outras palavras, na “mundanidade” das formas culturais e sociais.
Relaciona-se com a concepção de que “seres humanos fazem sua própria história”
(Said 2001 apud Giroux 2004, 345) e que, por essa mesma razão, é preciso
“reconhecer os múltiplos locais nos quais um apelo irracional às escrituras,
autoridade divina e outras formas extrassociais de dogmatismo [...] minam a
possibilidade de ação humana”(Giroux 2004, 345). Nesse sentido, a noção de
crítica secular não pode deixar de estar intimamente ligada a uma “política de
crise”, como sugere Henry Giroux. Em outras palavras, a crítica secular aqui se
refere a uma noção particular de mundanidade, na qual política e práticas de
teorização nunca estão separadas. A política de crise, no contexto da produção
do conhecimento, refere-se, assim, a como as narrativas do conhecimento
incorporam, em vez de simplesmente descrever, as conexões e desconexões
entre teoria e vida pública, vinculando “conhecimento e aprendizado ao espaço
performático e mundano da ação, incentivando indivíduos não apenas a pensar
criticamente sobre o mundo ao seu redor, mas (...) intervir na vida pública e
enfrentar a miríade de relações simbólicas, institucionais e materiais de poder”
(Giroux 2004, 340, tradução livre).
Nessa perspectiva, mais que mero condutor para formas já instituídas de
crítica, o papel do intelectual público — em oposição ao “acadêmico crítico” —
é conectar conhecimento à política, texto ao contexto, crítica à mudança social.
De forma relacionada, aquilo que Said chama de “consciência individual” e
sua propensão para a transformação social vai além da dimensão individual,
referindo-se mais a uma força social em si mesma, ainda que invariavelmente
embutida no sistema cultural onde a dinâmica da afiliação acontece. Logo, a
agência pode tanto se traduzir como resistência como complacência, e mesmo
os termos de resistência podem operar tanto dentro dos limites da linguagem
estabelecida e sua replicação, ou se configurar numa busca por esculpir uma
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linguagem alternativa para si mesma
5
. É aqui que Said discute as diferenças entre
crítico” e “intelectual público”. Em última análise, o papel do intelectual público
não é consolidar qualquer tipo de autoridade, mas compreendê-la, interpretá-la
e questioná-la de maneira significativa e “mundana”.
Essa conexão íntima entre o papel e responsabilidade do intelectual público
aparece ainda mais claramente no engajamento de Said com os escritos de Frantz
Fanon. No seu clássico “Les Damnés de La Terre”, Fanon traz um retrato vívido
do domínio colonial e suas capilaridades e defende que a resistência anticolonial
deve se preocupar não apenas com a necessidade imediata de independência
em relação ao colonizador estrangeiro, mas também com a libertação do jugo
da burguesia nacionalista, que mantém a subalternidade operante dentro da
antiga colônia. Segundo Fanon, sem a transição de uma consciência nacionalista
indiscriminada para uma consciência social e econômica mais profunda, a
opressiva elite nacionalista permanece enraizada e a sociedade pós-colonial presa
a uma posição periférica no sistema mundial. E é precisamente por isso que,
segundo Fanon, a resistência deve ser um empreendimento bifocal: uma luta
nacionalista contra o invasor colonial e uma luta universal contra a burguesia
(Fanon 1963/2004). Nesse aspecto, Said parece levar em conta a leitura de
Sartre sobre Fanon. Nas palavras de Sartre, da perspectiva Fanoniana, “a única
cultura verdadeira é a da revolução; ou seja, é uma cultura constantemente
em formação” (Sartre 1963/2004 12, tradução livre). Aqui, a política da crise é
novamente destacada, uma vez que pode ser interpretada como uma definição
possível para o estar “constantemente em formação” e, portanto, atenta ao espaço
público de luta, política e poder. No que diz respeito ao espaço da produção
de conhecimento e das narrativas de conhecimento (que são o foco principal
de Said), sentimentos de inquietação e incerteza diante da mundanidade das
relações e aspirações humanas aparecem como uma força produtiva, alimentando
a consciência crítica e impedindo o fechamento.
Vale mencionar que, ainda que Said tenha sido inspirado por Fanon em muitos
sentidos, este traz um contraponto importante à forma com que Said visualiza o
papel do intelectual público pós-colonial/diaspórico enquanto principal mediador
desta cultura revolucionária em formação (Said 1994). Fanon foi profundamente
5 Aqui o argumento de Said sobre diferentes formas de crítica se aproxima da diferenciação sugerida por
Walter Mignolo entre a crítica a partir de dentro do Eurocentrismo — o que Enrique Dussel chamou de
crítica eurocêntrica da modernidade” — e a crítica articulada a partir da diferença colonial, ou “abordagens
decoloniais” (Ver: Mignolo 2008, 234, 256-257).
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Narrativas sobre política e a política das narrativas: reflexões sobre o uso de abordagens [...]
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crítico da posição ambivalente do intelectual colonizado, preso entre a experiência
da colonização e o modo de pensamento ocidental/eurocêntrico ao qual está
inevitavelmente atrelado devido à sua educação (Fanon 1963/2004). Nesse âmbito,
ainda que tanto o julgamento obstinado de Fanon sobre o intelectual colonizado
quanto a fé de Said na figura do intelectual diaspórico possam parecer precipitados,
a suspeita do primeiro em relação à tentação provocada pela proximidade dos
valores ocidentais é certamente digna de nota. Tal suspeita indica uma dimensão
importante para compreender a relação desigual entre o intelectual e as “massas”
de sujeitos subalternos (trabalhadores migrantes, mulheres — especialmente
não-ocidentais —, camponeses etc.) que afirma representar. No entanto, o ponto
de Said sobre a importância de se pensar além das questões de “sobrevivência”,
em contextos de agitação política e lutas pela libertação, é também relevante.
Na sua percepção, o intelectual deve ter sempre em mente as implicações ético-
políticas de seu posicionamento em relação a movimentos e lutas sociais, o que
inclui também reflexões acerca da dominação e tirania que podem emergir de
locais antes marginais às esferas de poder. Portanto, a necessidade de se adotar
uma atitude “irônica” contra toda e qualquer forma de tirania e dominação,
mesmo aquelas transvestidas de resistência (Said 2001).
Assim, outra dimensão chave da mundanidade que Said enfatiza se traduz
na adoção de uma postura voltada para o objetivo ético-político de colocar o
conhecimento, antes de tudo, a serviço da humanidade e, portanto, para além de
espaços privilegiados da academia, da política institucional e do conhecimento
ocidental. O ponto aqui não é que todos devem abraçar o papel de ativistas
políticos, no sentido tradicional do termo. Relaciona-se mais com o valor ético-
político por trás de um exercício constante de crítica, que permaneça vigilante
contra o solipsismo e o “conhecimento sinóptico” — que, como alerta Sankaran
Krishna (1993), são sintomáticos na ética da alteridade adotada por abordagens
críticas, excessivamente focadas em textualidade, e em práticas de representação e
de significação e desatentas à fisicalidade da violência nas relações internacionais
e globais.
Logo, se por um lado a abordagem de Said em relação à cultura por vezes
faz parecer que discursos dominantes são incapacitantes ad infinitum em sua
persistência e replicação, por outro lado, se levarmos em conta sua compreensão
desses discursos como também limitados diante da complexidade da experiência
social, tem-se que, ao tentar suprimir essa complexidade, a cultura hegemônica
na verdade leva ao surgimento e fortalecimento de espaços para imaginação de
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ordens alternativas e oposição. Há aqui, portanto, uma conexão com a política de
esperança de que fala Dauphinee (2013c). A esperança em relação à transformação
— e à possibilidade de desempenhar um papel significativo, ao menos na
análise e previsão dessas transformações — é uma característica importante
do “reencantamento” diante dos múltiplos mundos da política internacional e
global, que tem, atualmente, movido abordagens críticas (onde incluem-se os
enfoques narrativos) em RI. No entanto, a questão remanescente e dificuldade
maior aqui é se essas esperanças podem se traduzir em plataformas concretas e
“recursos para as vozes de dentro e de fora da academia que lutam em múltiplas
frentes contra as crescentes forças do autoritarismo” (Giroux 2004, 345).
Nesse âmbito, como estudiosos e estudiosas afeitos a essa abordagem (para
alguns, metodologia) alternativa têm apontado, com a promessa de uma RI mais
inclusiva, surgem também os perigos de transformar essa “virada narrativa” numa
romantização das vozes e subjetividades subalternas e em gestos pautados mais
na culpa intelectual do que no desejo (e coragem) de abrir espaços para diálogos
genuínos e visões de mundo diferentes ou mesmo opostas (Muppidi 2013). A linha
entre a potencial transformação e democratização dos espaços de produção do
conhecimento e meros “exercícios de autoindulgência”, excessivamente focados
no “pessoal e confessional sem um motivo político sustentado”, (Dauphinee
2013a) é, portanto, tênue.
Narrativas na sala de aula: reflexões sobre abordagens narrativas
e o lugar do “eu” nas RI
O recente movimento em direção a abordagens narrativas em RI parte
do pressuposto de que a atenção à questão da narrativa pode contribuir com
movimentos críticos acerca dos lugares comuns e vozes autorizadas dentro da
disciplina. Iluminam-se aspectos importantes que perpassam a dimensão poder-
conhecimento, abrindo espaço para possibilidades de crítica e reimaginação do
campo e seus objetos de estudo. Em sala de aula, é notável a excitação quase
que espontânea dos alunos e alunas quando menciono abertamente a questão da
narrativa — antes apenas um “fantasma” assombrando o campo das RI —, suas
possibilidades de uso, estratégias já empregadas por autores e autoras renomados
e o recurso a estilos de escrita não comprometidos com jargão acadêmico ou com
uma divisão mente-mundo/pesquisador(a)-objeto. Obviamente, cabe aqui uma
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Narrativas sobre política e a política das narrativas: reflexões sobre o uso de abordagens [...]
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qualificação dessa excitação, já que as reações tendem a variar de curiosidade
a suspeita, e de aprovação a resistência.
As experiências, brevemente descritas a seguir, foram originalmente pensadas
como atividades complementares, visando tornar aulas de metodologia da pesquisa
mais atraentes e, esperançosamente, aproximar assim alunos de seus temas
de pesquisa em RI — que, como sabemos, é um campo de estudos propenso
a teorias e questionamentos por vezes desconectados das realidades de seus
sujeitos e contextos. Além das discussões em sala, pautadas pela questão da
narrativa na vida acadêmica, os alunos de graduação, matriculados no curso
de Metodologia das RI II — cuja ementa foca em abordagens metodológicas
pós-“virada reflexivista” no campo das RI (Jackson 2011; Luleci, Sula 2016) —
foram incentivados a realizar duas atividades: uma individual e não-presencial
e a outra coletivamente, em sala de aula. Para a primeira atividade, os alunos
foram solicitados a fazer uma análise crítica (a ser documentada e entregue no
formato de uma resenha) das estratégias narrativas adotadas no livro The Politics
of Exile [2013] e refletir sobre suas possíveis implicações metodológicas e políticas
(!), considerando a pesquisa em RI. A segunda atividade, por seu turno, tratou-
se de uma roda de discussão em sala, na qual os alunos foram incentivados,
em primeiro lugar, a falar sobre “o lugar do ‘eu’ nas RI” e, em segundo lugar,
articularem sobre as conexões e desconexões entre suas experiências pessoais
e a escolha do tema de seus projetos de pesquisa.
De modo geral, a primeira atividade foi marcada por duas grandes tendências.
De um lado, alunos simplesmente maravilhados com a trajetória da protagonista do
livro de Dauphinee — cuja história gira em torno da vida e dos questionamentos de
uma jovem professora, depois que ela conhece um homem misterioso, ex-soldado
sérvio na Guerra da Bósnia, que não apenas incorpora seu objeto de pesquisa,
como também carrega uma perspectiva alternativa acerca dos acontecimentos aos
quais ela dedicou toda sua carreira acadêmica. Como brilhantemente observado
por uma aluna, uma interpretação possível é entendê-la como o processo pelo qual
uma pesquisadora se torna “reflexivista”, mediante o encontro com seu objeto de
estudo — e, pode-se acrescentar, com seus próprios limites. De outro lado, outra
tendência observada foi de estudantes que se atentaram mais especificamente ao
relacionamento pessoal entre a professora e o ex-combatente sérvio. Um número
relativamente pequeno de estudantes confessou também certa dificuldade em
conectar a narrativa do livro às RI como campo do conhecimento. Para esses
estudantes, ao que parece, os eventos narrados pela protagonista se desdobraram
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como uma realidade encerrada, um caso particular, não necessariamente conectado
ou sintomático na tarefa de pensar/fazer/escrever a política internacional. Nesse
sentido, um comentário memorável feito por uma aluna chamou atenção para como
os temas e objetos de pesquisa em RI aparecem como uma “realidade distante”
e, nas suas palavras, algo “externo e dificilmente acessível, especialmente para
estudantes de graduação como nós!”. Mesmo que a aluna não tenha desenvolvido
a frase para além disso, o tom pessimista só pode nos levar a supor que o
“nós” ali se referia a “estudantes de graduação que cresceram no interior do
Brasil”, “estudantes do sul global” ou, talvez, “estudantes de graduação ainda
iniciantes nas reflexões sobre política internacional e global”. Nesse mesmo
sentido, outra aluna — talvez menos pessimista — apontou que, após a leitura,
estava convencida de que é possível simpatizar com “outros distantes” e, assim,
pensar nesses outros enquanto sujeitos, indivíduos com trajetórias complexas
de vida e não simplesmente objetos de estudo.
A segunda atividade focou na temática “o lugar do ‘eu’ nas RI” — inspirado
no subtítulo do livro editado por Naeem Inayatullah em 2011, “Autobiographical
International RelationsI, IR. Solicitou-se aos alunos que refletissem previamente
sobre sua conexão com seus respectivos temas de pesquisa e sobre a relação
entre suas experiências de vida e a escolha por estudar RI em geral. Para essa
atividade, decidi ser a primeira a falar para “quebrar o gelo” e possivelmente
transmitir confiança e empatia ao grupo. Aqui também os resultados foram diversos
em todas as três vezes em que esse modelo específico de aula foi ministrado (a
diferentes grupos de graduandos). Notadamente, os alunos se mostraram mais
propensos a compartilhar suas reflexões com os demais colegas quando já havia
um vínculo claro entre a maioria, ou seja, um “sentimento de grupo” operando
anteriormente à dinâmica. Em todas as três sessões, houve um equilíbrio no
número de estudantes que conseguiram articular ideias sem recorrer ao jargão
acadêmico e aqueles que tiveram que mobilizar conceitos e teorias de RI para
explicar suas escolhas de pesquisa e fazerem sentido da conexão entre sujeito
e objeto a partir de suas experiências individuais. Nesse âmbito, a maior parte
daqueles do segundo caso mencionou não visualizar uma conexão direta entre
sua experiência de vida e a escolha por RI como profissão ou tema de pesquisa.
Os que tiveram maior sucesso em expor o que pensavam ser o seu “eu” nas
“RI” também tendiam a fazer menção ao fato de que expor suas reflexões aos
colegas havia sido mais útil que embaraçoso e um bom exercício de motivação
para prosseguir com seus projetos. É relevante mencionar ainda que um número
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Narrativas sobre política e a política das narrativas: reflexões sobre o uso de abordagens [...]
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de alunos articulou ideias em torno da percepção de que a escolha por estudar/
pensar RI seria uma maneira de escapar de suas histórias de vida — posto que
muitos conectavam a ideia de “internacional” com o objetivo de ir para longe de
casa. Em uma das seções, um aluno mencionou que após a reflexão orientada
parecia mais simples pensar em RI como algo mais “palpável”, “menos distante”
e para além da imagem de uma disciplina acadêmica formal. Por fim, muitos
também conectaram a escolha de RI e até do tema de pesquisa à ideia de futuro
sucesso profissional — e, curiosamente, a ideia de “sucesso” foi constantemente
relacionada com viver e trabalhar no exterior.
Evidentemente, um número (ainda que pequeno) de estudantes adotou uma
atitude mais cética — ou mesmo indiferente — em relação ao papel da narrativa
na pesquisa e na escrita acadêmica. Entretanto, durante e após cada uma das
atividades, a maioria dos estudantes envolvidos relatou, de diferentes formas, maior
consciência de sua situação (alguns chamariam de “posicionalidade”) enquanto
aluno(a)s de RI e, com isso, uma percepção mais aguçada dos aspectos mais
“mundanos” — para usar a terminologia adotada nesse artigo — da disciplina.
Conclusão
Este artigo teve como objetivo explorar algumas das implicações epistemo-
lógicas e metodológicas –e, sem dúvida, ontológicas — de se levar em conta
a questão da narrativa no estudo das relações internacionais. A discussão
desenvolvida por Said sobre a “mundanidade dos textos” ajudou a destacar a
conexão entre texto e contexto e a entender os tipos de lacunas que estudiosos,
recorrendo a abordagens narrativas, estão tentando preencher.
A concepção da teoria de RI e da consolidação da própria disciplina como um
conjunto de histórias” que contamos sobre o mundo (Weber 2001, 129-30) aparece
como pressuposto fundamental para aqueles atentos aos aspectos discursivos da
política mundial e usos de abordagens narrativas em RI. Nesse sentido, como
argumentado por Shapiro há mais de três décadas, o que está em jogo nessa
“virada” narrativa é nada menos que “uma mudança no autoconhecimento que
constitui o campo da análise social e política”, na qual “[p]arte do que deve ser
rejeitado é a distinção radical entre o que se definiu como os gêneros de ficção
e científico de escrita” (Shapiro 1988, 7 apud Wibben 2011, 46). Assim, pode-se
concluir que uma atenção às formas como narrativas constroem e influenciam o
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mundo das relações internacionais e, de maneira relacionada, uma ênfase mais
clara em abordagens narrativas das RI levantam questões importantes acerca da
política de representação no campo: o que é admitido como objeto dos estudos
internacionais e globais (ou seja, qual é o mundo dos assuntos internacionais)?
Como (e quais) episódios, vozes e práticas passam então a ser considerados
relevantes no mundo da disciplina? De maneira mais geral, buscou-se demonstrar
como esforços de repensar esses aspectos reorientam e complicam não apenas
a maneira como se entende o funcionamento da política internacional, mas
também a própria prática de narrar o internacional e o global como dimensões
politicamente relevantes.
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