Rev. Carta Inter., Belo Horizonte, v. 15, n. 2, 2020, p. 28-51
42 Parceria China e Rússia: bases reais para superar desconfiança histórica
fortemente para a reaproximação entre China e Rússia. A SCO foi criada em 2001,
a partir do Shanghai Five, formado cinco anos antes, cujo objetivo era promover
a segurança nas fronteiras entre China, Rússia, Cazaquistão, Quirguistão e
Tadjiquistão (Chung 2004). Desde 2002, houve exercícios militares conjuntos.
À medida que a SCO incorporou outros países e ampliou sua agenda, consolidou-se
como a principal organização regional no continente, sem nenhuma participação
dos EUA. Em 2005, a Declaração da Cúpula do SCO, em Astana, defendeu a criação
de um cronograma definitivo para a retirada das forças norte-americanas das
bases militares na Ásia Central. Mantendo como prioridade o desenvolvimento
da segurança coletiva na região, a SCO também passou a funcionar como
articulação regional de caráter multifuncional, com objetivos que vão desde o
desenvolvimento econômico até a criação de uma zona de paz e estabilidade com
preocupações humanitárias, socioculturais e de proteção à saúde e ao meio ambiente
(Molchanov 2017).
Ao fim de 2019, os membros permanentes da SCO eram os cinco que
compunham o grupo Shanghai Five, somados ao Uzbequistão (admitido em 2001),
à Índia e ao Paquistão (admitidos em 2017
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). Os membros observadores incluem
Mongólia (desde 2004), Afeganistão (desde 2012), Belarus (desde 2015) Irã (desde
2016), enquanto status de “parceiro de diálogo” foi dado a Armênia, Azerbaijão,
Camboja, Nepal (desde 2008), Turquia (desde 2012) e Sri Lanka (desde 2015).
A política do governo Trump acabou fortalecendo o papel da SCO, ao criar tensões
simultâneas com a China (guerra comercial), com a Rússia (em constante tensão
enquanto não suprirem as sanções econômicas) e com o Irã (rompimento unilateral
do Acordo Nuclear e intensificação das sanções). Isso acabou acelerando, inclusive,
o processo de adesão do Irã à SCO (Lateigne 2018).
No referido processo existe, conforme observado por Molchanov (2017), uma
disputa interna entre Beijing e Moscou na SCO. A China tem se empenhado em
aprofundar a pauta econômica, enquanto o governo russo mostrou certa resistência
em avançar na integração econômica. Para Moscou, é mais seguro consolidar
a zona de livre comércio apenas com os membros da Comunidade Econômica
Eurasiana (EurAsEC), sob sua liderança, ao mesmo tempo em que concentra
esforço em atuar militarmente na Ásia Central, através da Organização do Tratado
15 Em 2017, chegou-se ao acordo sobre a aceitação da Índia e do Paquistão como novos membros, que ampliou
significativamente o alcance geográfico da organização. A China manteve, historicamente, boas relações com o
Paquistão, enquanto com a Índia as relações são mais complexas, envolvendo o próprio conflito da Caxemira.
Não obstante, as autoridades em Beijing sabem o quão importante seria a adesão completa e ativa da Índia à
SCO e à BRI para o avanço da sua estratégia na Eurásia.