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O doméstico e o internacional como discurso
normativo: a legitimação do uso da força
The domestic and the international as normative
discourse: the legitimation of the use of force
DOI: 10.21530/ci.v15n1.2020.975
David Paulo Succi Junior
1
Resumo
O objeto deste artigo é o emprego das forças armadas no interior das fronteiras estatais. Este
fenômeno é caracterizado pela bibliografia especializada como uma ruptura com as funções
normais dos instrumentos de força. Defendemos, porém, que o parâmetro de normalidade
pressuposto pela literatura não reflete a descrição de um padrão histórico, mas consiste
no modelo teórico normativo fundante das Relações Internacionais, que divide o mundo
em unidades políticas pacificadas internamente e um espaço internacional anárquico. Esta
abordagem teórica pressupõe a sobreposição entre território, autoridade política e comunidade,
que dificulta a compreensão da recorrência histórica do emprego interno das forças armadas,
assim como dos casos em que a atuação militar no âmbito doméstico está incorporada à
normalidade jurídica e social. Analisamos cada um dos elementos que compõem este modelo
teórico, tensionando sua coalescência. Com o objetivo de preencher a lacuna identificada,
propomos uma abordagem pautada no processo de legitimação, através do qual o uso dos
militares no interior das fronteiras do Estado torna-se aceitável.
Palavras-chave: Forças Armadas; Legitimidade; Segurança Interna; Segurança Internacional.
Abstract
The object of this article is the deployment of armed forces within state borders. This
phenomenon is referred by the literature as a disruption of the normal functions of the state
instruments of force. I argue that the normality benchmark presupposed by the literature does
1 Doutorando e mestre em Relações Internacionais pelo Programa de Pós-Graduação San Tiago Dantas (UNESP —
UNICAMP — PUC/SP). Bolsista da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (FAPESP) (Processo
número 2018/11168-3). Pesquisador do Grupo de Estudos de Defesa e Segurança Internacional (GEDES-Unesp).
ORCID: https://orcid.org/0000-0003-0612-7013; email: david.succi.jr@gmail.com
Artigo submetido em 08/07/2019 e aprovado em 27/01/2020.
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not reflect the description of a historical pattern, but consists in the normative theoretical
model that founded International Relations field, dividing the world in political unities
domestically pacified and an anarchical international system. This framework overlaps
territory, political authority and community, which precludes the scholars to understand
the historical recurrence of the domestic deployment of the armed forces, as well as the
cases in which these military operations within state boundaries is incorporated to legal and
social normality. I analyze each one of the elements that compose this theoretical model
and stress its coalescence. In order to fill this gap identified, I propose an approach based
on the process of legitimation, through which the use of the military inside national borders
becomes acceptable.
Keywords: Armed Forces; Legitimacy; Internal Security; External Security.
Introdução
Um conjunto de políticas de segurança vinculadas a questões como repressão
ao crime organizado transnacional, especialmente o narcotráfico, o combate
ao terrorismo e o controle dos fluxos migratórios, assim como as múltiplas
tarefas executadas pelas forças armadas em intervenções e operações de paz da
Organização das Nações Unidas (ONU), tem suscitado nos acadêmicos de Relações
Internacionais e Estudos de Segurança Internacional questionamentos sobre o
emprego de forças militares no âmbito doméstico. Com efeito, número crescente
de trabalhos acadêmicos tem compreendido estes fenômenos como processos
de dissolução, ruptura, sobreposição ou blurring
2
da separação entre segurança
interna e internacional (Bigo 2001, 2016; Eriksson e Rhinard 2009; Lutterbeck
2005), entre forças militares e policiais (Celi 2016; Edmunds 2006; Friesendorf
2012; Ojo 2008; Weiss 2011), assim como entre defesa externa e segurança pública
(Saint-Pierre 2011).
Estes termos pressupõem que uma situação anterior, tida como normal,
sofre mudança. Defendemos, porém, que o parâmetro de normalidade sob o
qual a bibliografia se assenta não reflete uma descrição da realidade histórica,
mas consiste em um modelo teórico normativo que, com base na sobreposição
entre fronteiras físicas, autoridade política e comunidade, divide o mundo em
unidades políticas que empregam suas forças armadas para garantir sua existência
em um sistema internacional anárquico, enquanto no âmbito interno empregam,
2 Termo em língua inglesa que se refere a um processo de tornar algo menos nítido, desfocado.
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através da polícia, o mínimo de força necessária para garantir o funcionamento
do ordenamento jurídico.
Consideramos que este fundamento teórico, pressuposto nas análises, gera
mais dificuldades explicativas do que esclarecimentos, pois, sob esta perspectiva,
negligenciam-se os casos nos quais o emprego das forças armadas no interior
das fronteiras do Estado está incorporado à normalidade jurídica e social. Esta
lacuna pode ser percebida na dificuldade de conciliar as afirmações sobre ruptura
e exceção com a recorrência histórica deste fenômeno em determinados países.
Isto fica particularmente evidente nos países da América do Sul, onde o emprego
do aparato militar no interior das fronteiras do Estado é frequentemente indicado
pela bibliografia como distorção das funções normais das forças militares (Winand,
Rodrigues e Aguilar 2016), ainda que este tipo de atuação dessas forças seja uma
constante histórica (Rouquié 1984).
Há, neste sentido, uma tensão entre práticas historicamente recorrentes e o
modelo teórico-normativo que, explícita ou implicitamente, baseia a maior parte
das investigações neste campo, produzindo, assim, impasse na agenda de pesquisa.
Ademais, este modelo apriorístico produz dificuldades para a compreensão dos
processos de transformação da aceitação ou rechaço das operações militares
domésticas, como no caso argentino que, no contexto do processo de transição do
regime autoritário para a democracia nos anos 1980, padrão histórico foi rompido
ao se instituir a proibição das tarefas militares domésticas. Por outro lado, desde
a década de 1990 houve um esforço político por flexibilizar este rechaço, o que
se concretizou em 2018 (Sain 2017, 2018).
Não se trata, porém, de argumentar que os fenômenos em questão representam
meras respostas técnicas e pragmáticas a uma realidade objetiva e autoevidente,
como defendido por alguns autores (Norden 2016; Pion-Berlin 2016). Como
argumentamos, a decisão sobre a necessidade supostamente pragmática da
mobilização da força é eminentemente política, uma vez que se insere em
amplo espectro de escolhas possíveis, estando também assentada em aspectos
interpretativos e normativos.
Argumentamos que, embora este modelo teórico, que compreende o uso a
força através da sobreposição de território, autoridade política e comunidade, não
corresponda a uma descrição histórica e, como mostramos, tenha sido amplamente
tensionado pelos teóricos das Relações Internacionais, não deve ser negligenciado,
visto que esta interpretação da realidade tem efeitos reais, ao moldar e justificar
ações políticas e sociais. Da mesma forma, práticas que divergem desta concepção
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são sustentadas por outros modelos interpretativos. Neste sentido, propomos que,
para compreender o emprego interno das forças armadas, é necessária abordagem
que busque identificar o processo que torna esta prática aceitável, isto é, sua
legitimação.
Em um primeiro momento analisamos a bibliografia relativa ao emprego
interno das forças armadas e identificamos o modelo teórico que, implícita ou
explicitamente, fundamenta estas análises, bem como seus limites explicativos.
Posteriormente, analisamos este modelo de forma mais detalhada e indicamos os
tensionamentos feitos pelos acadêmicos de Relações Internacionais à sobreposição
entre autoridade política, comunidade e território. Por fim, indicamos os ganhos
analíticos da adoção do conceito de legitimação para compreender o processo
de aceitação e rechaço da atuação das forças armadas no interior das fronteiras
estatais.
Blurring, ruptura e exceção
Um corpo bibliográfico considerável passou a indicar que algo está mudando
na relação entre a segurança interna e externa, principalmente a partir dos anos de
1990. Esta percepção está fortemente vinculada a afirmações sobre mudanças nas
tarefas dos instrumentos de força do Estado, como a aplicação de forças armadas no
interior das fronteiras nacionais, por um lado, e a transnacionalização das polícias,
por outro. Vários termos como bluring, sobreposição e ruptura foram utilizados
para tentar dar sentido a estes fenômenos. Weiss (2011), Eriksson e Rhinard (2009)
consideram, porém, que não há um modelo analítico geral, que sirva de base
para as pesquisas empíricas. Weiss (2011), neste sentido, argumenta que falta
definição precisa sobre os elementos que diferenciam as forças policiais e militares
e propõem interpretação baseada, por um lado, no território e, por outro, no tipo
de métodos e instrumentos que são empregados. Neste sentido, define a polícia
como ator com autoridade para empregar a coerção no interior das fronteiras do
Estado, enquanto as forças armadas estão destinadas ao âmbito internacional. Por
outro lado, os instrumentos e os métodos policiais são organizados visando o uso
mínimo da força, enquanto os militares se preparam para o emprego extremo da
violência. Apesar da crítica apresentada pelo autor, ao analisarmos a bibliografia
especializada, observamos que o modelo proposto por Weiss é precisamente aquele
utilizado, explícita ou implicitamente, pelas pesquisas que se dedicam a este tema.
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Desta forma, há, sim, um modelo sobre o qual as pesquisas são construídas.
É possível notar, porém, contínua tensão nas análises que, por um lado, apresentam
o emprego interno das forças armadas como ruptura com a normalidade e, por
outro, explicitam casos nos quais este tipo de atuação militar é tão constante, que
parecem ser a normalidade e não distorções pontuais. Este movimento pode ser
claramente observado na bibliografia sobre a mobilização do instrumento militar
para a repressão ao crime organizado, especialmente aquele vinculado ao tráfico
de drogas ilícitas, na América do Sul. Neste âmbito, grande corpo bibliográfico
defende que o emprego do instrumento militar no combate ao tráfico de drogas
representa distorção das missões precípuas das forças armadas, para as quais elas
não estão treinadas. Estes autores destacam que as forças militares são preparadas
para o uso máximo da violência, enquanto um concidadão que comete um delito
deve, através do uso mínimo da força, ser submetido ao sistema penal e não ao
instrumento de letalidade do Estado (López 2003, 2016; Mathias e Soares 2003;
Oliveira 1994; Rodrigues 2016; Sain 2001; Saint-Pierre 2007).
Por outro lado, ainda que no período posterior à Guerra Fria e ao fim das
ditaduras militares nesta região, o direcionamento da força militar para o interior
das fronteiras estatais tenha sido majoritariamente pautado pelo combate à
criminalidade, a atuação das forças armadas sul-americanas nas mais diversas
atividades domésticas é uma característica histórica da região (Rouquié 1984). No
Brasil, o instrumento militar empregou a força no âmbito interno ao longo de toda
sua história, reprimindo indígenas e movimentos contestatórios durante o Império
e a República, instituindo e dissolvendo essas duas formas de organização política,
reprimindo movimentos políticos durante o regime autoritário e combatendo o
crime organizado. Deste modo, ainda que o alvo das missões internas das forças
armadas tenha se alterado de acordo com as diversas conjunturas históricas, o
papel dos militares como responsáveis por manter a ordem interna é uma constante
(McCann 1979, 2007; Succi Junior 2018). O mesmo pode ser dito sobre o caso
argentino até 1983 (Dellasoppa 1998). Esta recorrência história não é negligenciada
pela literatura. Ao mesmo tempo que os autores questionam o direcionamento
dos meios militares contra grupos criminosos, ressalvam que a atividade militar
no âmbito doméstico não é inédita (Oliveira 1994; Rodrigues 2012; Soares 2006).
Esta tensão entre a ruptura da normalidade e o não ineditismo não é
característica exclusiva das análises sobre os países sul-americanos. No Canadá,
a preocupação relativa às atividade internas das forças armadas, a partir de 2006,
é incluída em contexto histórico de direcionamento militar para a garantia da
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ordem, repressão a greves e população autóctone (Head e Scott 2009; Morton
1970). Na Itália, destaca-se a utilização do instrumento militar para patrulha
urbana e controle migratório, principalmente a partir de 2008, ao passo que se
recordam as operações militares contra o crime organizado na década de 1990 e
a experiência autoritária do início do século XX (Clarke 2013; Lutterbeck 2010).
Em países africanos, marcados pelo estabelecimento artificial das fronteiras, há
também debate sobre um processo de bluring da divisão entre atuação militar
externa e policial interna, no contexto da contenção de conflitos civis (Ojo 2008).
Os termos ruptura, bluring, sobreposição e disfunção, frequentemente
utilizados pela bibliografia dedicada a esta questão pressupõem uma situação
anterior, de normalidade, que sofreu um desarranjo. O contraste entre a ideia de
exceção e a recorrência histórica observado nas análises revela o fato de estes
trabalhos adotarem como parâmetro de normalidade um modelo teórico normativo
e não uma apreciação histórica. Deste modo, o que está em tensão é justamente
o fundamento teórico utilizado para dar sentido à organização dos instrumentos
de força do Estado que, por vezes, é tratado como realidade objetiva. A divisão
entre o interno e o externo, fundante das Relações Internacionais, é um princípio
normativo que busca pautar como devem ser o emprego da força e a organização
política de forma mais ampla. O caráter normativo da divisão entre defesa e
segurança pública, pautada no interno pacificado e no internacional anárquico, que
fundamenta a diferenciação entre os instrumentos militar e policial, é evidenciado
por Saint-Pierre (2011). O autor explicita a lógica filosófica sobre a qual se assenta
esta divisão, cujo ponto inicial é a noção hobbesiana de pacto social, e afirma
que não se trata “de um início cronológico ou histórico, mas meramente lógico”
(Saint-Pierre 2011, 422).
Na América do Sul, a defesa deste modelo teórico como o parâmetro da
normalidade que teria sido distorcida e que, portanto, deveria ser reestabelecida,
conformou-se principalmente na produção acadêmica sobre as relações civil-
militares, interessada na reinserção das forças armadas no regime político
democrático, após o término das ditaduras militares, no fim da década de
1980. Há três grandes preocupações características desta produção. A primeira
é a necessidade de se estabelecer o controle político dos civis sobre as forças
armadas, que haviam tomado as estruturas de governo destes países. Neste
sentido, considerava-se que, para afastar os militares da esfera política, seria
necessário manter sua atuação direcionada para o externo. Em segundo lugar,
afastar as forças armadas das atividades internas refletia preocupação com o
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62 O doméstico e o internacional como discurso normativo: a legitimação do uso da força
uso da violência contra concidadãos, visto as sistemáticas violações de direitos
humanos perpetradas pelos militares durante os governos autoritários. Por fim,
a terceira preocupação é a de que a recorrência do emprego interno das forças
armadas contra atores não estatais poderia debilitar a capacidade destas forças
responder a ameaças estatais convencionais, o que comprometeria a autonomia
nacional destes países (D’araujo e Castro 2000; Mathias e Soares 2003; Saint-Pierre
2007; Saint-Pierre e Mathias 2001).
Pion-Berlin e Trinkunas (2011), por outro lado, opõem-se a esta abordagem
precisamente por a considerarem normativa. Argumentam que, na América Latina,
a desconfiança em relação aos militares é responsável pela consolidação, em alguns
países, da diferenciação estrita entre as funções das forças armadas e das polícias.
Os autores defendem que esta divisão estrita deixa estes Estados vulneráveis
a ameaças transnacionais intermediárias, que se encontram na interseção das
atribuições militares e policiais. Neste sentido, em trabalho posterior, Pion-Berlin
(2016) buscou romper com esta normatividade e propôs uma abordagem que
considera pragmática. O autor questiona em qual ocasião faria sentido alocar
as forças armadas em tarefas domésticas e argumenta que este tipo de emprego
do instrumento militar deve se basear em elementos que considera pragmáticos
como: urgência do problema; capacidade dos militares de responder ao mesmo
de forma efetiva; inexistência de solução alternativa.
A reivindicação de Pion-Berlin por resposta pragmática a uma realidade
supostamente objetiva é questionável. Por um lado, o argumento apresentado
pelo autor consiste em outra proposta sobre a forma em que as missões das forças
armadas latino-americanas devem ser geridas, mais do que esforço por explicar
as decisões já tomadas. Constitui-se, desta forma, outro princípio normativo.
Por outro lado, elementos como urgência do problema, capacidade de resposta
eficiente dos militares e inexistência de outras soluções, não são questões objetivas
e autoevidentes, mas dependem de um processo de definição e interpretação
da realidade. Ainda que vários atores observem a mesma situação, esta não
necessariamente será percebida da mesma forma e mesmo que seja, a ação
decorrente de tal percepção dificilmente será homogênea, de modo que não se
pode esperar que haja um único tipo de ação possível diante de dada realidade
material. Isto significa dizer, do ponto de vista teórico, que a materialidade
não tem precedência ontológica em relação à ação social (Guzzini 2013;
Saint-Pierre 2011).
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Guardadas as especificidades jurídicas nacionais, a determinação de que os
militares são a instituição do Estado responsável pela garantia de sua soberania
e que, em caráter emergencial, podem ser acionados no âmbito doméstico para
lidar com situações pontuais que tenham suplantado a capacidade operacional
das forças de segurança, é característica comum das jurisdições de democracias
liberais (Clarke 2006; Grosso 2012). A definição de uma situação como emergencial,
porém, é eminentemente política. Esta questão fica evidente na regulamentação
brasileira sobre a atuação militar em missões de Garantia da Lei e da Ordem
(GLO). A legislação estabelece que as forças armadas podem ser empregadas
em atividades deste tipo, quando os instrumentos destinados à segurança
pública forem insuficientes para lidar com determinada situação. No entanto, o
que define o esgotamento desses instrumentos não é um critério objetivo, mas
o reconhecimento formal, por parte do presidente, de sua indisponibilidade,
inexistência ou insuficiência.
Este artigo não é, portanto, mera crítica ao caráter normativo de uma
perspectiva teórica, contrastando-a com aquilo que se considera ser a realidade
objetiva. Pelo contrário, evidencia que o uso da força, ou seu rechaço, está
assentado em decisão valorativa e na definição e redefinição de uma ação como
aceitável. Tanto a clara delimitação entre interno e externo, quanto a perspectiva
pragmática são discursos que justificam ou rejeitam determinado tipo de prática.
Neste sentido, argumentamos que as questões a serem feitas para se compreender
o emprego dos instrumentos de violência do Estado e, mais especificamente,
o direcionamento das forças armadas para o interior das fronteiras nacionais,
referem-se menos à identificação da essência das atividades policiais e militares,
e mais a como se constrói o processo de proposição e aceitação do uso da força.
Desta forma, defendemos que a análise que busca compreender a utilização das
forças armadas no interior das fronteiras do Estado deve assumir que toda decisão
sobre o emprego da violência é eminentemente política e passa por um processo
de legitimação, para torna-la socialmente aceitável. Deste modo, não se deve
tratar um modelo teórico normativo como realidade histórica.
Abordagens correlatas à que propomos podem ser observadas no trabalho de
autores, cujo objeto de pesquisa é diverso daquele aqui analisado. Edmunds (2006)
argumenta que o processo de mudança nas missões principais das forças armadas,
assim como de suas estruturas, não representa resposta funcional pautada na
natureza das ameaças, mas é reflexo do que chama de influências social-políticas
internas e internacionais, que moldam a percepção dos Estados e de suas forças
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64 O doméstico e o internacional como discurso normativo: a legitimação do uso da força
armadas. Forster (2006), por sua vez, mostra que a transformação ou não das
tarefas desempenhadas pelos militares afeta sua relação com a sociedade à qual
pertencem e devem proteger, o que tem consequências para a legitimidade das
forças armadas enquanto instituição, isto é, a crença da sociedade na necessidade
do instrumento militar. Ainda que o autor não esteja empenhado em explicar
o que torna determinada atividade militar aceita, mas como o tipo de tarefas
desempenhadas pelos mesmos afeta a legitimidade da instituição frente à sociedade,
o trabalho de Foster, assim como o de Edmunds, converge com o argumento aqui
apresentado. Isso porque os autores, por um lado, não assumem um pressuposto
sobre quais devem ser as funções das forças armadas e, por outro, indicam que
a definição de tais funções influencia e é influenciada por uma série de fatores
sociais e políticos e não por uma resposta pragmática à realidade objetiva.
Da mesma forma, podemos destacar o trabalho de Levy (2014). O autor,
preocupado com a restrição do uso da força e a predisposição de um Estado
para lidar com problemas internacionais através da ação militar, defende que o
argumento segundo o qual o maior controle civil sobre as forças armadas reduziria
a propensão ao uso da força, mostrou-se falso quando se observa a relação entre
os civis e os militares nas democracias pós-Guerra Fria. Levy indica que, em
muitos casos, a intensificação do controle sobre os militares foi acompanhada
do aumento da militarização. O autor entende militarização como o processo
através do qual se incrementa o militarismo, que, por sua vez, é definido como
a concepção de que a guerra e a preparação para o conflito bélico são atividades
sociais normais e desejáveis.
Do ponto de vista analítico, Levy defende a necessidade de diferenciar dois
modos de controle: o controle dos militares, referente à restrição da liberdade de
ação das forças armadas em questões com implicação política; e o controle da
militarização, referente aos mecanismos de legitimação do uso da força, através dos
quais seria possível restringir a aceitação do mesmo. O autor rompe, assim, com
a ideia de que os militares são sempre favoráveis ao emprego da força, enquanto
os civis buscam sua restrição e chama atenção para as dinâmicas sociais que
produzem a propensão ao conflito militar.
Embora a preocupação central de Levy seja a mobilização externa do aparato
militar, quando defende que a restrição do uso da força se vincula ao controle
dos mecanismos de legitimação, isto é, de aceitação social do conflito violento,
é possível fazer um paralelo com o nosso argumento de que a compreensão
do uso da força requer análise do processo de sua construção como legítima.
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65David Paulo Succi Junior
O autor destaca ainda a dimensão normativa do processo de legitimação, que
considera estar vinculado a crenças sociais sobre a guerra, a natureza da ameaça
e a eficiência do uso da força.
Antes de nos dedicarmos de forma mais detida à ideia de legitimação e aos
ganhos analíticos que pode trazer para esta agenda de pesquisa, examinaremos
mais detalhadamente o modelo teórico que consideramos ser tomado por grande
parte da bibliografia como parâmetro de normalidade, em relação ao qual a
organização dos instrumentos de força do Estado é analisada. Deste modo, na
próxima seção, explicitaremos a lógica interna deste modelo e mostraremos que,
embora esta abordagem seja predominante nos trabalhos sobre o emprego interno
das forças armadas, ela foi amplamente tensionada pelos teóricos das Relações
Internacionais e dos Estudos de Segurança Internacional.
Interno e externo como discurso normativo
A perspectiva teórica que divide o mundo em unidades políticas pacificadas
internamente e um sistema internacional anárquico, fundamenta-se na ideia de
que a centralização do poder político e a constituição do Estado, caracterizado
pelo monopólio do direito ao uso da violência, eliminou a guerra no interior de
suas fronteiras, relegando-a ao âmbito externo. Nesta abordagem, as fronteiras
territoriais representam o ponto de separação entre uma situação polêmica e
outra agonística. Na primeira, a ausência de governo central produz um sistema
de autoajuda, segundo o qual cada Estado deve calcular seus riscos e assegurar
sua existência. Nesta situação, a violência letal, aplicada através das forças
armadas, é considerada instrumento legítimo para a resolução de conflitos e, no
limite, garantir a própria existência dos atores (Freund 1995; Mearsheimer 2001;
Waltz 2002).
A situação polêmica contrapõe-se, como indicado, ao âmbito interno,
caracterizado pela centralização da legitimidade do uso da violência, que
fundamenta um ordenamento jurídico destinado a regulamentar e pacificar a
relação entre os cidadãos. Este estado de coisas é denominado agonístico e se
caracteriza pelo abandono do uso da violência letal como instrumento legítimo de
resolução de conflitos. Na situação agonística está eliminada a ideia de inimigo,
isto é, aquele cuja supressão física é aceita e, muitas vezes, desejada diante
da ameaça que pode representar, e vige a figura do adversário. A relação entre
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adversários em um estado agonístico constitui disputa, cuja característica central
é ser pautada por regras previamente determinadas, das quais a norma fundante
é a não agressão. O cumprimento desta norma é garantido por um terceiro, no
caso, o Estado, ao qual é atribuída a legitimidade do uso da violência no âmbito
interno somente em sua versão coercitiva, ou seja, o emprego da força mínima,
necessária para fazer cumprir o conjunto de regras estabelecido (Bobbio 2003;
Freund 1995; Giddens 2008).
Sob esta perspectiva, aquele cujo comportamento não se adequa às normas
estabelecidas no interior do Estado não configura adversário, uma vez que não
está empreendendo uma disputa baseada no cumprimento de normas previamente
acordadas, mas também não configura inimigo a ser eliminado, por ser cidadão.
Pode ser considerado um criminoso, “um ‘desviante’ que deve ser ajustado
às normas de comportamento aceitável como o definido pelas obrigações da
cidadania” (Giddens 2008, 205). Há, deste modo, nítida delimitação entre o
conceito de defesa, por um lado, voltada à salvaguarda da existência do Estado
em relação a inimigos externos, de caráter militar, para a qual se emprega a força
letal máxima a fim de eliminar o elemento ameaçador e, por outro lado, o conceito
de segurança pública, caracterizada pela força de coerção mínima, visto que tanto
aquele que rompe o padrão de comportamento estabelecido juridicamente, quanto
sua vítima, estão inseridos no pacto social, pelo qual suas vidas estão garantidas
pelo Estado (López 2016; Saint-Pierre 2011). Neste sentido, podemos afirmar que,
sob esta perspectiva, a organização do uso da força é pautada pela coalescência
entre fronteiras físicas, autoridade política e comunidade. Desta forma, a fronteira
territorial localiza no espaço uma comunidade que se supõe homogênea e cuja
existência legitima a imposição do controle político sobre este território, assim
como forma específica de gestão da violência.
No âmbito das teorias das Relações Internacionais, a compreensão conceitual
da divisão entre o interno e o externo, característica das perspectivas teóricas
convencionais (Keohane e Martin 1995; Waltz 2002), tem sido amplamente
questionada. Um ponto comum entre seus críticos é a historicidade. Argumentam
que o Estado, em sua versão nacional, deve ser entendido como um tipo
historicamente único de organização territorial do espaço. Para esses autores, a
forma a-histórica na qual o Estado é tratado pelas abordagens tradicionais das
Relações Internacionais dificulta a explicação das transformações no sistema
internacional. (Agnew 1994; Ruggie 1993; Walker 1993; Wendt 1987). Neste
sentido, empreenderam um esforço de análise histórica e confrontação deste
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modelo teórico a partir de fenômenos empíricos, que contribuiu para a ruptura
da sobreposição entre fronteiras físicas, autoridade política e comunidade.
Consideramos que estes esforços trazem ganhos para a análise do nosso objeto
de estudo e nos auxiliam compreender a origem das dificuldades explicativas,
explicitadas na seção anterior. Desta forma, apresentaremos breve panorama dos
tensionamentos feitos a esta sobreposição teórica, examinando cada um de seus
componentes.
Do ponto de vista da unidade política, Ferguson e Mansbach (1996) argumentam
que a divisão estática entre o doméstico e o internacional é uma ficção legal, pois
um território pode conter diferentes unidades políticas como famílias, tribos, clãs
e impérios, sendo o Estado apenas outro tipo historicamente específico de unidade
política. Neste sentido, Agnew (1994) e Ruggie (1993) argumentam que um sistema
de autoridade não é necessariamente territorial, pode estar fundamentado no
parentesco e ser nômade. Da mesma forma, uma unidade política pode transcender
os Estados, como é o caso da União Europeia (Walby 2003).
A ideia de sistema de unidades territoriais mutuamente excludentes, no
interior das quais uma estrutura de autoridade detém o controle político absoluto
é geralmente associado ao conceito de soberania. Este, segundo Krasner (1999),
está vinculado a quatro questões diferentes: a) reconhecimento mútuo entre
os Estados territoriais da independência jurídica formal; b) exclusão de atores
externos das estruturas domésticas de autoridade; c) capacidade da autoridade
política de exercer controle efetivo no interior das fronteiras; e d) habilidade de
controlar fluxos através das fronteiras. O autor argumenta que, do ponto de vista
empírico, o princípio de soberania nunca foi estável e é rotineiramente violado,
referindo-se a ele como hipocrisia organizada.
O conjunto de tratados que encerrou a Guerra dos Trinta Anos, em 1648,
conhecido como Paz de Vestefália, é tradicionalmente apresentado na área de
Relações Internacionais como o marco da consolidação da soberania enquanto
autonomia política de unidades territoriais. Murphy (1996) e Osiander (2001)
argumentam, porém, que no século XVII não se pensava em ordem mundial ou
europeia pautada na soberania, da forma como a entendemos atualmente. Os
Estados, mesmo após 1648, não eram a única forma de organização territorial
das unidades políticas. Para além da Igreja, que exercia poder em muitas áreas, o
Sacro Império Romano era constituído por cidades livres, principados, ducados,
repúblicas, confederações e formas iniciais de Estado, que coexistiam no mesmo
território. Osiander (2001) atribui a leitura convencional da Paz de Vestefália, que
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68 O doméstico e o internacional como discurso normativo: a legitimação do uso da força
considera historicamente errônea, à propaganda de guerra, isto é, ao discurso
empregado pelas coroas francesa e sueca para justificar e tornar plausível sua
atuação militar. Este discurso legitimador, segundo o autor, foi apropriado pelos
historiadores do século XIX, entusiasmados com o conceito de Estado-nação. No
século XX, de acordo com Osiander, os acadêmicos de Relações Internacionais,
também sob a influência normativa deste conceito, deram continuidade a esta
imagem propagandística da guerra. Este processo, para o autor, produziu concepção
convenientemente simplista sobre o que é o internacional, que não é capaz de
lidar com padrões diversos de organização política.
Entre os fenômenos que evidenciam a artificialidade da concepção de
exclusão mútua pautada pela territorialidade, podemos citar um conjunto de
sistemas multilaterais de governança, que pressupõem a cessão de parcela da
autoridade política sobre um território, como as regulações internacionais sobre os
direitos humanos e questões ambientais (Benhabib 2009; Linklater 1998; Werrell
e Femia 2015). Ruggie (1993) argumenta que o estabelecimento de mercados
comuns, alianças militares, regimes funcionais ou até a extraterritorialidade das
representações estrangeiras em território nacional são artifícios empregados pelo
Estado para atenuar os efeitos da individualização absoluta, produzida pela ideia
de exclusão mútua.
Do ponto de vista do uso da força, pode-se indicar a tensão entre o direito
humanitário e a soberania, no âmbito da Responsabilidade de Proteger, a atuação
militar estrangeira no território de países considerados frágeis ou falidos, assim
como a tática militar do kill box (Evans 2009; Prinz e Schetter 2017). Murphy
(1996), por sua vez, mostrou como houve, historicamente, variação do uso do
conceito de soberania que em alguns momentos foi empregado para justificar
agressões militares e em outros para rechaçá-las. Neste sentido, podemos pensar
a soberania como conjunto de práticas e entendimentos intersubjetivos que se
alteram no tempo e no espaço e não a descrição empírica de um fenômeno objetivo
(Weber 1992).
O direito à autonomia política de um território, assim como o direito de
declarar guerra e a restrição do uso da força no âmbito doméstico, sob a perspectiva
convencional, fundamenta-se na ideia de que as fronteiras do Estado representam
as fronteiras de uma comunidade. Há, porém, dificuldade de se definir quem
é membro desta comunidade. Do ponto de vista dos teóricos contratualistas,
frequentemente empregados para sustentar a divisão entre o interno e o externo,
a comunidade é integrada por aqueles que voluntariamente atribuem poderes a
Rev. Carta Inter., Belo Horizonte, v. 15, n. 1, 2020, p. 56-79
69David Paulo Succi Junior
um soberano, com a finalidade de preservar a própria existência. Desta forma,
a comunidade estaria vinculada a uma decisão instrumental e suas fronteiras,
como interpretou Anderson (1996), se confundiriam com o espaço físico ocupado
pelos indivíduos envolvidos neste contrato inicial. Por outro lado, a delimitação
da comunidade pode ser pensada com base na ideia de nação e sua vinculação
com Estado territorial, característica do século XIX. Neste âmbito, a comunidade
é constituída por um grupo de indivíduos que se identificam em uma comunidade
imaginada, fundamentada em sentimento comum de herança, símbolos e cultura
compartilhada (Anderson 2008). A concepção moderna de Estado-nação, portanto,
fundamenta as prerrogativas desta organização política particular na suposição
de que ela contém e representa uma nação.
De forma contrária, Walby (2003) argumenta que há mais nações do que
Estados, pois uma nação não necessariamente constituiu uma estrutura política
e não se confunde com as delimitações estatais do território. Os exemplos são
múltiplos como os bascos na Espanha, os québécois no Canadá, os curdos no
oriente médio e os uigures na China. Rosenau (1997), por sua vez, argumenta
que a globalização promoveu duas dinâmicas sociais que tensionam a concepção
convencional de Estado-nação e que não são impedidas por suas limitações
territoriais e jurídicas. Por um lado, dinâmicas cosmopolitas conformaram
comunidades que transcendem as delimitações físicas dos Estados, por outro,
dinâmicas locais reafirmaram comunidades circunscritas às fronteiras territoriais
de um Estado, sem, porém, se identificar com ele. Walby (2003) argumenta, ainda,
que as experiências históricas frequentemente associadas ao Estado-nação, como
Espanha, Portugal e França do século XIX, constituíam, na realidade, impérios,
uma vez que não se podia supor que a população dos territórios dominados nas
experiências coloniais e neocoloniais eram parte integrante de uma nação.
Ademais, não se pode negligenciar o fato de a conformação do que se entende
por ambiente interno pacificado ter sido um movimento de imposição violenta
da autoridade política e determinada homogeneidade da comunidade (Rae 2003;
Souza et al. 2017; Tilly 1985). Heather Rae (2003) avançou este argumento ao
mostrar que momentos de construção e reconstrução de Estados — como no fim
da Idade Média na Europa, no colapso do Império Otomano e na dissolução da
União Soviética — estão vinculados a fenômenos como grandes deslocamentos
populacionais forçados, genocídios, limpeza étnica e conversões forçadas. A autora
afirma que, para afirmar sua legitimidade, as elites que conduzem a construção
do Estado executam um processo que define como homogeneização patológica.
Rev. Carta Inter., Belo Horizonte, v. 15, n. 1, 2020, p. 56-79
70 O doméstico e o internacional como discurso normativo: a legitimação do uso da força
Neste sentido, Bhambra (2015) ressalta que o debate sobre direitos civis, sociais
e políticos no âmbito do conceito de cidadania é precedido por um processo de
exclusão. Desta forma, eliminam-se os divergentes para, a partir de então, debater
igualdade no âmbito doméstico.
Diante dos problemas relativos ao espaço de autoridade política, a relatividade
do controle absoluto sobre um território e os processos de inclusão e exclusão
na delimitação de uma comunidade, é consensual na literatura sobre os Estudos
de Fronteira o argumento de que a fronteira não consiste em mero fenômeno
localizado nos limites territoriais, mas está disseminada em uma série de práticas
e discursos da vida cotidiana. A fronteira é tratada, neste sentido, como um
processo (Newman 2006; Paasi 2009).
Diante do quadro apresentado, consideramos que o denominado bluring entre
as forças armadas e a polícia consiste em um dos vários fenômenos que colocam
em questão a sobreposição entre território, autoridade política, comunidade,
cuja compreensão, assim como nas outras agendas de pesquisa brevemente
apresentadas, implica superação deste modelo teórico normativo. A tensão, que
apresentamos na primeira seção, entre a forma pela qual os instrumentos de força
do Estado foram historicamente empregados e busca por definição essencialista das
tarefas militares e policias, pautada na ideia de interno e externo e na sobreposição
de soberania, comunidade e território, resulta justamente do fato destes conceitos
não serem estáticos, mas, como mostramos nesta seção, constituírem discursos
normativos mobilizados para sustentar ações frequentemente contrastantes.
Não podemos, porém, negligenciar a importância deste modelo teórico.
Embora esta sobreposição não represente a descrição de uma realidade histórica
e objetiva, tem efeitos reais, pois molda e fundamenta ações políticas e sociais.
Ao suplantar concepções alternativas e se tornar o único modelo imaginável, a
naturalização desta perspectiva limita o modo como compreendemos e agimos
no mundo (Agnew 2008; Murphy 1996). Defendemos, então, que, para preencher
a lacuna identificada na bibliografia e compreender a forma na qual o emprego
interno das forças armadas é incorporado à normalidade jurídica e social, é
necessário analisar o processo de interpretação da realidade que constrói esta
prática como aceitável, considerando este modelo teórico tradicional discurso
legitimador e não uma descrição da realidade. Propomos, neste sentido, que este
posicionamento analítico é possível através do conceito de legitimação, como
apresentamos na próxima seção.
Rev. Carta Inter., Belo Horizonte, v. 15, n. 1, 2020, p. 56-79
71David Paulo Succi Junior
Legitimação do uso da força
Legitimidade para Max Weber (2002) é a probabilidade de que um comando
seja obedecido. Para tanto, é essencial que determinada ordem social detenha
um grau significativo de validez e se apresente, assim, como obrigatória ou como
modelo de ação. Sob esta perspectiva, a legitimidade é social e empírica, ao invés
de transcendental e normativa, ou seja, não há nada inerentemente legítimo ou
ilegítimo, mas algo que é construído como válido e passa, assim, a moldar as
ações sociais.
Quando os trabalhos sobre o emprego interno das forças armadas adotam
o modelo teórico convencional, estabelecendo quais ações são essencialmente
militares, acabam, ainda que não intencionalmente, assumindo abordagem
normativa da legitimidade, na qual a validez de determinada ação é avaliada
com base na sua maior ou menor aproximação de princípios universalistas pré-
estabelecidos. Assim, quanto mais próxima uma operação militar está do ideal
de defesa da soberania do Estado em relação aos seus homólogos, maior validade
é atribuída a ela pela bibliografia, como mostramos na primeira seção. Neste
sentido, duas ponderações devem ser feitas. Por um lado, como indicamos na seção
anterior, os princípios nos quais esta perspectiva se fundamenta são maleáveis,
alterando-se no tempo e sendo instrumentalizados para os mais diversos fins. Por
outro, negligencia-se o caráter relacional da legitimidade, que está fundamentada
na aceitação social de determinada ação ou ordem. Neste caso, o analista assume
para si o papel de julgar a legitimidade ou não de determinada ação, com base
em princípios apriorísticos.
Em sua abordagem empírica, a legitimidade se assenta na interpretação da
realidade social que, apesar de passar pela subjetividade, é um processo coletivo.
Neste sentido, a legitimação requer a conformação de consenso aparente, não
absoluto, de modo que, ainda que um indivíduo discorde ou não esteja certo sobre
sua concordância com determinada prática, acaba por consentir nela, uma vez que
a entende como coletivamente aceita. Este processo é cognitivo e normativo, dado
que passa pela atribuição de significado e valoração de determinada prática (Haunss
2007; Johnson, Dowd e Ridgeway 2006; Schneider, Nullmeier e Hurrelmann 2007).
Esta definição revela caráter processual da legitimidade, de modo que nada
é intrinsecamente legítimo, mas legitimado. Neste sentido, para evidenciar a
ideia de processo, Jackson (2006) emprega o termo legitimação, que define como
a construção e reconstrução dos limites do aceitável. Neste sentido, o esforço
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72 O doméstico e o internacional como discurso normativo: a legitimação do uso da força
analítico deve ser direcionado a explicar empiricamente como determinada prática
foi contingencialmente legitimada, tornando-se parte da normalidade. Jackson
(2006b) argumenta que esta análise passa pela compreensão da forma pela qual
crenças coletivas amplamente disseminadas, que denominam lugares-comuns,
são mobilizadas para justificar ações específicas.
Consideramos que endereçar o emprego das forças armadas no interior das
fronteiras do Estado através do conceito de legitimação permite avançar esta
agenda de pesquisa, por eliminar a tensão entre um modelo teórico normativo e
a realidade histórica, que este não consegue abarcar. A contradição entre ruptura
e continuidade deixa de ser entrave para os analistas, visto que o movimento de
legitimação permite compreender o processo pelo qual, em determinados casos,
o direcionamento do instrumento militar para operações internas foi incorporado
à normalidade jurídica e social.
Ademais, a partir da perspectiva da legitimação é possível compreender os
processos de continuidade e mudança da aceitação ou rechaço deste tipo de
tarefa militar, como o da reinterpretação da Lei de Defesa Nacional da Argentina.
Em 1988, no contexto do fim da ditadura militar no país e da transição para
um regime democrático, esta normativa foi criada com o objetivo afastar os
militares das tarefas internas, rompendo assim com padrão histórico de atuação
das forças armadas argentinas. Para tanto, estabeleceu que as funções das forças
armadas se restringem à proteção do país de ameaças externas. No momento de
sua promulgação, ficou claro que por ameaças externas entendiam-se ameaças
militares-estatais (López 2007; Sain 1999; Saint-Pierre 2007). No entanto, um
grupo de políticos e militares, com o objetivo de legitimar o emprego interno
das forças armadas, reinterpretou o significado de externo, argumentando que
o crime organizado transnacional, assim como grupos terroristas, têm origem
externa. Desta forma, a ameaça externa não seria interpretada por sua natureza,
estatal mas por sua localização geográfica (Canelo 2010; Sain 2001). Apesar das
pressões empreendidas por este grupo durante os anos de 1990 e início de 2000,
em 2006 o decreto 727 pôs fim à ambiguidade interpretativa ao estabelecer que
as ameaças externas de responsabilidade das forças armadas são as emanadas de
forças militares estrangeiras (Argentina 2006). O decreto, porém, não cessou este
movimento de ressignificação. Em 2013, atividades de segurança pública passaram
a ser desenvolvidas por militares nas regiões de fronteiras, sob a justificativa de
apoio logístico à polícia, previsto na legislação (Sain 2017). Por fim, em 2018,
o decreto 683 invalidou seu predecessor de 2006 e determinou que a proteção
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73David Paulo Succi Junior
contra ameaças, prevista na Lei de Defesa Nacional, abarca atores não-estatais
(Argentina 2018).
Interpretar o caso argentino pela perspectiva da legitimação permite, por
um lado, identificar a clara separação entre forças armadas e polícia, pautada na
ideia de interno e externo, como perspectiva normativa, vinculada ao movimento
político de restabelecimento de um regime democrático no país após a ditadura
militar, sem negligenciar, desta forma, o histórico de intervenções das forças
armadas em questões domésticas. Por outro, permite considerar a flexibilização
desta clara delimitação da Lei de Defesa Nacional, não como mera disfunção da
normalidade, mas como movimento normativo de reinterpretação que tensiona os
limites da ação aceitável, empreendendo o estabelecimento de nova normalidade.
Conclusões
A recorrência do emprego das forças armadas no interior das fronteiras do
Estado revela dificuldade cada vez maior de pensar o seu uso pautando-se na
distinção teórica entre ambiente doméstico pacificado e âmbito internacional
anárquico, separados pela delimitação territorial do Estado. Defendemos que este
modelo não corresponde a uma apreciação histórica, mas a uma interpretação
normativa sobre como a organização dos instrumentos de força do Estado deve
ser, frequentemente informada por preocupações como restrição do uso dos
instrumentos de violência do Estado e a garantia dos direitos humanos, controle
político democrático das forças armadas e estabelecimento de sistema de defesa
eficiente. Por outro lado, a perspectiva que apresenta o emprego interno como
pragmático, estabelece outro discurso normativo sobre como a definição das
tarefas militares e policias deve ser.
Do ponto de vista analítico, defendemos que apreciar o modo como determinada
forma de emprego do instrumento militar se torna, ou não, contingencialmente
aceito em tempo e espaço específicos, ao invés de buscar definições essencialistas,
permite dar sentido a práticas específicas e evita incorrer no erro de tratar uma
abordagem teórica normativa como realidade objetiva. Ademais, favorece a análise
dos processos de transformação, que tendem a gerar dificuldades analíticas quando
se parte de categorias fixas e a-históricas.
Devemos esclarecer, porém, que indicar uma perspectiva como normativa
não implica valoração negativa. Significa identificá-la como parte do processo de
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74 O doméstico e o internacional como discurso normativo: a legitimação do uso da força
legitimação, que promove ou rechaça determinada decisão política, a qual, por
sua vez, não é inerentemente positiva ou negativa, mas uma escolha em amplo
espectro de outras possíveis. Da mesma forma, ao afirmarmos que a atuação das
forças armadas no âmbito doméstico é um fenômeno historicamente recorrente em
alguns casos, como no dos países sul-americanos, não visamos apresentá-lo como
natural. Acreditamos, por fim, que abordar a definição das tarefas dos instrumentos
de violência do Estado sob esta ótica favorece a inserção desta escolha política no
âmbito do debate público, evitando que tal escolha seja tratada como inevitável.
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