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Genealogia e Agonismo como Metodologia
nas Relações Internacionais:
Reflexões a partir da Justiça de Transição
1
Reflecting upon Genealogic and Agonistic
Methodologies in International Relations:
the case of Transitional Justice
DOI: 10.21530/ci.v14n1.2019.821
Emerson Maione
2
Thiago Rodrigues
3
Resumo
Este artigo baseia-se em sugestões teórico-metodológicas de Michel Foucault. Em especial,
focaremos a analítica das relações de poder/saber, a genealogia, o agonismo, e as visões
desse autor sobre justiça, veridicção e constituição dos sujeitos. Para sugerir como trabalha a
metodologia genealógica, trazemos breves ilustrações sobre justiça de transição. Daí emerge
uma sugestão de análise da justiça de transição que visa enxergá-la não como algo que
apenas busque romanticamente a “verdade” e a “justiça”, mas também como uma verdadeira
frente de batalha cujo resultado dependerá das variações das relações de força em embates
localizados. Sugere-se, portanto, que a genealogia é uma metodologia capaz de gerar análises
que fujam do maniqueísmo que estabelece, rigidamente, o “certo” e o “errado”, o “justo” e
o “injusto”. E uma vez que a genealogia é, em si mesma, uma abordagem altamente política,
1 Agradecemos às/aos pareceristas e a Acácio Augusto (Unifesp) pelos instigantes e provocativos comentários e
sugestões à versão original deste artigo.
2 Emerson Maione é professor do Instituto de Relações Internacionais e Defesa da UFRJ. Doutor em Ciência
Política pela UFF com estágio doutoral no Institute of the Americas do University College London (UCL); mestre
em Relações Internacionais pelo IRI PUC-Rio. E-mail: emerson.maione@ufrj.br
3 Thiago Rodrigues é Professor do Instituto de Estudos Estratégicos da UFF (INEST); Coordenador do Programa
de Pós-Graduação em Estudos Estratégicos (PPGEST-UFF); Diretor de Relações Institucionais da Associação
Brasileira de Estudos Estratégicos (ABED); Diretor de Comunicação da International Studies Association’s
Global South Caucus; Pesquisador no LEPEB/INEST e no Nu-Sol/PUC-SP. Foi Professor Visitante da Universidad
Nacional de Colombia (Colombia).E-mail: trodrigues@id.uff.br
Artigo submetido em 02/07/2018 e aprovado em 30/01/2019.
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parcial, ela busca questionar discursos que, ao contrário, se apresentam como neutros e
universais. Por isso ela se foca não em “objetos” rígidos e supostamente isoláveis do conjunto
de acontecimentos sociais, mas interpela os acontecimentos, discursos e práticas de poder,
interessada em identificar quais relações de poder e saber moldaram tal objeto.
Palavras-chave: Justiça de Transição; Genealogia; Michel Foucault.
Abstract
This is article is based on theoretical-methodological suggestions by Michel Foucault.
It focuses on the analytics of power/knowledges relations, on genealogy, on agonism and
on his visions on justice, veridiction and the constitution of subjects. To suggest how the
genealogic methodology works we bring brief illustrations form Transitional Justice. From
this, it emerges an analysis of Transitional Justice that sees it not just as a romantic search for
“truth” and “justice” but also as a battle front whose results will depend on the variations of
force relations in localized struggles. Therefore, we suggest that genealogy is a methodology
capable of produce analyses that skip rigid dichotomies such as “right” and “wrong”, “just”
and “unjust”. And since genealogy is, in itself, a highly political and partial approach it seeks
to question discourses that, on the other side, presents itself as neutral and universal. Hence
it do not focus on rigid research “objects” that supposedly could be isolated from the set of
social events but questions the events, discourses and practices of power with the aim of
identify which relations of power and knowledge has shaped this object.
Keywords: Transitional Justice; Genealogy; Michel Foucault.
Introdução
Este artigo baseia-se em sugestões teórico-metodológicas de Michel Foucault
e tem o objetivo de sugerir como tais conceitos, metodologias e modos de análise
podem auxiliar no estudo da questão da justiça de transição (JT). Em especial, nos
focaremos na analítica das relações de poder/saber, na genealogia, no agonismo
e em suas visões sobre justiça, veridicção e constituição dos sujeitos. Apesar de
trazermos indicações de como tais questões teórico-metodológicas podem ser
aplicadas ao tema da JT, sugerimos que elas – como, em geral, quase todas as
metodologias – podem ser aplicadas a diferentes temáticas da política internacional
contemporânea, como os ilegalismos transterritoriais (narcotráfico, tráfico de seres
humanos) e o chamado terrorismo transnacional (ver RODRIGUES e K KALIL
FILHO, 2018; RODRIGUES, 2013 e 2017).
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A genealogia do poder é método analítico sugerido pelo filósofo francês
Michel Foucault (1979b; 1999; 2014; 2015) que visa examinar as condições de
possibilidades dadas, em um determinado período histórico, para a produção de
regimes de verdade, de conformação de táticas de governo, da emergência de
formas de resistência política e do estabelecimento das mais diversas configurações
das relações de poder. Usa a história como seu material bruto, porém seu objetivo
é o de intervir no presente, identificando discursos (políticos, econômicos,
jurídicos e sociais) vitoriosos em um determinado momento e sociedade, assim
como as práticas e discursos soterrados ou sujeitados à autoridade de grupos
sociais prevalecentes. Portanto, numa perspectiva genealógica, nenhum discurso
ou saber sobre qualquer aspecto da vida social é neutro ou desvinculado de
determinadas práticas, projetos de sociedade ou intenções políticas. O genealogista,
por sua vez, tampouco é neutro ou se considera o detentor da “verdade”,
pronto a indicar a parcialidade e falsidade dos demais discursos. A genealogia é,
consequentemente, sempre intencionada e parcial: explicita seu ponto de vista e
assume a impossibilidade de descrever todas as variáveis de um dado fenômeno
ou objeto. Essa intencionalidade assumida pelo genealogista visa questionar
discursos que, ao contrário, se apresentam como neutros e universais.
Baseados nas sugestões acima, na primeira parte deste artigo, destacamos
como a genealogia se foca não em “objetos” rígidos e supostamente isoláveis do
conjunto dos acontecimentos sociais. Voltada às controvérsias ao redor da definição
e construção dos diversos “objetos”, a genealogia interpela os acontecimentos,
discursos e práticas de poder interessados em identificar quais relações de poder
e saber moldaram esse objeto. Como uma determinada questão, uma determinada
causa ou objetivo político é produzido enquanto “problema”, ou seja, enquanto
um tema a ser equacionado, teorizado, classificado e regido por um conjunto
específico de normas e práticas de governo.
Na segunda parte, enfatizamos outra questão central para uma análise baseada
na analítica genealógica que é o tema da constituição dos sujeitos ou, como
colocou Michel Foucault, a dinâmica dos processos de subjetivação (FOUCAULT,
1995). Nesse movimento do artigo, destacamos, de maneira indicativa, como o
conceito de justiça de transição (JT) produz todo um processo de subjetivação
que lhe é próprio, instituindo, por exemplo, identidades como a da “vítima”, a do
“perpetrador de violações aos direitos humanos” e a do “mediador”. A JT tem a ver
com o modo como um país lida com o legado de violações em massa de direitos
humanos, seja de um período autoritário ou de guerra civil. Este modo de lidar
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com o legado pode envolver a instalação de Comissões da Verdade, a instituição
de julgamentos, reformas institucionais, reparações financeiras, ou mesmo uma
lei de anistia. Nos processos de JT temos, preferencialmente, vítimas e algozes.
Ao mesmo tempo, subjetividades mais complexas, que não cabem em histórias
pautadas em avaliações binárias – como a do(a) cúmplice, do(a) colaborador(a),
do(a) combatente da resistência – não são bem aceitas nos processos de JT e,
portanto, evitadas. Por seus papéis serem polêmicos e potencialmente produtores
de dissenso nos processos de JT, tendem a ser deixados de lado. Uma analítica
do poder sobre a prática da JT busca apontar, portanto, as limitações desse
quadro “vítima-perpetrador”, abrindo a possibilidade para que emerjam outras
subjetividades distintas desse binarismo.
Na terceira parte do artigo, propomos o exercício de analisar conceitos centrais
na JT, como os de “justiça” e “verdade”, a partir de uma análise agonística que
rejeita a descoberta ou estabelecimento de saberes ou verdades absolutas. Por
esse prisma, a questão da justiça é vista como parte da luta social e não como
algo que se pressupõe neutro e universal. A “verdade” também não depende de
uma instância suprema ou de revelações religiosas, filosóficas ou científicas, mas
seria apenas e tão somente uma produção local e transitória – e às vezes brutal –
resultante de relações agonísticas (de luta, de combate)
4
entre as pessoas, valores
morais, projetos político-sociais, interesses econômicos etc.
Concluímos o texto destacando que a contribuição da análise genealógica,
entre outros pontos, permite-nos acompanhar de perto as contingências de um
determinado tema, no nosso caso, a JT, possibilitando a elaboração de sua história
efetiva. Saber que nenhuma técnica, saber ou prática é ontologicamente dirigido
a um fim único libera-nos para pensar taticamente que alianças fazer e que alvos
selecionar. Nesse sentido, não nos interessa classificar ou julgar a JT como um
mero instrumento de dominação travestido de intenções humanitaristas, tampouco
de considerá-la como uma solução universalmente aplicável para reconciliar
sociedades fraturadas por violências e conflitos profundos. O que efetivamente
4 No texto “O sujeito e o poder” (F FOUCAULT, 1995), o filósofo francês Michel Foucault indica que a análise
dos processos de subjetivação, ou seja, como as pessoas são constituídas em sua individualidade, deveria ser
tomada como o efeito de incontáveis e infindáveis enfrentamentos entre diferentes forças externas e internas
ao próprio indivíduo. Desse modo, para Foucault, a ideia de “natureza humana” (“boa” ou “má”, “sociável” ou
insociável”) deveria ser superada pela noção de uma modelação a partir de uma perspectiva que não conceba as
individualidades como “naturais” e/ou “universais”. Ao contrário, o que somos é produto de combates (ágon,
em grego antigo) realizados cotidianamente das mais ínfimas às mais gerais relações de poder. O conceito de
agonismo será desenvolvido nas seções seguintes deste artigo.
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buscamos é oferecer uma leitura da JT como técnica, instrumento político e
dispositivo de governo que pode assumir muitas funções táticas, tanto liberadoras
e conciliadoras, quanto instauradoras de novas práticas de sujeição e controle.
“Desfuncionalização e desinstitucionalização” das relações
de poder
Quando Michel Foucault (1998, 1999, 2002, 2014) estudou a produção de
conceitos como os de loucura, delinquência, sexualidade, ou a emergência do
Estado moderno, não foi sua intenção analisá-los em relação à instituição, à função
e aos objetos em si. Seu foco, por outro lado, era em como procedimentos, técnicas,
tecnologias, táticas e estratégias associadas a determinadas práticas formavam
uma instável economia geral das relações de poder/saber que constituíam
subjetividades associadas a esses objetos de saber. Tais relações constituíam aquilo
que em determinado período era entendido como “loucura”, “crime/criminoso”,
conduta moral/perversidade”, e quais eram as respostas institucionais, científicas
ou jurídicas adequadas para lidar com essa questão. Por isso, Foucault não
compreendia as “identidades” e os “saberes” sobre tais identidades como algo
acabado, mas que dependiam de regimes de verdades (conjunto de discursos,
valores e definições) formados ao seu redor para lhes darem significado.
Desse modo, ao efetuar o deslocamento da instituição como foco de análise
ele cita, por exemplo, que ao invés de partir do que é o hospital psiquiátrico, seria
mais interessante “passar por trás da instituição a fim de tentar encontrar, detrás dela
e mais globalmente que ela, o que podemos chamar grosso modo de tecnologia de
poder”, visando mostrar “como essa ordem psiquiátrica coordena por si mesma todo
um conjunto de técnicas variadas relativas à educação das crianças, à assistência
aos pobres, à instituição do patronato operário” (2008, p. 157). Assim, ele destaca
que esse tipo de análise poderia substituir a análise da gênese ou origem de um
conceito ou problema por uma análise genealógica que “reconstitui toda uma rede
de alianças, de comunicações, de pontos de apoio” (ibid;).
5
Sobre o segundo deslocamento, com relação à função, Foucault cita o caso
da prisão. Pode-se estudá-la a partir das funções que foram definidas como ideais
5 Para outras críticas sobre a análise do poder nos espaços institucionais, ver Foucault (1995, p. 245-247) e Eribon
(1995, p. 75-77).
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e depois partir para estabelecer um balanço funcional do que era esperado e do
que na verdade foi alcançado. Mas ele destaca que, ao estudar a prisão pelo viés
da disciplina (isto é, “métodos que permitem o controle minucioso das operações
do corpo, que realizam a sujeição constante de suas forças e lhes impõem uma
relação de docilidade-utilidade” (2014, p. 135), seria possível evitar esse ponto de
vista funcional e “ressituar a prisão numa economia geral de poder”. Assim, uma
análise genealógica da prisão “sem dúvida não é comandada pelos sucessos e
fracassos da sua funcionalidade, mas que ela se inscreve na verdade em estratégias
e táticas que se apoiam até mesmo nos próprios déficits funcionais”. Portanto,
Foucault substituiu “o ponto de vista interno da função pelo ponto de vista externo
das estratégias e táticas” (idem, 2008, p. 158).
O terceiro descentramento, a terceira passagem ao exterior, é em relação ao
objeto. Aqui Foucault explica que assumir o ponto de vista das disciplinas era
“recusar-se a adotar um objeto já pronto, seja ele a doença mental, a delinquência
ou a sexualidade”. Era recusar-se “a querer medir as instituições, as práticas e os
saberes com o metro e a norma desse objeto já dado. Tratava-se, em vez disso,
de apreender o movimento pelo qual se constituía através dessas tecnologias
movediças um campo de verdade com objetos de saber” (2008, p. 158). Dessa
forma, nos limites desse artigo, analisamos como a JT se constitui, simultaneamente,
como um objeto de saber e uma tática de poder. Assim, pode-se investigar, por
exemplo, como os primeiros discursos sobre o tema da JT construíram um objeto
a partir do acoplamento de antigas práticas (julgamentos, comissões da verdade,
reparações e reformas institucionais), e os questionamentos críticos mais recentes
que enfatizam as disputas, deslocamentos, instabilidades implicados na própria
construção da JT. Em suma, Foucault explica que
o ponto de vista adotado em todos [aqueles] estudos consistia em procurar
destacar as relações de poder da instituição, a fim de analisá-las sob o prisma
das tecnologias, destacá-las também da função, para retomá-las numa análise
estratégica e destacá-las do privilégio do objeto, a fim de procurar ressituá-las
do ponto de vista da constituição dos campos, domínios e objetos de saber
(2008, p. 159).
Essas tentativas de “desinstitucionalizar e desfuncionalizar” as relações de
poder, empreendidas por Foucault, visavam estabelecer sua genealogia, isto é,
a maneira como elas se formam, se conectam, se desenvolvem, se multiplicam,
se transformam a partir de algo totalmente diferente delas mesmas, a partir de
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processos que são totalmente diferentes das relações de poder” (2008, p. 160).
Com esses deslocamentos, ele evitava remeter as relações de poder somente à
centralidade do Estado e cita o exemplo do exército. Dizer que o “disciplinamento
do exército deve-se à sua estatização” é explicar “a transformação de uma
estrutura de poder numa instituição pela intervenção de outra instituição de poder.
O círculo sem exterioridade” (ibid.). Ao passo que uma análise genealógica busca
não o disciplinamento posto em relação à concentração estatal, mas o problema
do governo das populações, a importância das redes comerciais, as invenções
técnicas, os modelos de gestão de comunidade: “é toda essa rede de alianças, de
apoio e de comunicação que constitui a ‘genealogia’ da disciplina militar. Não a
gênese: filiação. Para escapar da circularidade que remete à análise das relações
de poder de uma instituição a outra, só apreendendo-as onde elas constituem
técnicas com valor operatório em processos múltiplos” (2008, p. 160-161).
Com relação à JT, sugere-se, nesse artigo, buscar entender como ela foi
constituída como um campo transnacional de prática, de poder e de saber. Por
isso, apesar da importância da aplicação de suas técnicas em lugares específicos,
ela também se constituiu como algo que se estabeleceu “internacionalmente”, no
sentido de ter se desenvolvido, se multiplicado e se transformado a partir de algo
totalmente diferente das decisões domésticas dos Estados. Estas transformações
ocorreram a partir de processos que refletiam transformações maiores, geopolíticas
e ideológicas, no início dos anos de 1990. Portanto, conforme foram sendo
estabelecidos tribunais internacionais ad hoc e permanentes, esses passaram a
ser vistos como outros aparatos a mais a compor a tática de poder da JT, mesmo
que não refletissem suas preocupações e teorizações iniciais. A partir dos anos de
1990, a JT não serviria apenas para as transições para democracia, mas deveria
ser transformada e ampliada para estabilizar ambientes conflagrados e sociedades,
passando por situações de pós-conflito. Com isso, ela passou a fazer parte de
uma ampla gama de instituições e a atender a um espectro cada vez maior de
interesses estatais, empresariais, de ONGs de expressão global, dentre outros atores.
A JT foi, em termos da analítica genealógica, constituída como uma técnica com
valor operatório em processos múltiplos (ver também FOUCAULT, 2015, p. 112).
A partir dessa perspectiva, propomos uma história do processo de constituição
e das dinâmicas que produziriam e produzem a JT como um dispositivo global
para o gerenciamento de conflitos e crises políticas, sociais, étnicas e geopolíticas
contemporâneas.
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Genealogia, acontecimentos e processos de subjetivação
A genealogia, como método de análise histórico-político proposto por Michel
Foucault, busca uma forma de história “que dê conta da constituição dos saberes,
discursos, dos domínios de objeto, etc., sem ter que se referir a um sujeito (...)
constituinte” (1979a, p. 7). Ela quer enfatizar as lutas históricas sobre a verdade,
o conhecimento, a autoridade e o poder, sem tomar o que está sendo analisado
como um objeto finalizado, como vimos na seção anterior. Para tanto, exige-se o
esforço analítico de abrir mão de categorias “universais”, seja o Estado, a sociedade
civil, a segurança e defesa, o povo ou mesmo a JT. Nas palavras de Foucault,
Suponhamos que os universais não existem (...) em vez de partir dos
universais para deles deduzir fenômenos concretos, ou antes, em vez de
partir dos universais como grade de inteligibilidade obrigatória para um certo
número de práticas concretas, gostaria de partir dessas práticas concretas e,
de certo modo, passar os universais pela grade dessas práticas (2008a, p. 5).
Por isso, ao analisar a emergência do Estado moderno, ele toma o Estado ao
mesmo tempo como um dado e como algo ainda em construção: “O Estado é ao
mesmo tempo o que existe e o que ainda não existe suficientemente” (2008a, p. 6).
É um dado, pois existe como ente concreto no real – fruto de práticas reais a partir
do momento em que são coordenadas a um regime de verdade – e algo ainda em
construção, pois, para Foucault, ele existe como “correlato de uma certa maneira
de governar”. Dessa forma, “o problema está em saber como se desenvolve essa
maneira de governar, qual a sua história, como ela ganha, como ela encolhe, como
ela se estende a determinado domínio, como ela inventa, forma, desenvolve novas
práticas” (2008a, p. 9)
6
. Essa “certa maneira de governar” dará ao Estado seu caráter
mutante, e não estático, como na concepção jurídica da soberania, pois seja na
forma de governar baseada na razão de Estado, entre os séculos XVI e XVII, com
estabilidade interna e competição externa, ou baseada na “biopolítica”, a partir
dos séculos XVIII e XIX, com o controle da população como objeto de intervenção
estatal, uma série de novas práticas, conhecimentos e sujeitos são formados para
6 De modo a captar o caráter mutante e contestado da JT, talvez possamos dizer, parafraseando Foucault, que
ela existe como correlato de “uma certa maneira de fazer justiça”. Assim, o problema está em saber como se
desenvolve essa maneira de fazer justiça, qual a sua história, como ela se estende a determinados domínios,
como ela é produtora de novas práticas, expertises, campos de saber, sujeitos conhecedores (acadêmicos,
analistas, consultores), exclusões e inclusões.
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161Emerson Maione; Thiago Rodrigues
responder a novas relações de poder. Portanto, para Michael Shapiro, “Foucault
não começa com o Estado como um fenômeno universal e pergunta como ele
age, mas, ao contrário, analisa como vários acontecimentos criaram o fenômeno
móvel, em constante mudança conhecido como Estado” (SHAPIRO, 2015, p. 21).
A genealogia, como um saber que busca reativar as lutas passadas para
compreender os combates do presente, procura trazer à tona as táticas e estratégias
que permitiram, historicamente, o governo de homens e mulheres. Portanto, foca
justamente em como esta luta secular atravessou seus corpos, disciplinou-os e
forjou um regime jurídico e de saber que reinscreve cotidianamente a batalha
da política na vida civil (R RODRIGUES, 2010). Por isso, Foucault é enfático:
“Seria um erro acreditar, segundo o esquema tradicional, que a guerra geral, se
esgotando (...) acaba por renunciar à violência e aceita sua supressão nas leis da
paz civil”. Ao contrário, a lei “permite reativar sem cessar o jogo da dominação;
ela põe em cena uma violência meticulosamente repetida” (1979b, p. 25; ver
também, 1999, p. 23).
Por isso, uma perspectiva genealógica ativa e articula uma “analítica do poder”
e não uma teoria geral do poder. Uma analítica do poder busca compreender
relações específicas de forças, de enfrentamentos, focar um acontecimento no que
ele tem de singular, “uma relação de forças que se inverte, um poder confiscado,
um vocabulário retomado e voltado contra seus utilizadores, uma dominação
que se enfraquece, se distende, se envenena e uma outra que faz sua entrada,
mascarada” (FOUCAULT, 1979b, p. 28). O genealogista, para Foucault, examina
efetivamente o que possibilitou a inversão, a luta, a resistência e o combate. Ali, no
calor do combate, vemos o “acaso da luta” (ibid.), o “jogo casual das dominações”
(ibib., p. 23). Pois essa luta determinará a regra geral ou as leis que, por sua vez,
sofrerão resistências, constituirão novos sujeitos, novas relações de saber-poder
e, eventualmente, novas regras e novas lutas e resistências: “a humanidade não
progride lentamente, de combate em combate, até uma reciprocidade universal,
em que as regras substituiriam para sempre a guerra; ela instala cada uma de
suas violências em um sistema de regras, e prossegue assim de dominação em
dominação” (ibid., p. 25). A história dos povos seguiria errática, entre lutas,
resistências e sujeições sem a possibilidade – ou a expectativa – de uma pacificação
final (RODRIGUES, 2010, p. 288).
Nessa perspectiva, não devemos ter a visão romântica da JT como algo que
apenas busca como destinação uma “reconciliação” final da sociedade consigo
mesma, ou mesmo uma “justiça” para os que sofreram sob o julgo autoritário ou de
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162 Genealogia e Agonismo como Metodologia nas Relações Internacionais: Reflexões a partir da Justiça [...]
uma guerra civil. A JT também é uma frente de batalha, ativada permanentemente
quando um acontecimento inverte uma relação de forças ou estabiliza um sistema:
quando uma guerra civil acaba, um regime político cai, uma maioria oprimida
se insurge contra a minoria opressora. São muitos os exemplos históricos e
contemporâneos de que uma troca de governo, uma reeleição, uma decisão
jurídica doméstica ou no exterior, um documento encontrado, uma declaração
de um antigo oficial trazem à tona toda uma rearticulação de forças que já se
imaginava enfraquecidas, memórias supostamente esquecidas, grupos antes
dispersos, novas estratégias que se formam para enfrentar novas batalhas (ver,
entre outros, RONIGER e SNAJDER, 2004; ROTH-ARRIAZA, 2005; HOLLANDA,
2018; BERNARDI, 2015 e 2017). E essas batalhas, que são ao mesmo tempo
políticas e jurídicas, determinarão se haverá ou não uma “comissão da verdade”
(e sob quais restrições), se o conflito terá resolução, se indenizações serão pagas,
se memoriais serão erguidos ou destruídos, se as vítimas verão os perpetradores
nos bancos dos réus. Enfim, serão complexos jogos de poder que definirão, em
cada caso, como se dará um processo de JT.
Autores de viés liberal/legalista enxergam a consolidação, principalmente
no pós-Guerra Fria, de uma “justiça em cascata” (justice cascade, no original),
na qual estaria incorporada tanto o direito doméstico quanto o internacional
e que, por isso, seria de improvel reversão e que o passado de “um mundo
sem nenhuma responsabilização por grandes episódios de violações de direitos
humanos, [estaria] finalmente acabando” (SIKKINK, 2011, p. 262). Ao contrário,
o viés genealógico põe ênfase não na progressiva difusão do direito internacional
dos direitos humanos que estaria derrubando as barreiras das violações de uma vez
por todas, mas nas batalhas visando trazer a perspectiva de uma “história efetiva”,
outro nome que Foucault, a partir da leitura que fez de Friedrich Nietzsche, deu
à genealogia. De uma perspectiva genealógica, não evolucionista ou teleológica
(que vê um destino inevitável para a História da humanidade), a própria ideia de
uma expansão inevitável e irreversível dos direitos humanos pelo globo pode ser
vista como uma “meta narrativa triunfalista” de “acurácia duvidosa” (HOPGOOD,
2013, p. 48; ver também, MOYN, 2010 e 2014; GUILHOT 2005 e 2008; HOFFMAN,
2011 e 2011a; IRIYE, GOEDDE e HITCHCOCK, 2012; MADSEN, 2011; MUTUA 2001;
MAIONE, 2014). Por isso será trazido para o centro da análise aqui proposta não
uma história progressiva e progressista, indicando um suposto caminho ideal
para a solução de conflitos e suas violências, mas a JT em suas “anomalias,
contingências, manipulações e contradições” (ibid.).
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163Emerson Maione; Thiago Rodrigues
Um texto fundamental para se entender os objetivos de Foucault ao realizar
uma série dispersa de estudos genealógicos, como o autor se referia às suas
pesquisas anteriores, e insistir nas análises das relações de poder, é o artigo “O
Sujeito e o Poder” (FOUCAULT, 1995). O texto é importante, pois tendo sido
publicado em 1984, ano de sua morte, permite uma reavaliação das pesquisas
empreendidas por ele desde meados dos anos de 1960. Ele explica que “não foi
o poder, mas o sujeito, que constitui o tema geral de minha pesquisa” (ibid.,
232). Seu objetivo foi “criar uma história dos diferentes modos pelos quais, em
nossa cultura, os seres humanos tornaram-se sujeitos” (ibid., 231). Ele cita como
exemplo seus estudos sobre a história da sexualidade e diz que buscou neles
apreender “o modo pelo qual um ser humano torna-se um sujeito (...) como os
homens aprenderam a se reconhecer como sujeitos de ‘sexualidade’” (ibid., 232).
Para dar conta das especificidades de estudos como esses, o filósofo destaca
que sua escolha metodológica não seria a de analisar a racionalidade interna do
poder, mas “ela consiste em usar as formas de resistência contra as diferentes
formas de poder como ponto de partida (...) ela consiste em analisar as relações de
poder através do antagonismo das estratégias” (ibid); e cita que, para se entender
a sanidade, deve-se olhar a insanidade, assim como para se investigar a legalidade,
deve-se ver o que se compreende por ilegalidade. Assim, “para compreender o que
são as relações de poder, talvez devêssemos investigar as formas de resistência”.
Ele cita uma série de oposições que se desenvolveram basicamente a partir dos
anos de 1960: “a oposição ao poder dos homens sobre as mulheres, dos pais sobre
os filhos, do psiquiatra sobre o doente mental, da medicina sobre a população,
da administração sobre os modos de vida das pessoas” (ibid.). O que essas lutas
têm em comum seria o fato de serem lutas “transversais”, não limitadas a um
país; “são lutas ‘imediatas’, visam o inimigo imediato, são lutas anárquicas; elas
questionam o estatuto do indivíduo; são lutas contra os privilégios do saber, e
estas lutas contemporâneas questionam: quem somo nós?” (ibid., p. 234-235;
ver também, CAMPBELL, 1996; ASHLEY, 1989, p. 296-7; BASARAN et. al., 2017;
BUTLER, 2016).
O autor, em suma, explica que o principal objetivo dessas lutas “é atacar,
não tanto ‘tal ou tal’ instituição de poder ou grupo de elite ou classe, mas, antes,
uma técnica, uma forma de poder (...) [que] aplica-se à vida cotidiana imediata
que categoriza o indivíduo (...) que faz dos indivíduos sujeitos” (ibid., p. 235).
Ele destaca “dois significados para a palavra sujeito: sujeito a alguém pelo
controle e dependência, e preso à sua própria identidade por uma consciência
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164 Genealogia e Agonismo como Metodologia nas Relações Internacionais: Reflexões a partir da Justiça [...]
ou autoconhecimento. Ambos sugerem uma forma de poder que subjuga e torna
sujeito a ” (ibid.). O filósofo, então, liga a formação dos sujeitos tanto ao poder do
Estado quanto a essas lutas individuais. Para o autor, “o poder do Estado (e esta
é uma das razões da sua força) é uma forma de poder tanto individualizante quanto
totalizadora”. Seria uma “combinação (...) das técnicas de individualização e dos
procedimentos de totalização” (ibid., p. 236).
Foucault traça a genealogia dessas técnicas de poder, ao mesmo tempo
individualizantes e totalizadoras, desde o início da era cristã, com o “poder
pastoral” (ver, 2008 e 2003b) e a “pastoral da carne” (2018); com o desenvolvimento
das técnicas de confissão depois do Concílio de Latrão, em 1215 (ver, 2015, p. 65-77;
2001, p. 211-254); passando pelo desenvolvimento dos inquéritos judiciais na Idade
Média (ver, 2002); e, nos últimos séculos, com o desenvolvimento da medicina,
economia, estatística, psiquiatria e uma série de saberes que tanto controlam a
população em geral quanto o indivíduo em particular (ver FOUCAULT, 2008a).
São formados, desse modo, ao longo da história, diferentes dispositivos produtores
de verdade. Assim, para Foucault, além do problema filosófico de questionarmos
“o que somos”, diante desse “duplo constrangimento” político, individualizante e
totalizador, próprio às estruturas do poder moderno, talvez tenhamos que “recusar
o que somos” para imaginarmos e construirmos o que poderíamos ser para além
do que nos tornamos ao sermos, de certa forma, constituídos por esses poderes
(ver, 1995, p. 239).
Em seus últimos trabalhos, portanto, Foucault destacou a necessidade de
problematizarmos os processos de subjetivação – “a produção de cada um de nós”
(RODRIGUES, 2014, p. 417) – através de “um ethos filosófico que seria possível
caracterizar como crítica permanente de nosso ser histórico” (FOUCAULT, 2005, p.
345). Essa crítica será genealógica na medida em que “deduzirá da contingência
que nos fez ser o que somos a possibilidade de não mais ser, fazer ou pensar o
que somos, fazemos ou pensamos (...) ela procura fazer avançar para tão longe
e tão amplamente quanto possível o trabalho infinito da liberdade (...) ou seja,
um trabalho paciente que dá forma à impaciência da liberdade” (ibid., p. 348 e
351). Por isso, Foucault destacava que o sujeito não se constitui apenas através de
práticas de sujeição, mas também de “maneira mais autônoma, através de práticas
de liberação, de liberdade” que vê a moral não apenas “como obediência a um
código de regras”, mas como uma “ética pessoal”, uma “estética da existência”
(FOUCAULT, 2004, p. 290-291; 2017a; 2017, p. 15, 18, 107, 111, 123, 176, 236-237).
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165Emerson Maione; Thiago Rodrigues
Nesse sentido, podemos analisar como em torno das práticas históricas de
JT foi possível produzir-se todo um processo de subjetivação que lhe é próprio.
Nos processos de JT temos, como indicado anteriormente, “vítimas” e “algozes”,
enquanto outras “identidades”, como a do(a) cúmplice, do(a) colaborador(a), do(a)
combatente da resistência, são evitadas por razões diversas
7
. No caso da África
do Sul, por exemplo, a Comissão de Verdade e Reconciliação, ativa entre 1996 e
1998, teve por objetivos oficiais tratar de “vítimas” e “perpetradores”. Essas duas
categorias tiveram suas definições estabelecidas no relatório final da Comissão,
de 1998, pois eram os critérios usados para se julgar as concessões de anistias.
Para essa comissão, “quando lidamos com graves violações de direitos humanos
[definidas como ‘casos de assassinato, tortura, sequestro e maus-tratos’] a pessoa
contra quem a violação foi cometida só pode ser descrita como vítima, independente
de ele ou ela terem sobrevivido” (Truth and Reconciliation Commission of South
Africa Report, 1998, vol. 1, p. 59, grifos nossos). Consequentemente, a palavra
“perpetrador” era usada “para descrever todas as pessoas que a Comissão julgou
ter cometido graves violações de direitos humanos” (ibid.).
A rigidez do quadro “vítima-perpetrador” fez com que a comissão sofresse
uma série de críticas, inclusive por parte das próprias “vítimas”, já que a adoção
do padrão de direitos humanos internacionais para julgar um crime deixou de
fora uma série de outros atos perpetrados pelo regime do Apartheid, como as
remoções forçadas, nas quais houve deslocamentos em massa de população negra
para áreas especificadas pelo governo controlado pela minoria branca. Do mesmo
modo, muitos dos que “lutaram com os movimentos de libertação não gostaram
de ser rotulados como vítimas que necessitavam de cura, mas se viam como
guerreiros(as) cujas feridas foram parte da luta” (LEEBAW, 2011, p. 84; HOLLANDA,
2013). O resultado foi que muitos partidários e apoiadores do Congresso Nacional
Africano, o partido de Nelson Mandela, se recusaram a prestar depoimento à
comissão. Fato esse lamentado no relatório final, por não poder passar um quadro
completo do passado (LEEBAW, 2011, p. 84; Truth and Reconciliation Commission
of South Africa Report, 1998, vol. 5, p. 199). Mesmo assim, “muitos dos que foram
depor acharam que a Comissão interpretou seus testemunhos como histórias de
vitimização, ao mesmo tempo em que subestimavam suas atividades e visões
políticas” (LEEBAW, 2011, pp. 84-85). Uma analítica do poder aplicada à JT busca
7 Para instigantes análises de como o relatório da Comissão Nacional da Verdade, no Brasil, reproduziu essas
exclusões, ver Furtado (2017) e Oliveira (2015).
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166 Genealogia e Agonismo como Metodologia nas Relações Internacionais: Reflexões a partir da Justiça [...]
apontar, portanto, as limitações desse quadro “vítima-perpetrador” para tentar
abrir espaços para a potencialização de outras subjetividades.
O agonismo das correlações de forças como produtor da justiça
e dos regimes de veridicção
Conforme indicado na seção anterior, para analisar as relações de poder na
sua especificidade e na sua capacidade de produzir sujeitos, saberes e direitos
é preciso ver o poder não apenas como uma energia repressiva, mas, acima de
tudo, como uma força produtiva, geradora de situações, de instituições, de leis, de
subjetividades. Para Foucault, isso significa deixar de lado uma visão economicista
e jurídica do poder, que o compreende como um bem que se possui e que se
aliena, partindo de um centro único e que teria apenas “a potência do ‘não’
incapacitado para produzir, apto apenas a colocar limites, seria essencialmente
antienergia” (2015, p. 93; e 2014, pp. 28 e 189). Essa visão de poder, “o velho
sistema que vocês encontram nos filósofos do século XVIII”, Foucault chama de
o “esquema contrato-opressão” ou a “hipótese de Reich” (1999, p. 24). Ao se
aterem a esse esquema, até hoje, as análises tradicionais da política e do direito
– e, acrescentaríamos, das teorias das tradições realista e liberal das relações
internacionais (RODRIGUES, 2012) – ainda não teriam “cortado a cabeça do
rei” (2015, p. 97) ou, em outras palavras, não teriam se livrado de uma noção
do poder como força meramente repressiva que emana de um centro, o Estado.
Com o propósito de articular outra mirada sobre as relações de poder, uma que
não dependa do contrato originário que seria constitutivo da soberania, Foucault
propõe o “esquema guerra-repressão” ou a “hipótese de Nietzsche” (1999, p.
24). No lugar do contrato, cessão e alienação do poder de uma instância menor
para outra maior, “não devemos analisá-lo [o poder] antes e acima de tudo em
termos de combate, enfrentamento ou de guerra?” (ibid., p. 22). Para isso, inverte
a conhecida proposição de Clausewitz e propõe “a política é a guerra continuada
por outros meios” (ibid; RODRIGUES, 2010).
Nesse sentido, Foucault observa que busca analisar não o que é o poder, mas
como o poder é exercido de fato (FOUCAULT, 1995, p. 240). Nessa visão, colocar
a questão “o que é isto?” seria atrelar uma essência (ou uma ontologia) ao objeto
que se vai analisar (FOUCAULT, 2013, p. 104; Shapiro, 2015; Ashley, 1987, p. 52;
Ashley, 1989, p. 282-3 e 311). Michel Foucault destaca que, para escapar de uma
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167Emerson Maione; Thiago Rodrigues
“metafísica” ou de uma “ontologia” do poder, e tentar uma investigação crítica,
é importante focar na pergunta direta e empírica: como acontece quando os
indivíduos exercem poder sobre os outros? (1995, p. 240). Em suma, “abordar
o tema do poder através de uma análise do ‘como’ é, então, operar diversos
deslocamentos críticos com relação à suposição de um ‘poder’ fundamental.
É tomar por objeto de análise relações de poder e não um poder” (ibid, p. 242;
grifosno original). Visa analisar a especificidade das relações de poder, de uns
sobre outros, e as dinâmicas desencadeadas a partir dessas confrontações.
Uma vez que tal exercício consiste em “conduzir condutas” e “ordenar
probabilidades” (1995, p. 243 e 244), ele pressupõe que as condutas e as
probabilidades estejam, a rigor, sempre abertas e sujeitas a reversões e a resistências:
há uma disputa cujo resultado, por mais provável que possa parecer em algum
embate, não está dado. Daí Foucault salientar que entre poder e liberdade não
haveria uma oposição, onde o exercício de um anulasse o outro; mas haveria um
jogo muito mais complexo:
neste jogo, a liberdade aparecerá como condição de existência do poder
(...) A relação de poder e a insubmissão da liberdade não podem, então,
ser separadas (...) Mais do que um “antagonismo” essencial, seria melhor
falar de um “agonismo” – de uma relação que é, ao mesmo tempo, de
incitação recíproca e de luta; trata-se, portanto, menos de uma oposição de
termos que se bloqueiam mutuamente do que uma provocação permanente.
(ibid., p. 244-245)
Vemos a ênfase dada por Foucault ao embate entre relações de poder e
estratégias de confronto. Uma vez que a liberdade é uma condição da relação de
poder “não há relação de poder sem resistência, sem escapatória ou fuga, sem
inversão eventual” (FOUCAULT, 1995, p. 248; sobre esse ponto, ver também
FOUCAULT, 2015, p. 103-105; 1979c, p. 241; 2003a, p. 232). Como Foucault
buscava articular uma analítica do poder e não uma teoria do poder, essa analítica
teria um caráter parcial e limitado, e não neutro e universal, disposta a analisar
as relações de poder em sua concretude e localidade históricas (...) se coloca
próxima ao acontecimento, à vista do exercício de força que se efetiva e das
resistências que suscita” (RODRIGUES, 2010, p. 283-284). Para Foucault (2015,
p. 103), “a racionalidade do poder é a das táticas muitas vezes bem explícitas no
nível limitado em que se inscrevem – cinismo local do poder”. Com a articulação
dessa analítica do poder, que analisa os mecanismos de poder pelo campo das
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168 Genealogia e Agonismo como Metodologia nas Relações Internacionais: Reflexões a partir da Justiça [...]
correlações de forças, Foucault destacou que seria “possível escapar ao sistema
Soberano-Lei que por tanto tempo fascinou o pensamento político” (ibid., p. 105).
As relações de poder, vistas desse modo, são um conjunto de situações estratégicas
que não são passíveis de pacificação na paz civil do Estado (ver RODRIGUES, 2010).
A partir das questões teóricas e metodológicas discutidas ao longo deste
artigo, podemos analisar como conceitos centrais na JT, como os de “justiça” e
“verdade”, seriam tratados a partir de uma análise genealógica e agonística. Nessa
visão, que rejeita definições absolutas e universais de identidades e subjetividades,
para examinar conceitos a partir de suas práticas concretas e como resultados de
embates e correlações de forças, a questão da justiça é vista, consequentemente,
como parte da luta social e não como algo que se pressupõe neutro e universal
(ver Chomsky e FOUCAULT, 2014, pp. 63 e 69).
A partir da perspectiva da política como guerra, do “discurso da guerra
perpétua” (FOUCAULT, 1999, p. 67), vê-se a política como espaço de combate
onde “o direito, a paz, as leis nasceram no sangue e na lama das batalhas”
(Foucault, 1999, p. 58). Por isso, não há pacificação possível, pois “a paz, na
menor das engrenagens, faz surdamente a guerra” (ibid., p. 59; ver também,
2014, p. 302). Percebe-se, por essa abordagem, como a “verdade” tem uma função
estratégica, já que ela “funciona explicitamente como arma” (ibid., p. 68). A luta
pela verdade não seria “um combate ‘em favor’ da verdade, mas em torno do
estatuto da verdade e do papel econômico-político que ela desempenha” (1979a,
p. 13). A luta pela verdade seria, portanto, a disputa pela definição do que é
“verdadeiro”; assim como a busca da “justiça” seria a luta pela definição do que
é “justo”. Foucault trata da emergência de um regime de verdade como o princípio
que vai dar o contorno conceitual hegemônico à construção de um determinado
objeto de análise, ao articular ao seu redor um conjunto específico de saberes e
práticas. Isto é, as práticas ao redor do objeto traçado – seja a loucura, a doença,
a delinquência, a sexualidade, ou, no nosso caso, a JT – são inseridas na ordem
do saber e do poder, no campo das técnicas políticas, constituindo assim o objeto
como o conhecemos (ver FOUCAULT, 2008a, p. 26-27).
Nesse sentido, entende-se que se busca com a genealogia não a “unidade de
uma causa principal”, mas “reconstituir as condições de aparecimento de uma
singularidade a partir de múltiplos elementos determinantes, de que ela aparece
não como produtor, mas como efeito” (Ibid., p. 67). Pode-se destacar, por exemplo,
como aquilo que veio a ser tido como “justiça de transição” emergiu a partir de
um emaranhado de diferentes elementos: comissões da verdade, julgamentos,
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169Emerson Maione; Thiago Rodrigues
expurgos, tribunais internacionais, anistias, reparações econômicas e psicológicas,
dentre outros. O contexto político do final dos anos de 1980 e início dos anos
de 1990 também deve ser destacado para se analisar seus “múltiplos elementos
determinantes”. Era uma época de grandes transformações. Chegava-se ao fim
da Guerra Fria e com isso houve todo um rearranjo geopolítico e ideológico: os
países do Leste Europeu tinham que lidar com o legado de décadas do comunismo
autoritário; na América Latina, a questão premente era a transição política para
a democracia; desde o final dos anos de 1970, os direitos humanos estavam na
pauta da política externa dos EUA e, com isso, a questão da “democratização” ou a
chamada “promoção da democracia” se tornou premente em todo o mundo; também,
desde os anos de 1970, formou-se uma rede de ativistas de direitos humanos que
passaram a pressionar os Estados tidos como violadores; na primeira metade
dos anos de 1990, lutas nacionalistas ou reivindicadas por questões identitárias
promoveram genocídios e massacres; tribunais internacionais vieram como resposta.
Todas essas questões mencionadas acima são processos diferentes
(democratização, direitos humanos, genocídios, tribunais internacionais) em lugares
diversos e com efeitos dispersos. No entanto, um conjunto de “interferências” por
parte de instituições internacionais e locais, de saberes acadêmicos, de ONGs, de
doadores, de políticos e de ativistas de direitos humanos formou um regime de
verdade ao colocar essas diferentes práticas sob um mesmo nome e em busca de
um mesmo objetivo. Em suma, pode-se analisar com relação ao campo da JT, como
“o par ‘série de práticas/regimes de verdade’ forma um dispositivo de saber-poder
que marca efetivamente no real o que não existe e submete-o legitimamente à
demarcação do verdadeiro e do falso” (ibid., p. 27). Por isso, Foucault destacava
a importância política de se fazer a história do regime de veridicção, isto é,
“determinar em que condições e com quais efeitos se exerce uma veridicção”,
verificar o que permitiu determinado dispositivo de saber/poder “afirmar como
verdadeiras algumas coisas que, aliás, hoje sabemos talvez não o fossem tanto
assim” (ibid., p. 50).
Para retornar ao que destacamos no início deste artigo, a análise genealógica
não toma por análise um objeto já pronto, pois se trata de “apreender o movimento
pelo qual se constituía através dessas tecnologias movediças [por exemplo, o
conjunto de ‘interferências’ e ‘múltiplos elementos determinantes’, citados nos
dois parágrafos acima] um campo de verdade com objetos de saber” (FOUCAULT,
2008, p. 158). Ela não foca “objetos” rígidos e supostamente isoláveis do conjunto
dos acontecimentos sociais. Voltada às controvérsias ao redor da definição e
Rev. Carta Inter., Belo Horizonte, v. 14, n. 1, 2019, p. 153-176
170 Genealogia e Agonismo como Metodologia nas Relações Internacionais: Reflexões a partir da Justiça [...]
construção dos diversos “objetos”, a genealogia interpela os acontecimentos,
discursos e práticas de poder interessada em identificar quais relações de poder e
saber moldaram esse objeto. Como uma determinada questão, uma determinada
causa ou objetivo político é produzido enquanto “problema”, ou seja, enquanto
um tema a ser equacionado, teorizado, classificado e regido por um conjunto
específico de normas e práticas de governo. A genealogia, portanto, não foca
objetos de pesquisa propriamente ditos, mas nas relações e lutas de poder ao redor
deles (BONDITTI et al., 2015, p. 169). Ao analisarmos como a JT foi constituída
como um objeto de saber, devemos levar em consideração “a ‘vontade de saber’
que lhe serve ao mesmo tempo de suporte e instrumento” (FOUCAULT, 2015, p.
17). Assim, trata-se de “definir as estratégias de poder imanentes a essa vontade
de saber (...) constituir a ‘economia política” de uma vontade de saber” (ibid.,
p. 83). Na visão de Foucault, isso queria dizer a colocação do objeto analisado
numa “economia geral dos discursos”: no nosso caso, levar em consideração o
fato de se falar sobre a JT, “quem fala, os lugares e o ponto de vista de que se
fala, as instituições que incitam a fazê-lo, que armazenam e difundem o que dele
se diz” (ibid., p. 16). Enfim, sugerimos aqui o exame da produção da JT como
um discurso de verdade nos últimos trinta anos.
Reflexões finais:
para uma analítica do poder na justiça de transição
Para uma genealogia da JT é necessário destacarmos as ligações do contexto
político e dos saberes implicados em casos concretos nos quais o termo JT foi
utilizado para conduzir processos de transição política ou de conciliação nacional.
Em outras palavras, é preciso traçar as condições sob as quais a emergência
histórica da JT foi possível em cada caso concreto. Busca-se uma análise das lutas
de poder e das rivalidades interpretativas através das quais a JT emergiu como uma
problematização, ou seja, como objeto de análises políticas e morais (FOUCAULT,
2017). Nessa perspectiva, as perguntas devem envolver questões como: quais são
as condições políticas que levaram a que determinados problemas tenham sido
formulados em termos de JT? Quais saberes foram vistos como adequados para
responder aos novos problemas trazidos pelo o que foi chamado de JT? Como isso
se relaciona com a maneira que conceitos como os de justiça, transição, verdade
e poder são compreendidos? Como a JT se desenvolve, se multiplica, se encolhe,
Rev. Carta Inter., Belo Horizonte, v. 14, n. 1, 2019, p. 153-176
171Emerson Maione; Thiago Rodrigues
a partir de condições que são diferentes das que lhe deram origem? Sob quais
condições os saberes e as práticas da JT estão sendo problematizados?
Pela perspectiva genealógico-agonística, a JT não deve ser tida como algo que
está “naturalmente” ao lado da verdade, da justiça e da reconciliação, mas ela se
constitui como uma frente de batalha na qual atores diversos e imersos em lutas
específicas, enfrentam-se para estabelecer o que consideram como verdadeiro e
justo. Como parte da luta social, a JT pode servir a vários propósitos, considerados
válidos e justos por alguns atores, enquanto injustos ou punitivos por outros.
O importante numa analítica da JT é questionar os discursos que partem do
pressuposto teleológico de que ela é o caminho que levará a sociedade e o Estado de
um passado obscuro para um futuro luminoso. O caminho a ser traçado dependerá,
apenas, dos resultados dos enfrentamentos entre as várias forças na sociedade.
Na história efetiva e genealógica da JT é possível encontrar práticas
provenientes de tradições não punitivas e não jurídicas, como o ubuntu na África
do Sul, que foram incorporadas e recondicionadas pelos procedimentos jurídicos
de matriz ocidental. Quando isso ocorreu, os tribunais e comissões de verdade não
se tornaram menos punitivos, mas, ao contrário, adaptaram-se a renovadas formas
de punição. Novamente, no agonismo das forças, prevaleceu a “verdade” de quem
triunfava após muitas décadas de opressão e violências. Se há elementos presentes
na JT que podem ser reconhecidos, apropriados e ressignificados, não é possível
saber a priori. A análise genealógica, no entanto, possibilita uma aproximação tática
com a história dessas práticas e com as dinâmicas que modelaram seus modos
de ação. Por esse caminho, é possível escapar do maniqueísmo que estabelece,
rigidamente, o “certo” e o “errado”, o “justo” e o “injusto”. Saber que nenhuma
técnica, saber ou prática é ontologicamente dirigida a um fim único, nos libera
para pensar taticamente que alianças fazer e que alvos selecionar.
Neste artigo, mais do que realizar uma análise fechada a respeito da formação
da JT, procuramos indicar uma perspectiva analítica, a partir das sugestões teórico-
metodológicas de Michel Foucault, que explicitasse dois elementos fundamentais:
o primeiro é a necessidade de deslocar-se do modelo epistemológico no qual
se enraízam as discussões no campo do direito internacional e das relações
internacionais, centradas nos princípios contratualistas e nas noções tradicionais
de Estado, poder, política e justiça; o segundo é a proposição de uma analítica
genealógica para JT, compreendo-a como uma tática de gestão de conflitos em
cada país na qual foi ativada, vinculada, portanto, aos contextos histórico-políticos
locais e moldada pelas correlações de força em ação. A “justiça” no campo da JT
Rev. Carta Inter., Belo Horizonte, v. 14, n. 1, 2019, p. 153-176
172 Genealogia e Agonismo como Metodologia nas Relações Internacionais: Reflexões a partir da Justiça [...]
não é um conceito universal. Sua definição depende de quem a formula e quem
a propõe. A perenidade de sua aplicação dependerá, por sua vez, das resistências
e combates em torno da sua aplicação, não sendo definíveis a priori. O analista,
no entanto, pode mapear as forças em luta e, a partir de uma noção agonística
da política, tem condições de elaborar possíveis cenários nos quais elementos
vinculados ao campo da JT – como as comissões de verdade, as negociações para
reintegração civil de grupos armados, a punição de “perpetradores”, a compensação
financeira e/ou simbólica das “vítimas” – serão arranjados numa determinada
sociedade. Resta, então, compreender a JT como parte de um processo global de
formação de um governo dos conflitos pela articulação entre as iniciativas de ONGs,
organizações internacionais, Estados individualmente ou em associação etc. Essa
análise, que não cabe nos limites deste artigo, pode ganhar muito em capacidade
explicativa a partir dos fundamentos teórico-metodológicos aqui apresentados.
A partir desse convite a um estudo da JT por lentes distintas das usualmente
encontradas nos manuais de direito internacional ou de relações internacionais,
pretendemos abrir uma conversação sobre o agonismo dos processos políticos,
que não excluem, de modo algum, a busca pela justiça e pela apresentação de
verdades soterradas pelas batalhas da vida social. Entrar nesse campo de embates
com novas armas analíticas é nosso convite e sugestão.
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