207Angélica Saraiva Szucko
Rev. Carta Inter., Belo Horizonte, v. 13, n. 1, 2018, p. 200-223
como França, Espanha como Espanha, Grã-Bretanha como Grã-Bretanha, cada
uma com seus próprios costumes, tradições e identidades”
8
(THATCHER, 1988,
p. 4, tradução nossa); todavia, segundo George (1991), tal passagem não pode
ser interpretada de forma isolada do texto proferido pela então primeira-ministra
britânica. O autor destaca outro trecho, que simbolizaria o internacionalismo
britânico: “A Grã-Bretanha não sonha com uma existência acolhedora e isolada
à margem da Comunidade Europeia. Nosso destino é na Europa, como parte da
Comunidade (...) Isso não quer dizer que nosso futuro reside apenas na Europa”
9
(THATCHER, 1988, p. 3, tradução nossa).
Em síntese, o argumento de Stephen George (1991) é que a política britânica,
ao mesmo tempo em que é influenciada pela necessidade de defender a soberania
nacional parlamentar, também se compromete com outros valores, que derivam
da posição do país no século XIX: a crença em uma economia liberal e o senso
de que o Reino Unido tem uma missão internacional e uma responsabilidade
especial de contribuir para a construção da ordem mundial. Esses valores são
o que o autor denomina “compromisso com o internacionalismo global”. Nesse
sentido, o autor justifica a relutância britânica a um tipo de regionalismo que
poderia desenvolver um bloco econômico relativamente fechado com matizes
supranacionais e guiado por uma linha política que atende apenas aos interesses
dos países membros.
Conforme observado, a resistência britânica ao processo de integração
europeia é histórica e sempre esteve presente nas atitudes de diferentes governos.
Considerando o argumento de Albert Hirschman (1970)
10
, em seu livro Exit, Voice
and Loyalty, sobre o declínio das organizações
11
, segundo o qual os membros podem
decidir vocalizar suas insatisfações ou sair da organização, os opt-outs do Reino
Unido na União Europeia são compreendidos como instrumentos de vocalização
do desinteresse no aprofundamento da integração e da preferência por mecanismos
intergovernamentais, ao invés de supranacionais. Nessa perspectiva, o resultado
da recente consulta popular simbolizaria a incapacidade de adaptação dos anseios
8 France as France, Spain as Spain, Britain as Britain, each with its own customs, traditions and identities.
9 Britain does not dream of some cosy, isolated existence on the fringes of the European Community. Our destiny
is in Europe, as part of the Community (…) That’s not to say that our future lies only in Europe.
10 Para uma análise mais atual utilizando o mesmo argumento, ver: HILMARSSON, 2017.
11 Entende-se que se trata de uma extrapolação do argumento do autor, mas já prevista pelo mesmo. “The argument
to be presented starts with the firm producing saleable outputs for customers; but it will be found to be largely
– and, at times, principally – applicable to organizations” (HIRSCHMAN, 1970, p. 3).