Rev. Carta Inter., Belo Horizonte, v. 12, n. 3, 2017, p. 5-29
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Guilherme Simionato dos Santos, Marco Cepik
limitada
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, por mais que a precisão ideal seja atingida (ZHAO, 2011). Afinal,
a penetração depende não apenas da velocidade, mas também da ogiva explosiva
e, portanto, do tamanho do míssil — o que é limitado, uma vez que põe em risco
a capacidade de sobreviver às defesas antiaéreas adversárias e de surpreender
o inimigo.
Nesse sentido, se contrastarmos as demandas de cada missão, anteriormente
explicitadas (principalmente em termos de prontidão vs. surpresa tática), com
as capacidades propostas para os sistemas que recebem os maiores recursos,
fica evidente uma preferência pela surpresa tática em detrimento da prontidão
(vide AHW e HSSW). Isso significa que as missões mais prováveis no caso de
implementação do CPGS, seriam o (1) ataque preemptivo contra força nuclear,
(2) o ataque preemptivo contra sistemas ASAT e a (3) supressão de defesas
antiaéreas. Por sua vez, as missões de caráter retaliatório ou contraterrorismo
continuam a ser cumpridas pelos sistemas já existentes, desde mísseis balísticos
nucleares até drones, passando por mísseis cruzadores subsônicos.
Ou seja, há uma clara inconsistência entre as justificativas públicas para o CPGS
e seus usos mais prováveis. Afinal, os Estados Unidos contam com alternativas
críveis para as missões de retaliação, as quais são utilizadas como justificativa
para os investimentos no CPGS desde seus primórdios. Entretanto, sabe-se que
a possibilidade de obter surpresa tática está cada vez mais comprometida pelas
capacidades dos modernos sistemas de radares. Mesmo as aeronaves e mísseis
stealth enfrentariam sérias dificuldades em surpreender um adversário dotado
de sistemas de radares e mísseis antiaéreos de média capacidade (KOPP, 2009)
25
.
Eis porque, na prática e contrariando o discurso oficial, o desenvolvimento dos
24 Atualmente, as ogivas de penetração convencional conseguem, em média, chegar a uma profundidade de 10 m
em concreto endurecido. Após isso, o raio da explosão (e sua capacidade de desabilitar os sistemas protegidos)
depende do potencial explosivo da ogiva. Nos sistemas CPGS, a força cinética criada por um impacto a velocidades
hipersônicas (Mach 22 para mísseis balísticos) é muito superior às das ogivas convencionais, no entanto, isso
ocorre, pelo menos atualmente, em detrimento de uma ogiva explosiva capaz de efetivamente explodir após a
penetração. Mesmo considerando que, em breve, fosse desenvolvido um material capaz de proteger a ogiva do
impacto inicial, a penetração aumentaria no máximo em 3 vezes, ou seja, para um alcance de 30 m. No entanto,
o potencial explosivo da ogiva após a penetração ainda estaria limitado pelo rendimento da ogiva e pelo pouco
espaço físico disponível para armazenamento no míssil, não acontecendo aumento substancial na área destruída
(ZHAO, 2011). Como base de referência, os mais de 5.000 km de túneis subterrâneos da China ou mesmo os do
Irã (embora mais precários) estão localizados a centenas de metros de profundidade (KARBER, 2011).
25 Diversos estudos põem em questionamento a efetividade de penetração de aeronaves stealth, demostrando, por
exemplo, que a utilização de radares de banda VHF levemente modificados da década de 1950 podem colocar
em cheque o seu uso, como o caso do F-117A derrubado sobre a Sérvia em 1999. Além disso, parece bastante
evidente que, pelo menos, China e Rússia não tenham grandes dificuldades em detectar os modernos caças
stealth, especialmente o projeto mais caro da história dos EUA, o F-35 (KOPP, 2009).