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As razões de existência do Conselho de Defesa Sul-Americano da UNASUL
As razões de existência do Conselho de Defesa
Sul-Americano da UNASUL
The reasons for existence of the UNASUR
South American Defense Council
DOI: 10.21530/ci.v11n3.2016.485
Tamires Aparecida Ferreira Souza
1
Resumo
Com o desenvolvimento do regionalismo, a presença de ameaças transnacionais, além
de problemas e soluções estrategicamente sensíveis às constituições históricas, nasce a
necessidade de uma cooperação que una os países de uma determinada região. Nota-se
um movimento de medidas interestatais, em que os Estados desejam consolidar novas vias
para o progresso cooperativo no campo da defesa, como através do Conselho de Defesa
Sul-Americano (CDS), da União de Nações Sul-Americanas. A proposta de formação do
primeiro conselho sub-regional de defesa da América do Sul fez-se a partir da justificativa
de enriquecimento dos mecanismos de cooperação militar e extensão do nível de confiança
mútua a toda à região. O presente artigo objetiva analisar o CDS por meio de seus fatores
sistêmicos, institucionais e operacionais. Para tanto, será utilizada a técnica de entrevista,
realizada com autoridades e representantes do Conselho, na Argentina e no Brasil. Verificou-
se, com a pesquisa, que o CDS conta com significativos avanços no campo de medidas de
confiança e de indústria e tecnologia de defesa, bem como na construção de estruturas
permanentes do órgão. Contudo, o Conselho encontra-se em fase de aprimoramento,
apresentando dificuldades em relação a consensos e transparência, não compondo ainda
uma voz sul-americana única em defesa.
Palavras-chave: Cooperação; Defesa; América do Sul; União de Nações Sul-Americanas;
Conselho de Defesa Sul-Americano.
Abstract
With the development of regionalism, the presence of transnational threats and solutions
strategically sensitive to the historical constitutions come the need for a cooperation that
unites countries of a certain region. A movement of inter-state measures is noted which the
1 Doutoranda em Relações Internacionais pelo Programa de Pós-Graduação em Relações Internacionais San Tiago
Dantas (UNESP, UNICAMP e PUC-SP) e bolsista CAPES do projeto Pró-Defesa 3. Mestre em Estudos Estratégicos
Internacionais pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul.
Artigo submetido em 07/06/2016 e aprovado em 08/09/2016.
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States want to consolidate new ways for cooperative progress in the defense field, as through
the South American Defense Council (CDS), of the Union of South American Nations. The
proposal for the establishment of the first South American sub-regional security council
was made under the justification of the possibility of enrichment the military cooperation
mechanism and extension of the mutual confidence level throughout the region. This article
aims to analyze the CDS through its systemic, institutional and operational factors. Therefore,
it will be used the interview technique, carried out with authorities and representatives of the
Council, in Argentina and Brazil. Through the research was founded that the CDS account
with significant advances in the field of confidence measures and defense industry and
technology, as well as in the construction of permanent structures in the organ. However,
the Council is in the process of improvement, presenting difficulties regarding consensus
and transparency, not composing yet an only South American voice in defense.
Keywords: Cooperation, Defense, South America, Union of South American Nations, South
American Defense Council.
Introdução
2
Com o fim da Guerra Fria, criou-se um cenário de regionalização de conflitos
e de suas soluções, proporcionando a busca pela compreensão das condições
que moldam os sistemas regionais (SOLINGEN, 1998, p. 5). Nesse contexto, os
Estados necessitam buscar formas coletivas, já que as ameaças
3
atuais perpassam
as fronteiras nacionais e regionais. Concomitante ao fato de que nenhum Estado
está invulnerável a alguma ameaça, o que requer a cooperação com outros países,
para que assim as inseguranças sejam discutidas e solucionadas, e o entorno, bem
como os Estados, tornem-se mais seguros (UNITED NATIONS, 2004, p. 1-16).
Em relação ao caso sul-americano, nota-se, especialmente durante o século
XXI, a busca por uma cooperação tanto bilateral como multilateral, com destaque
para a criação da União de Nações Sul-Americanas (UNASUL) e de seu Conselho
de Defesa Sul-Americano (CDS). Vale ressaltar que, apesar dessa conjuntura
cooperativa, ainda há a presença de ameaças, construindo-se a necessidade
de um aprofundamento dos processos cooperativos em defesa, associado à
confiança mútua e a transparência entre os países. Nesse cenário, destacamos
nossa compreensão sobre o termo cooperação em defesa como um processo que
abrange os âmbitos político, militar e de indústria de defesa e que busca preservar
a soberania dos Estados e impedir possíveis conflitos.
2 Agradecimento especial às contribuições do Prof. Dr. Marco Cepik.
3 Segundo Saint-Pierre (2007, p. 3) “ameaça é uma representação, um sinal, uma certa disposição, gesto ou manifestação
percebida como o anúncio de uma situação não desejada ou de risco para a existência de quem percebe”.
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As razões de existência do Conselho de Defesa Sul-Americano da UNASUL
O presente artigo
4
tem como objetivo analisar o Conselho de Defesa Sul-
Americano, desde sua estrutura à sua atuação. Para tanto, o estudo se pautará
em seus fatores sistêmicos, que abrangem o reconhecimento internacional do
CDS e seu poder de influência sobre os seus Estados membros; institucionais,
referentes à estrutura organizacional e ao comprometimento dos Estados membros;
e operacionais, voltados aos Planos de Ação e às medidas e ações tomadas pelo
seu Centro de Estudos Estratégicos em Defesa (CEED-CDS).
Destacamos a utilização da técnica de entrevistas nesse artigo, com a finalidade
de compreender a opinião dos entrevistados no que tange as questões centrais
referentes ao Conselho de Defesa Sul-Americano e ao processo de cooperação em
defesa na região, tendo como base as dinâmicas e os posicionamentos da Argentina
e do Brasil. Foram realizadas entrevistas com seis autoridades
5
, em 2014, com
apoio de um roteiro semiestruturado, gerando, aproximadamente, três horas de
gravação de áudio no total. Objetivando-se uma análise sobre o CDS, procurou-se
ouvir os entrevistados a respeito: da compreensão do conceito de cooperação em
defesa e sua aplicação à região sul-americana; análise do CDS por meio de seus
fatores institucionais (estrutura organizacional e comprometimento dos Estados
membros) e operacionais (Planos de Ação e o Centro de Estudos Estratégicos de
Defesa); avaliação do poder de ação do Conselho na região e nos Estados membros,
especialmente nos casos da República Argentina e da República Federativa do
Brasil
6
; e sugestões de aprimoramentos do CDS.
Assim sendo, o artigo encontra-se estruturado por uma primeira seção voltada
à análise da UNASUL e da origem de seu Conselho de Defesa. Já as segunda,
terceira e quarta seções estão pautadas na reflexão mais aprofundada sobre o CDS,
cerceando seus fatores sistêmicos, institucionais e operacionais, respectivamente.
A última seção contempla as considerações finais, correspondentes às conclusões
sobre os fatores apresentados ao longo do artigo, bem como suas implicações
para o processo cooperativo em defesa na América do Sul.
4 O presente artigo consiste em uma adaptação de parte do quarto capítulo da dissertação de mestrado da autora.
5 A manutenção do anonimato dos entrevistados é pré-requisito para a reprodução de suas declarações. Dessa
forma, as rodadas de entrevistas realizadas foram: Entrevistado 1: Terceiro escalão do CEED-CDS; Entrevistado
2: Terceiro escalão do CEED-CDS. Entrevistado 3: Segundo escalão do CEED-CDS; Entrevistado 4: Primeiro
escalão do Ministério da Defesa da República Argentina; Entrevistado 5: Terceiro escalão do Ministério da
Defesa da República Argentina. Entrevistado 6: Segundo escalão do Ministério da Defesa da República Federativa
do Brasil.
6 Restringimo-nos a esses dois países devido à impossibilidade de realização de entrevistas com pessoal de outros
Estados membros do CDS.
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União de Nações Sul-Americanas e o advento do CDS
A União de Nações Sul-Americanas
7
é uma instituição voltada à cooperação
regional, partindo do viés político, porém abrangendo as vertentes econômica, de
infraestrutura, social e de defesa (SANAHUJA, 2013, p. 56-57), compondo uma
ferramenta estratégica de inserção internacional de seus países membros, com o
efetivo fortalecimento da região como “sujeito político” (GARCÍA, 2010, p. 30).
Faz-se importante destacar que sua criação teve como incentivo a busca por uma
organização própria sul-americana, pautada em interesses históricos, políticos e
culturais, desvinculada de interferências extrarregionais (RIBEIRO, 2014, p. 25).
Desde sua consolidação, a UNASUL vem desempenhando um papel de
mediador para a solução de conflitos regionais, como no caso Colômbia, Equador
e Venezuela, de 2008, originado pelo ataque colombiano ao acampamento das
Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia (FARC), estabelecido em território
equatoriano, próximo à fronteira; e em reivindicações de autonomia nas províncias
bolivianas, com o ataque ao gasoduto de Tarija e aos campesinos favoráveis
ao governo de Evo Morales. Nos eventos que passam a se originar, a UNASUL
articulou-se com o seu Conselho de Defesa para a resolução das instabilidades,
especialmente em 2010, no Equador, com a tentativa de golpe policial ao governo
de Rafael Correa; em 2012, com o golpe de Estado do parlamento ao presidente
do Paraguai, Fernando Lugo; e na crise política na Venezuela, com a crescente
violência perpetuada mesmo com a eleição de Nicolás Maduro como presidente
(BATALLA, 2014, p. 10-14). Apesar da capacidade intrarregional da UNASUL, sua
presença em foros internacionais ainda não constitui um “mecanismo de projeção
da região” (SANAHUJA, 2013, p. 58-60), estando em processo de consolidação.
Por meio da UNASUL, os países sul-americanos buscaram uma via alternativa
às propostas da Organização dos Estados Americanos (OEA) e do Tratado
Interamericano de Assistência Recíproca, estabelecendo um “sistema paralelo” com
capacidade de resolução de conflitos e atuante em conjunto com a OEA, quando
necessário (DREGER, 2009, p. 64). A partir de março de 2008, o ex-ministro da
Defesa brasileiro, Nelson Jobim, iniciou suas visitas aos países sul-americanos para
obtenção de apoio à criação do Conselho de Defesa Sul-Americano, sendo uma de
suas reuniões realizada na Junta Interamericana de Defesa, nos Estados Unidos,
7 A UNASUL está formada por Argentina, Brasil, Bolívia, Chile, Colômbia, Equador, Guiana, Paraguai, Peru,
Suriname, Uruguai e Venezuela.
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ressaltando que tal iniciativa não seria uma aliança militar como a Organização
do Tratado do Atlântico Norte (GALERANI, 2011, p. 57).
Em dezembro de 2008, os países constituintes da UNASUL se reuniram em
uma Cúpula Extraordinária, no Brasil, determinando a criação do Conselho de
Defesa Sul-Americano. O documento assinado designa que o CDS é um órgão
de consulta, cooperação e coordenação dos assuntos de defesa regidos pelos
princípios da Carta das Nações Unidas, da Carta da Organização dos Estados
Americanos e das decisões e mandados do Conselho de Chefes de Estado e do
Conselho de Governo da UNASUL. Enfatiza-se também o respeito à soberania, à
autodeterminação, à integridade territorial dos Estados e a não intervenção em
assuntos internos. Ademais, garante o respeito às instituições democráticas, aos
direitos humanos e não discriminação, no âmbito da defesa, com o fim de reforçar
e garantir o Estado de Direito (UNIÓN DE NACIONES SURAMERICANAS, 2008a).
Os objetivos gerais do CDS perpassam: a) consolidar a América do Sul
como zona de paz; b) construir uma identidade de defesa sul-americana,
respeitando as características sub-regionais e nacionais; c) criar consensos
para o fortalecimento da cooperação regional na vertente de defesa (UNIÓN DE
NACIONES SURAMERICANAS, 2008b). Sua estrutura, como instância executiva,
está composta por ministros e vice-ministros da Defesa dos países membros
da UNASUL, com participação dos representantes dos ministérios das Relações
Exteriores, em delegações nacionais. A presidência fica a cargo do ministro da
Defesa do país que ocupa, de forma temporária, o mesmo cargo na UNASUL
(MOREIRA, 2009, p. 13).
Nesse cenário, observa-se a relação do CDS com os processos cooperativos
em matéria de defesa na região sul-americana, de forma geral, sintetizado pelo
entrevistado 4, sendo uma opinião partilhada por todos os outros entrevistados,
“o principal veículo, o mecanismo de promoção da cooperação em defesa está
dado no marco multilateral através de UNASUL e do Conselho de Defesa Sul-
Americano”. Assim, como explicado pelo ex-ministro da Defesa brasileiro, Celso
Amorim (2013, p. 161, tradução nossa), “a coordenação entre nossos países é
importante para aumentar a eficácia das medidas de dissuasão e também para
aprofundar a confiança que já existe entre países da América do Sul. Entre nós,
a cooperação é a melhor dissuasão”
8
.
8 “la coordinación entre nuestros países es importante para aumentar la eficacia de las medidas de disuasión
y también para profundizar la confianza que ya existe entre países de la América del Sur. Entre nosotros, la
cooperación es la mejor disuasión”.
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Dado esse panorama geral, iniciaremos a análise do Conselho por meio de
três fatores delimitados (sistêmicos, institucionais e operacionais), que permitirão
caracterizar e compreender o mesmo através de seus diferentes níveis e aspectos
de maior relevância que o compõe.
Fatores Sistêmicos: reconhecimento internacional do CDS e seu
poder de influência sobre seus Estados membros
De acordo com Saint-Pierre e Palacios Junior (2014, p. 29), dois eventos
tiveram efetiva influência sobre o projeto de criação e aperfeiçoamento do CDS,
sendo esses, “o bombardeio colombiano ao Equador” e “os acordos sobre as bases
militares Colômbia-EUA
9
. Tais acontecimentos permitiram qualificar o Conselho
como um órgão capaz de solucionar os conflitos da região, sem interferências
extrarregionais, e efetuar, de forma complementar, a construção de medidas de
confiança mútua. Além disso, a proposta brasileira pautou-se na constituição de um
conselho voltado à região, especialmente por buscar promover uma “concertação
regional” ampliada no âmbito estratégico, com membros que partilham semelhanças
culturais e geográficas, promovendo a construção de consensos e a solução de
dificuldades compartilhadas (ABDUL-HAK, 2013, p. 147-148).
No entanto, o processo para a consolidação desse Conselho não esteve ausente
de discordâncias, como a realizada por Uribe, ex-presidente colombiano, em
2008, que ressaltou as diferentes concepções entre os países da região a respeito
das FARC, bem como a importância de preservação da OEA para a resolução
de crises regionais. De forma paralela, o Uruguai também se mostrou relutante,
especialmente com o papel predominante que seria dado ao Brasil no que refere
à segurança da região. Após visita realizada pelo ex-presidente brasileiro, Lula da
Silva, à Colômbia, Uribe anunciou a inclusão do país no Conselho, delimitando
o “rechaço de grupos violentos, sem importar qual sua origem” (LEÃO; MORINI,
2013, p. 220-221) Assim, de acordo com o entrevistado 1, “o CDS tem sido, antes
de tudo, um foro de consenso e de boa vontade política, formado por 12 países que
acreditam que a integração regional é, sem sombra de dúvida, fator de estabilidade
e prosperidade da América do Sul”.
9 Acordo, firmado em 2009, referente às sete bases militares no território colombiano com a presença de tropas
estadunidenses, voltadas para a luta contra o narcotráfico e o terrorismo. Contudo, em 2010, a Corte Constitucional
da Colômbia rejeitou o mesmo.
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Nesse cenário, faz-se essencial a compreensão da percepção de como os
países sul-americanos veem o Conselho. Para tanto, nos utilizaremos da visão
brasileira e argentina. Assim, segundo o entrevistado 1,
Vejo a UNASUL como uma ideia que partiu do Brasil [...] Com a chegada do
Lula no poder, de uma certa forma, teve-se a ideia de perpetuação no poder
que envolvia a predominância brasileira no âmbito sul-americano, e essa
predominância não poderia ser de maneira “imperialista” [...] Parte do que
se pensou foi justamente a criação da UNASUL nesta questão de soft power,
ou seja, você ajuda os outros a crescerem junto com você e de certa forma
você se torna líder por eleição. (TERCEIRO ESCALÃO DO CEED-CDS, 2014)
Partindo da visão brasileira, observa-se sua iniciativa para a criação
do Conselho em uma conjuntura regional formada por uma América do Sul
propícia a tal empreendimento, visto a presença de governos voltados ao campo
cooperativo, de forma a buscarem avanços conjuntos em diversos âmbitos, como
em defesa, ao mesmo tempo nota-se um âmbito hemisférico marcado por uma
baixa interferência estadunidense
10
. Os anseios do Brasil cerceavam a busca por
uma maior autonomia nacional e regional, privilegiando os países do hemisfério
sul e objetivando um papel de liderança na região, para consolidar-se como fonte
de um processo cooperativo capaz de unir os Estados sul-americanos.
No caso da Argentina, o Conselho constituir-se-ia uma plataforma de projeção
política sem a necessidade de desprendimento de grandes investimentos monetários
para os projetos, especialmente devido ao limitado orçamento para a defesa do
país (COMINI, 2010, p. 19-21). Desta forma, segundo o entrevistado 4,
Temos aprofundado a inserção da Argentina no Conselho de Defesa. O Con-
selho tem sido uma das melhores criações da UNASUL, e que nos permite
articular uma doutrina comum, para o qual se criou a Escola Sul-Americana
de Defesa [...]; uma investigação em comum, que se realiza no Centro de
Estudos Estratégicos; e no âmbito da reunião de ministros, vice-ministros e
especialistas, nos têm servido para que abordemos, de maneira particularizada,
10 Nota-se a diminuição da influência direta estadunidense marcada, segundo Guarnizo (2011, p. XIX), pelas
dificuldades perante as guerras do Afeganistão e Iraque, o unilateralismo pregado na doutrina Bush e a crise
financeira de 2008, somadas aos problemas domésticos do governo Obama. Contudo, destaca-se a existência
de políticas com parceiros como Colômbia, México e a América Central, para o combate ao narcotráfico e
fluxo de armas (DÍAZ, 2011, p. 107-139); bases militares estadunidenses na região sul-americana; bem como
recursos monetários providos à Colômbia e ao Equador no âmbito militar, e ao Peru para apoio econômico e
social (COSTA, 2009, p. 19-20).
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temáticas de meio ambiente, recursos naturais […] ciberdefesa. (PRIMEIRO
ESCALÃO DO MINISTÉRIO DA DEFESA DA REPÚBLICA ARGENTINA, 2014)
Como ressaltado pelo entrevistado 3,
Todas as esperanças são postas no Conselho de Defesa, não somente porque
tem sido o mais ativo desde a criação da UNASUL, mas porque estão os
Ministérios da Defesa, nos parece o melhor modo de avançar em uma política
de cooperação na América do Sul, e com os países centro-americanos e do
Atlântico Sul; parece-nos um instrumento que temos que avançar desde
investigação e doutrina até a complementaridade econômica na produção de
bens militares. (SEGUNDO ESCALÃO DO CEED-CDS, 2014)
A visão argentina configura uma abordagem para além da busca por uma
liderança regional, perpassando o campo do anseio pela consolidação do Conselho
de Defesa, justificando-se por crer no órgão como um instrumento capaz de
proporcionar um processo cooperativo benéfico aos países da América do Sul,
envolvendo questões de defesa nacional e regional, especialmente no referente
à doutrina e às medidas de confiança mútua, para que assim ocorresse um
aperfeiçoamento e crescimento compartilhados.
Já no que se refere à influência do CDS em suas políticas e decisões nacionais,
foi enfatizado pelo entrevistado 6 que “o poder de ação do Conselho é relativo,
a partir do momento que não possui um caráter intervencionista e respeita
estritamente a soberania de cada membro”. Mesmo assim, como resumido pelo
entrevistado 1, “na prática, o que observamos é que o Conselho vem atuando de
forma efetiva nos países, como um instrumento de resolução de controvérsias,
buscando fatores de convergência de interesses para a região”.
Com isso, nota-se que, como outras instituições regionais da América do Sul,
a UNASUL e seu Conselho se inserem em um contexto marcado pela busca de
uma baixa institucionalidade, pautada na manutenção da autonomia e soberania
nacionais. Como resultado, o órgão apresenta-se vulnerável frente aos anseios e
ações de seus Estados membros. Sendo assim, o CDS limita-se ao âmbito consultivo,
marcado por um reconhecimento regional por parte dos Estados, especialmente
por seu caráter de resolução de conflitos e problemas, apesar de ainda estar em
estágio inicial de atuação, e de promoção de consensos, porém sem um papel de
representação da região, no campo da defesa, na esfera internacional.
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Fatores Institucionais: estrutura organizacional do Conselho e
comprometimento de seus Estados membros
O CDS está composto por uma Instância Executiva que realiza duas reuniões
anuais, o que, de acordo com o entrevistado 6, “para o cenário dinâmico, como
o que temos hoje, precisamos de um instrumento mais ágil para responder aos
anseios da região no trato com os assuntos de defesa”. Com isso, originou-se uma
proposta de criação de uma comissão, sendo que “na V Reunião Ordinária de
Ministros do CDS, ocorrida no Suriname, em fevereiro de 2014, o Brasil apresentou
e foi aprovada proposta no Plano de Ação corrente, para estudar a criação desta
comissão permanente”. Esta, de acordo com o mesmo, “seria um complemento
para as instâncias já existentes, como o CEED-CDS e a Escola Sul-Americana de
Defesa (ESUDE), voltados mais para a área acadêmica e de formação em Defesa”,
especialmente devido à “falta de uma instância que proporcione o debate político
com mais frequência”. Tal aspiração por uma maior interação entre os membros
do Conselho exemplifica o interesse dos Estados em se fazerem mais ativos,
contudo, deve-se considerar que as propostas podem, em alguns momentos,
cercear o campo da retórica.
Em paralelo, Amorim relatou que
É necessário fortalecer o CDS não somente com instituições […] mas também
por meio de mecanismos que permitam um contato mais constante de
nossas Forças Armadas e entre nossos estabelecimentos de defesa, sobretudo
entre nossos oficiais do Estado-Maior. Nesse sentido, creio que é hora de
pensar em uma criação de Comissão de Assessoria Militar que funcione
permanentemente junto à Secretaria Geral da UNASUL. Tal comissão,
evidentemente subordinada aos Ministros e às autoridades civis, serviria
como foro de análise, de intercâmbio de ideias, e de formação de uma visão
conjunta. (AMORIM, 2013, p. 162, tradução nossa)
11
A proposta de uma Comissão de Assessoria Militar, como apresentado por
Amorim, desperta questões referentes às relações civis-militares. Nota-se que
11 “Es necesario fortalecer al CDS no solo con instituciones […] sino también por medio de mecanismos que
permitan un contacto más constante de nuestras Fuerzas Armadas y entre nuestros establecimientos de defensa,
sobre todo entre nuestros oficiales de Estado Mayor. En ese sentido, creo que es hora de pensar en una creación
de Comisión de Asesoría Militar que funcione permanentemente junto a la Secretaría General de UNASUR.
Dicha comisión, evidentemente subordinada a los Ministros y a las autoridades civiles, serviría como foro de
análisis, de intercambio de ideas, y de formación de una visión conjunta.”
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existem países que não possuem ministros da Defesa civis, e que, em alguns
momentos, tais são representados por seus vice-ministros, ou como no Brasil,
pelo chefe do Estado-Maior Conjunto das Forças Armadas, o qual é um militar.
Da mesma forma, no interior do Centro de Estudos Estratégicos do CDS, os
representantes enviados são, dependendo do país membro, militares ou civis.
Assim, observa-se a inexistência de uma concreta hierarquia de subordinação
entre civis e militares no interior do Conselho.
Para o entrevistado 1, “todas as deliberações são em prol de tentar chegar a
um acordo comum”, e que, como sublinhado pelo entrevistado 2, “pelo que eu
observo o CDS é uma organização de destaque no âmbito da UNASUL”. Entretanto,
existem dificuldades e contradições no processo cooperativo do Conselho, que
influenciam o comprometimento dos Estados no órgão e seu funcionamento.
Como primeiro elemento tem-se a oposição aos Estados Unidos, que, segundo
o entrevistado 1, “nem todos os países têm essa contraposição. O que não acho
que é de todo mal [...] mas destas discussões eu vejo que emperram certas
decisões e atividades que o CDS poderia avançar”. Destaca-se que os Estados
buscaram consolidar um conselho pautado em uma cooperação exclusivamente
sul-americana, contudo, deve-se considerar que os Estados Unidos são nossos
parceiros históricos, ao mesmo tempo em que a região não possui uma indústria
em defesa consolidada, capaz de suprimir acordos extrarregionais. Desta forma,
apesar de parcerias com os Estados Unidos constituírem-se como possíveis fontes
de desconfiança, a região ainda não possui a capacidade de se fecharem si mesma
no campo da defesa.
Ademais, como apresentado por Rezende (2013, p. 207), uma grande
dificuldade também abrange a questão conceitual, como será discutido na próxima
seção, especialmente no que se refere ao caráter dado às Forças Armadas e à sua
doutrina. O entrevistado 3 complementou alegando que
outra dificuldade no campo do Conselho é que existem algumas atividades
em que os países são requeridos a brindar informações sobre seu sistema
de defesa, seu orçamento, suas composições, número etc., e existem alguns
países que tendem a demorar mais nesse traslado de informações, e
provavelmente em alguns países isso se deve aos menores níveis de
compromisso, mas também muitas vezes se deve ao fato que dentro do
Ministério da Defesa de cada país não existe o mesmo nível de desenvolvimento
institucional em matéria de cooperação internacional. (SEGUNDO ESCALÃO
DO CEED-CDS, 2014)
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Em resumo,
Creio que em todas as organizações e instituições sempre é muito normal
e comum que haja resistências às mudanças, de alguma maneira tudo o
que estamos falando constitui mudanças nos nossos países e em nossas
instituições associadas à defesa, provavelmente essa resistência às mudanças
seja o que determina o maior ou menor compromisso que assumem alguns
países em matéria de cooperação através do Conselho de Defesa. Contudo,
creio que o balanço final entre muito e pouco compromisso é que todos
os países participam do Conselho, assistem as reuniões e contribuem com
o orçamento. E creio que o balanço é positivo entre os problemas e os
obstáculos/dificuldades […] [já que] ao fazer algo novo e entre tanto países
– doze – não sempre tudo vai ser fácil.
Não obstante, verificamos uma desaceleração do processo cooperativo dentro
do CDS, devido a algumas mudanças no cenário sul-americano, especialmente
com trocas presidenciais, já que a figura personalista foi um elemento essencial
para a concretização do projeto do Conselho. Nota-se uma mudança política
do Brasil governado pelo presidente Lula da Silva, associado ao ministro da
Defesa Nelson Jobim, em comparação com as políticas da presidente Dilma
Rousseff, com o ministro da Defesa Celso Amorim, concomitantemente, soma-se
a atual instabilidade política no país, com manifestações sociais e o processo de
impeachment da ex-presidente. O entrevistado 2 confirmou tal situação, declarando
que o Conselho “perdeu um pouco essa liderança brasileira”, sendo complementado
pelo entrevistado 1, que disse que “hoje em dia a coisa está meio solta, mas como
já tem toda uma regulamentação que foi feita naquela época a coisa continua, mas
sem tanta ênfase”. Contudo, deve-se considerar que o Brasil não exerceu um papel
de líder desde o inicio das atividades do Conselho, inserindo-se como um ator
secundário, voltado à criação de diversos processos cooperativos, tanto bilaterais
como multilaterais, capazes de abranger o hemisfério sul, sem priorizar uma
iniciativa. Paralelamente, teve-se um agravamento a esse cenário, marcado pela
progressiva crise na Venezuela, com o falecimento de Hugo Chávez, bem como a
eleição de Mauricio Macri na Argentina, rompendo com as políticas kirchneristas
e seu expressivo entusiasmo pela cooperação no âmbito do CDS.
Com isso, verifica-se um Conselho pautado em anseios para seu fortalecimento,
especialmente com a criação de estruturas permanentes, como o CEED-CDS e a
ESUDE. Paradoxalmente, tem-se o comprometimento dos Estados membros, o
fortalecimento da confiança e transparência, e a convergência de políticas nacionais
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de defesa que constituem ainda grandes dificuldades, as quais impactam nas
atividades do CDS, como será analisado na próxima seção.
Fatores Operacionais: Planos de Ação e o CEED-CDS
Em 2009, na primeira reunião do Conselho, em Santiago do Chile, aprovou-se
o Plano de Ação 2009-2010, objetivando a implementação dos desígnios formadores
do Conselho em quatro eixos: 1) Política de Defesa; 2) Cooperação Militar, Ações
Humanitárias e Operações de Paz; 3) Indústrias e Tecnologia de Defesa; 4) Formação
e Capacitação. Ademais, foi acordado o reconhecimento dos Planos de Ação como
marcos institucionais da UNASUL, sendo eficientes ferramentas de planificação e
mecanismos de transcendência histórica, que permitem a unidade de critérios e
perspectiva estratégica no Conselho. (UNIÓN DE NACIONES SURAMERICANAS,
2012). Como delimitado pelo entrevistado 3 “os Planos de Ação constituem
verdadeiros exemplos concretos de cooperação”.
Podemos ressaltar alguns pontos tangíveis de análise sobre os Planos de
Ação (de 2009-2014) desenvolvidos pelo Conselho. No que se refere à presença
de assimetrias de responsabilidades assumidas nos eixos de cooperação do
CDS, especialmente no terceiro (Indústrias e Tecnologia de Defesa), no qual os
países mais ativos são Argentina, Brasil e Venezuela, em que o segundo país tem
assumido quase um terço das atividades promovidas (SANAHUJA; ESCÁNEZ,
2014, p. 515-516). Nesse campo, para Rodrigo Baena, é essencial o incentivo ao
fomento da indústria de defesa não apenas do Brasil, mas também dos países
constituintes da UNASUL (REZENDE, 2013, p. 197-198). Como ressaltado pelo
ex-ministro Amorim,
O fortalecimento da indústria brasileira de material de defesa é um dos eixos
de nossa estratégia nacional e condiz com a diretriz, nela inscrita, de estímulo
à integração da América do Sul: “essa integração não somente contribuirá
para a defesa do Brasil, como possibilitará fomentar a cooperação militar
regional e a integração das bases industriais de defesa. Afastará a sombra de
conflitos dentro da região. Com todos os países, avança-se rumo à construção
da unidade sul-americana”. (AMORIM, 2012, p. 12)
Um importante exemplo é o desenho e o processo de construção de um
avião de treinamento básico – UNASUL I. Tal projeto já apresenta alguns avanços,
como observado na 1ª Reunião Presencial do Comitê Consultivo e Comitê Técnico
136
Rev. Carta Inter., Belo Horizonte, v. 11, n. 3, 2016, p. 124-148
As razões de existência do Conselho de Defesa Sul-Americano da UNASUL
Assessor 2014 do Programa UNASUL I, destinada à seleção do motor, da certificação
da aeronave e dos custos para seu desenvolvimento (UNIÓN DE NACIONES
SURAMERICANAS, 2014d). Como exposto pelo entrevistado 2, o projeto UNASUR
I, “que [...]está sendo estudado na Argentina e é aberto a todos os países que
queiram participar, [...] [sendo que] mesmo os que não participam já fizeram
encomendas desse avião, então [busca-se] priorizar a indústria sul-americana,
que é importante”.
Durante a IV Reunião Ordinária do CDS, em novembro de 2012, onde ocorreu
a elaboração do Plano de Ação 2013, também se aprovou um projeto para a
produção conjunta de um sistema de aviões não tripulados (VANT) na América
do Sul (UNIÓN DE NACIONES SURAMERICANAS, 2012), liderado por Brasil e
Equador. Em 2014, efetuou-se a terceira reunião do grupo de trabalho, em que o
general de divisão Mattioli ressaltou que “seguramente, o novo VANT não será
o melhor do mundo, mas será aquele que poderemos construir, como resultado
da interação entre os países e de seus distintos meios” (UNIÓN DE NACIONES
SURAMERICANAS, 2014c, tradução nossa)
12
. Contudo, deve-se ressaltar que tais
iniciativas ainda estão em estágio inicial, especialmente devido à conjuntura de
crise econômica tanto na Argentina como no Brasil.
Em relação ao quarto eixo dos Planos de Ação (Formação e Capacitação),
reconhecem-se expressivas iniciativas dos Estados membros, como o Curso
Avançado de Defesa Sul-Americano, desenvolvido pelo Brasil; o Curso de
Capacitação Técnica Polar, articulado pela Argentina; o Curso Sul-Americano de
Formação de Civis em Defesa, já em sua terceira edição; o Curso Avançado de
Defesa Sul-Americana para altos funcionários dos Ministérios de Defesa, também
em seu terceiro ano; o primeiro Curso Sul-Americano de Defesa e Pensamento
Estratégico, sob responsabilidade do Equador; e o primeiro Curso Sul-Americano
de Direito Internacional e Direitos Humanos das Forças Armadas, coordenado pelo
Peru (UNIÓN DE NACIONES SURAMERICANAS, 2014c). Assim, para Amorim
(2013, p. 160, tradução nossa) “todos esses cursos e seminários promovem a
compreensão mútua, facilitam o diálogo e fomentam a formação de uma visão
comum”
13
.
Já no referente à estrutura e organização dos Planos de Ação, nota-se que os
12 “seguramente, el nuevo VANT no será el mejor del mundo, pero será aquel que podremos construir, como
resultado de la interacción entre los países y de sus distintos medios”.
13 “todos esos cursos y seminarios promueven la comprensión mutua, facilitan el diálogo y fomentan la formación
de una visión común”.
Rev. Carta Inter., Belo Horizonte, v. 11, n. 3, 2016, p. 124-148
137
Tamires Aparecida Ferreira Souza
mesmos tiveram grande evolução, sendo o Plano de Ação 2013 um bom exemplo,
visto que, diferente dos anteriores, está marcado por uma divisão entre: país
responsável pela ação, corresponsáveis, e lugar e período de realização. De acordo
com o entrevistado 6,
O Plano de Ação 2013 contou com 27 iniciativas distribuídas dentro dos
quatro (4) eixos mencionados. Foi obtido um bom índice de conclusão
alcançando, praticamente, 93%, tendo somente ocorrido a postergação [de]
duas (2) atividades para o ano de 2014. O Plano deste ano [2014] contempla
25 iniciativas, que estão em pleno desenvolvimento pelos países e com a
expectativa de alcançar a totalidade no seu cumprimento. (SEGUNDO
ESCALÃO DO MINISTÉRIO DA DEFESA DA REPÚBLICA FEDERATIVA DO
BRASIL, 2014)
Além disso, destacamos a presença de um maior pragmatismo nos Planos de
Ação, em especial os de 2012-2014, marcados ainda por uma maior objetividade.
Isto pois, os planos anteriores estavam formulados por grandes metas e desafios,
o que resultou em ações incompletas para o tempo determinado do plano, a
exemplo, o de 2010-2011, que contou com 21 atividades, porém com apenas
quatro finalizadas no prazo estabelecido, estando 17 em execução. De forma
complementar, o entrevistado 3 relatou que
talvez o [que] seja conveniente melhorar é que no Plano de Ação anual se
levam a cabo muitas atividades e não necessariamente todas vão com um
sentido de direção estratégica, e sim, às vezes, há uma tendência à dispersão.
Isso penso que pode ser melhorado na medida em que os países possam se
colocar de acordo em trabalhar com maior precisão, quais são as direções
estratégicas, [e] as temáticas que queremos consolidar. (SEGUNDO ESCALÃO
DO CEED-CDS, 2014)
Em paralelo, ainda como parte dos Planos de Ação, analisa-se a constituição
do primeiro conjunto de medidas de confiança, único na América do Sul, estando
composto por: intercâmbios de informação – conformação e organização dos
sistemas nacionais de defesa; gastos implicados; atividades militares intra e
extrarregionais a serem realizadas por cada umas das Forças Armadas; mecanismos
de verificação dos compromissos assumidos anteriormente (situação nas zonas de
fronteira, visitas a instalações militares e cooperação militar); além do conjunto
de garantias relativas às políticas e aos cursos de ação, no que tange a proscrição
do uso da força, conservação da região como zona livre de armas nucleares e
138
Rev. Carta Inter., Belo Horizonte, v. 11, n. 3, 2016, p. 124-148
As razões de existência do Conselho de Defesa Sul-Americano da UNASUL
não realização de acordos cooperativos que interfiram na “soberania, segurança,
estabilidade ou integridade territorial” dos Estados membros (GARRÉ, 2010,
p. 13-14).
Destaca-se assim, segundo o entrevistado 5, “outra forma de cooperação em
nível regional constitui os exercícios militares, que podem ser tanto entre dois países
como mais”. Em 2011, foi desenvolvido pelo CDS o primeiro exercício combinado
regional, UNASUL I, voltado à construção de modelos de “interoperabilidade militar
combinada em matéria de planejamento e condução” (tradução nossa)
14
, em que
participaram em seu “desenho, planejamento e implementação” praticamente
todos os países membros, com exceção de Guiana e Suriname (TORRE, 2012,
p. 296-297). Em 2013, foi realizado, sob coordenação da Argentina, o terceiro
exercício combinado – UNASUL III, sob a carta de Operações de Manutenção da
Paz e Ajuda Humanitária, que, segundo o entrevistado 5, “incluiu nos exercícios,
entre outros elementos, as mulheres e a proteção de civis em operações de paz”.
Em 2009, desenvolveu-se o primeiro Caderno de Defesa, fruto do Plano de
Ação de 2009-2010. Para o ex-ministro da Defesa do Equador, Javier Cevallos, os
países da América do Sul devem empreender políticas capazes de fortalecer a
institucionalidade da defesa, por meio de cooperação, promovendo uma “agenda
regional de gestão de defesa que permita afiançar a governabili dade e consolidação
da democracia e da paz na região” (UNIÓN DE NACIONES SURAMERICANAS, 2009,
p. 5, tradução nossa)
15
. O segundo Caderno de Defesa foi desenvolvido em 2010,
e de acordo com Cevallos, esse caderno compila o processo de adoção das Medidas
de Fomento a Confiança e Segurança, bem como a visão política e acadêmica sobre
sua instauração e institucionalização na UNASUL. O emprego de tais medidas,
pautadas em um procedimento com intercâmbio de informações, comunicação
sobre atividades militares e verificação da situação das fronteiras, pode ser
considerado um grande avanço (CDS-UNIÓN DE NACIONES SURAMERICANAS,
2010, p. 7-8).
No Plano de Ação 2009-2010, foi aprovada a criação de um Centro de Estudos
Estratégicos de Defesa do Conselho, com sede fixa em Buenos Aires (Argentina)
(UNIÓN DE NACIONES SURAMERICANAS, 2009). O centro busca trabalhar de forma
compartilhada com os Centros de Estudos Estratégicos Nacionais (SAINT-PIERRE;
PALACIOS JUNIOR, 2014, p. 30-31), funcionando como, segundo o entrevistado 1,
14 “Interoperabilidad militar combinada en materia de planeamiento y conducción”.
15 “una agenda regional de gestión de Defensa que permita afianzar la gobernabili dad y consolidación de la
democracia y la paz en la Región”.
Rev. Carta Inter., Belo Horizonte, v. 11, n. 3, 2016, p. 124-148
139
Tamires Aparecida Ferreira Souza
uma “instância de produção de estudos estratégicos para o assessoramento do
CDS. Sua missão é gerar conhecimento e difusão do pensamento estratégico
sul-americano em matéria de defesa e segurança regional e internacional, sempre
por iniciativa e requerimento do Conselho”.
No que tange a presença e o trabalho dos Estados membros no Centro,
nota-se, como declarado pelo entrevistado 1,
No Centro [...] nem todos os países participam, existem alguns como o
Brasil que tem dois delegados em tempo integral, alguns só um, alguns se
utilizando do Adido Militar, que dobra a função, [...] outros, como Uruguai,
devido à proximidade, ele fica indo e vindo [...], e ainda tem outros que
não participam do Centro. Então o Centro tem que buscar as informações
necessárias diretamente com o Ministério da Defesa [MD] do país, o que
é complicado, já que [os delegados] funcionam como um elo com o MD.
(TERCEIRO ESCALÃO DO CEED-CDS, 2014)
Contudo, verifica-se que, ainda segundo o entrevistado 1, existem quatros
trabalhos em curso no centro, voltados para “fomentar as medidas de confiança”
entre os países sul-americanos. A primeira e a segunda atividades voltam-se ao
registro de gastos em defesa e ao Formulário Sul-Americano de Inventários Militares
(FOSIM). Como terceiro ponto, tem-se a Institucionalidade em Defesa, referente
ao processo comparativo de normas, regulamento e documentos dos países
membros, com o intuito de encontrar pontos em comum no âmbito da defesa.
O quarto trabalho enfoca o campo das questões de gênero, como destacado pelo
entrevistado 5, existe um projeto concluído em relação à “temática da mulher e as
Forças Armadas”, abrangendo “a presença da mulher em todas as Forças Armadas,
nos países, de diferentes níveis, das diferentes políticas de gênero dos países
para aceitar as mulheres na carreira militar”; atualmente, tem-se desenvolvido
um segundo informe com enfoque na UNASUL, sendo que “a ideia é que estes
projetos e estudos sirvam para que os países pouco a pouco homologuem políticas
em matéria de gênero e da mulher nas Forças Armadas”. Nesse cenário, segundo
o entrevistado 1, vale destacar que “em tão pouco [tempo] conseguimos uma
unanimidade entre doze países das América do Sul em prol do andamento destes
trabalhos, isso é um avanço enorme”.
Como primeiro trabalho apresentado, adotou-se um conjunto de medidas
de transparência de informações sobre gastos e indicadores econômicos de
defesa (CENTRO DE ESTUDOS ESTRATÉGICOS EM DEFESA, 2012a), motivado
pela construção de uma metodologia que permitiria um aprimoramento na
140
Rev. Carta Inter., Belo Horizonte, v. 11, n. 3, 2016, p. 124-148
As razões de existência do Conselho de Defesa Sul-Americano da UNASUL
“transparência” e na “responsabilidade fiscal, não apenas entre os Estados e
Governos da região, mas também entre estes e suas sociedades” (SAINT-PIERRE;
PALACIOS JUNIOR, 2014, p. 24-25). Assim, em 2012, instituiu-se o primeiro Registro
Sul-Americano de Gastos de Defesa como um instrumento comum de medição
dos gastos de defesa realizados pelos países membros da UNASUL (CENTRO DE
ESTUDOS ESTRATÉGICOS EM DEFESA, 2012a), pautado em informações remetidas
pelos membros correspondentes ao período de 2006-2010.
Outro expressivo progresso referente às atividades do centro foi exposto pelo
entrevistado 3, em que
Um dos primeiros debates que se criou dentro do Conselho de Defesa foi que
existem países que queriam tratar a temática de segurança dentro do Conselho,
e países como Argentina, que disseram que eu não posso me intrometer nisso
porque no meu país, por lei, as Forças Armadas não interferem em temas de
segurança. Então, foi pedido que o Centro de Estudos Estratégicos elaborasse
um estudo para resolver esse problema. Então o que sim concluímos é que
em efeito o Conselho poderia tratar toda a temática sobre defesa nacional,
e vimos que UNASUL, como estrutura, não tinha um âmbito onde discutir
e buscar cooperação em matéria de segurança, e [a] [...] recomendação
foi a criação de um novo conselho que seja de segurança e da temática de
criminalidade e delitos. (SEGUNDO ESCALÃO DO CEED-CDS, 2014)
Desse modo, diante da situação de ausência de um conselho capaz de
voltar-se a questões referentes à segurança nacional, crime organizado e delitos
transnacionais, criou-se o Conselho Sul-Americano em Matéria de Segurança
Cidadã, Justiça e Coordenação de Ações contra a Delinquência Organizada
Transacional. De forma auxiliar aos trabalhos de tal Conselho, o CEED-CDS realizou
o avanço em alguns conceitos, como a compreensão da definição de segurança
pública
16
(CENTRO DE ESTUDOS ESTRATÉGICOS EM DEFESA, 2012b).
Ademais, segundo o entrevistado 3, o centro tem trabalhado no projeto
América do Sul 2020-2025, voltado à prospecção de demandas internacionais
dos recursos naturais da região, bem como “quais são os riscos e ameaças que
convergem na exploração destes recursos”. No Comunicado dos Vice-Ministros e
Chefes de Delegação dos Ministérios da Defesa de 2014, houve o reconhecimento
dos recursos naturais como “ativos estratégicos de interesse comum”, bem como
da necessidade de garantir sua soberania e proteção, sendo efetivada por meio
da cooperação, utilizando-se de marcos jurídicos, doutrinas e conceitos comuns,
16 Vide documento CEED, 2012b.
Rev. Carta Inter., Belo Horizonte, v. 11, n. 3, 2016, p. 124-148
141
Tamires Aparecida Ferreira Souza
bem como a formação e educação dessa temática por meio do CEED-CDS e da
ESUDE (UNIÓN DE NACIONES SURAMERICANAS, 2014b). Além disso, destaca-se
a elaboração de um Atlas de Mapas de Riscos de Desastres Naturais na América
do Sul e um Sistema de Informação para a Gestão do Risco de Desastres (UNIÓN
DE NACIONES SURAMERICANAS, 2014a), concomitante a um Protocolo de
Cooperação entre Ministérios da Defesa da Região, voltado a ações conjuntas
frente desastres naturais (BRASIL, 2014).
Outro ponto de grande relevância, e já introduzido anteriormente, é o referente
aos conceitos, que despertam divergências expressivas entre os países. Contudo,
com a realização do I Foro Sul-Americano de Políticas e Estratégias de Defesa da
Região e do IV Seminário Sul-Americano de Enfoques Conceituais, Riscos e Ameaças
à Região, foi possível definir alguns conceitos gerais sobre defesa regional, como
um conjunto de “medidas, ações, métodos ou sistemas, que os Estados Nacionais
[...] assumem e coordenam em uma lógica cooperativa para alcançar e manter
as condições de segurança para a região” (tradução nossa)
17
; ameaça regional,
considerada como “possíveis feitos de tal natureza que afetem negativamente os
interesses e a segurança regional” (tradução nossa)
18
; risco regional, estabelecido
como “todos os fatores prováveis com capacidade e potencialidade manifesta de
afetar a segurança regional” (tradução nossa)
19
; e segurança regional, como a
condição que permite aos países sul-americanos alcançar os interesses regionais,
livres de pressões e ameaças de qualquer natureza” (tradução nossa)
20
(UNIÓN
DE NACIONES SURAMERICANAS, 2013a).
No que se refere às atividades desenvolvidas pelo centro atualmente, nota-
se a presença de divergências capazes de interromper trabalhos já iniciados,
remetendo-se ao campo do comprometimento dos Estados, em que a cooperação
perdeu seu papel de destaque frente à soberania e autonomia dos países, como
alertado pelo entrevistado 2,
julgo que vai ser necessário que o Centro se mobilize, ou mesmo os países
se mobilizem, de forma a voltar a aquela questão inicial sobre o fomento
da confiança mútua, porque hoje já existem algumas rusgas pequenas entre
17 “Medidas, acciones, métodos o sistemas, que los Estados Naciones [...] asumen y coordinan en una lógica
cooperativa para alcanzar y mantener las condiciones de seguridad para la región”.
18 “Posibles hechos de tal naturaleza que afecten negativamente los intereses y la seguridad regional”.
19 “Todos los factores probables con capacidad y potencialidad manifiesta de afectar la seguridad regional”.
20 “Condición que permite a los países suramericanos alcanzar los intereses regionales, libres de presiones y
amenazas de cualquier naturaleza”.
142
Rev. Carta Inter., Belo Horizonte, v. 11, n. 3, 2016, p. 124-148
As razões de existência do Conselho de Defesa Sul-Americano da UNASUL
alguns países que fazem com que essa unanimidade esteja sendo arranhada,
de forma que trabalhos já consensuados anteriormente, como o registro de
gastos que teve que ser cortado algumas coisas do trabalho que já tinha sido
feito. (TERCEIRO ESCALÃO DO CEED-CDS, 2014)
Um relevante avanço, referente à construção de instâncias permanentes no
interior do CDS, é a Escola Sul-Americana de Defesa (ESUDE), que está situada
na cidade de Quito (Equador). Segundo o entrevistado 5,
Consideramos a ESUDE importante porque […] para lograr o que é a integração
e a cooperação de uma maneira mais fluída no que é o CDS; é necessário
contribuir para a criação de uma entidade em matéria de defesa. O que seria
muito difícil devido às assimetrias e dissimilitudes dos países da UNASUL
[...] A constituição identitária estratégica regional é muito importante para
a geração da doutrina, por isso a proposta é muito importante. (TERCEIRO
ESCALÃO DO MINISTÉRIO DA DEFESA DA REPÚBLICA ARGENTINA, 2014)
O entrevistado ainda ressaltou que “não se pretende que se crie uma doutrina
que anule os pensamentos dos Estados quanto a matérias de defesa, e sim tratar
de encontrar aqueles pontos em comum que ajudem a reforçar essa identidade,
uma aproximação”. Como apresentado na IV Reunião de Trabalho para Consolidar
a Proposta de Criação da Escola Sul-Americana de Defesa, em 2013, a escola
se volta à formação e capacitação, contribuindo para o avanço gradual de uma
visão compartilhada em defesa e segurança regional, tendo como, dentre outros
objetivos, promover o fortalecimento e a compreensão da UNASUL e do CDS; o
intercâmbio entre especialistas; a reflexão de temas estratégicos para uma visão
sul-americana; e a difusão de debate entre a Escola, o CEED-CDS e os Centros
de Defesa Nacional (UNIÓN DE NACIONES SURAMERICANAS, 2013b). Como
relatado pelo mesmo entrevistado, “esses são todos os objetivos ideais, também
como dizemos temos em conta que estamos em uma etapa embrionária, primária,
da escola, onde ainda nunca se foi colocada em funcionamento”. Assim, segundo
o entrevistado 5,
Parece-me que é um projeto muito bom, excelente, onde se trabalha de uma
maneira cooperativa com os países, com um grande impulso dos três países
responsáveis Argentina, Brasil e Equador. Contudo […] um dos obstáculos
que se manifestou tem que ver com o tema orçamentário. Como sabe
criamos uma institucionalidade muito grande, e pode ser que não tenhamos
os recursos para que possa funcionar de uma maneira adequada. (TERCEIRO
ESCALÃO DO MINISTÉRIO DA DEFESA DA REPÚBLICA ARGENTINA, 2014)
Rev. Carta Inter., Belo Horizonte, v. 11, n. 3, 2016, p. 124-148
143
Tamires Aparecida Ferreira Souza
Nota-se, portanto, a existência de expressivos avanços no âmbito do Conselho
de Defesa Sul-Americano, que perpassam as metas dos Planos de Ação e duas
instâncias permanentes com graus relativos de desenvolvimento, especialmente
o CEED-CDS, constituído de projetos fomentados pelos Estados membros e com
grandes ambições para o fortalecimento da confiança e transparência sul-americana.
Ademais, verificam-se iniciativas embrionárias, como em relação à indústria e
tecnologia de defesa, bem como consensos conceituais mais aprofundados que
afetem as políticas e normas nacionais dos Estados membros. Por conseguinte, são
consideráveis as conquistas obtidas pelo CDS, porém, devemos destacar também
suas dificuldades e a necessidade da superação de desconfianças entre os Estados
e de impasses nacionais e regionais, para que assim haja avanços mais expressivos
capazes de fortalecer os países membros e a região no campo da defesa.
Conclusões
Dessa forma, à guisa de conclusão, para o entrevistado 1,
A cooperação regional é fator relevante para o fortalecimento da presença
sul-americana no mundo [...] A América do Sul só será um polo de poder
se toda a região atingir o desenvolvimento econômico e social almejado
por seus povos […] Em síntese, pode-se afirmar que o CDS, ao harmonizar
percepções e promover ações que fortalecem a confiança mútua, tem sido
um ator destacado no processo de cooperação entre os países da América do
Sul. (TERCEIRO ESCALÃO DO CEED-CDS, 2014)
Assim sendo, por meio de três fatores, pudemos analisar o CDS,
compreendendo que, no seu âmbito sistêmico, o mesmo ainda não possui um
reconhecimento internacional, estando centrado apenas no campo regional,
refletindo a organização em que está inserido, a UNASUL, que ainda não constitui
uma instituição de presença internacional e de inserção, nessa esfera, de seus
países membros. Ainda nesse contexto, faz-se importante destacar a ausência
de uma voz sul-americana única em defesa, que possa ser levada ao âmbito
internacional e a outras instituições.
No que se refere ao fator institucional, a estrutura organizacional do
Conselho ainda está em formação, como a da UNASUL, exigindo ainda mudanças e
aprimoramentos, como sugeridos por nossos entrevistados, visto a necessidade de
144
Rev. Carta Inter., Belo Horizonte, v. 11, n. 3, 2016, p. 124-148
As razões de existência do Conselho de Defesa Sul-Americano da UNASUL
comissões permanentes que permitam a continuidade do diálogo e das iniciativas.
Já no relativo ao comprometimento dos membros, nota-se que, mesmo se fazendo
presentes, dificuldades ainda persistem, abrangendo o campo do consenso e da
transparência.
O Estado argentino caracterizava-se por seu relativo comprometimento
e otimismo para a concretização das medidas do CDS. Mesmo estando inserido
em uma crise nacional, seu envolvimento era expressivo nos planos de ação e
na construção do CEED-CDS, sendo seu viés mais atuante o âmbito das políticas
de defesa e formação e capacitação. Contudo, a conjuntura atual configura uma
menor participação, especialmente com a eleição de Mauricio Macri e sua maior
ligação com potências extrarregionais. Já o Brasil, em contrapartida, compõe-se
como o país que iniciou as dinâmicas para a criação do Conselho, considerado
como um possível líder nesse processo, todavia, não se consolidou como um
Estado atuante, perdendo ainda mais seu fôlego ao longo do tempo, o que refletiu
em um comprometimento sem assumir uma liderança ou uma completa dedicação
ao Conselho, especialmente com o cenário de instabilidade política e econômica,
marcado por um processo de impeachment da ex-presidente Rousseff e de
manifestações populares. Nota-se assim uma situação compartilhada entre os países
sul-americanos e suas instituições, em que as questões nacionais se sobressaem
em relações aos processos cooperativos, inseridos em um segundo plano.
O viés operacional reflete os Planos de Ação e a criação do CEED-CDS, como
instância permanente. Por meio dos mesmos, foram conquistados avanços, como
a construção de medidas de confiança e transparência, o registro de gastos em
defesa, o FOSIM, os treinamentos conjuntos, a ESUDE e a construção de consensos
relativos a alguns conceitos, como de recursos estratégicos e de defesa, ameaça,
risco e segurança regionais, além de planejamentos referentes à indústria e
tecnologia de defesa, com o avião de treinamento básico UNASUL I e um sistema
de aviões não tripulados.
Dessa forma, o CDS está cerceado por iniciativas, anseios e inconstantes
percepções dos Estados da região, configurando possíveis instabilidades,
especialmente relativas às medidas para uma maior transparência entre os
membros. As questões de defesa ainda permanecem como difíceis elementos de
cooperação, pois exigem uma expressiva confiança e comprometimento entre os
países, já que são referentes à manutenção da defesa e segurança dos Estados,
de suas populações e da região como um todo.
Rev. Carta Inter., Belo Horizonte, v. 11, n. 3, 2016, p. 124-148
145
Tamires Aparecida Ferreira Souza
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