Rev. Carta Inter., Belo Horizonte, v. 11, n. 1, 2016, p. 118-143
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Danny Zahreddine, Guilherme Di Lorenzo Pires
Na busca por aliados no âmbito doméstico, Sadat se aproximou da Irmandade
Muçulmana, mobilizando a lembrança de afinidades passadas para estabelecer
tal aliança. Mas, ao mesmo tempo, Sadat adotava uma postura mais favorável aos
Estados Unidos e às monarquias do Golfo, apontando para a nova posição do Egito
na geopolítica do Oriente Médio (ZOLLNER, 2009). Esses dois elementos não se
harmonizariam facilmente, o que constituiu um desafio para o governo de Sadat.
Ao passo que Nasser estabelecia sua legitimidade a partir do discurso de
independência nacional, redistribuição de riqueza e defesa do nacionalismo árabe,
Sadat utilizou a retórica do “direito” como fundamento de seu regime. Sadat se
amparou no discurso de abertura das instituições estatais e no Estado de direito.
E, realmente, Sadat consentiu abertura limitada aos oponentes do governo, mas,
ao mesmo tempo, não permitia que eles tivessem acesso pleno ao poder. Nesse
processo, o governo permitiu a criação de partidos alternativos para concorrer
às eleições parlamentares de 1976. Todavia, o poder executivo do presidente
suplantava as prerrogativas do Legislativo, além do governo acompanhar de
perto a criação dos novos partidos. Por exemplo, não era permitida a criação de
partidos baseados em afiliações religiosas, o que excluía a participação direta da
Irmandade no poder (AYUBI, 1989).
Nesse ambiente, ainda que o poder fosse exercido de fato pelo partido do
governo, grupos da oposição acolheram tal reforma com entusiasmo. Com isso,
a Irmandade voltou a ser um ator importante no espaço público: se, por um
lado, ela não poderia constituir um partido político, por outro, foi permitida à
Irmandade empregar outros meios para expor suas ideias no espaço público e
atuar abertamente na sociedade. Com a libertação de integrantes da Irmandade e
a gradual abertura política, a Irmandade reconstruiu a organização e consolidou
a sua presença no espaço público, rejeitando a ideologia mais radical da vertente
de Qutb e aproximando-se dos preceitos defendidos por al-Hudaybi, que previa
uma relação pragmática com as lideranças políticas (SULLIVAN, ABED-KOTOB,
1999). Desde então, um dos principais objetivos da irmandade é ser reconhecida
como um movimento legal (AL-AWADI, 2004).
No âmbito internacional, o principal evento envolvendo o Egito foram os
conflitos com Israel. Ao final da guerra em 1967, a ONU aprovou a Resolução 242
a fim de resolver o impasse entre Israel e os países árabes. Entretanto, Israel não
cumpriu as diretrizes da Resolução, que previa a devolução dos territórios ocupados
com a guerra, incluindo a Península do Sinai (ZAHREDDINE; LASMAR; TEIXEIRA,
2011). Nos anos após a guerra dos Seis Dias, houve o aumento das hostilidades