Daniel Sebastián Granda Henao
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OSSIÊD
Relações Internacionais:
da América Latina para o mundo
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Copyright:
ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE
RELAÇÕES INTERNACIONAIS
ISSN 2526-9038
“Outro mundo é possível”:
uma interpretação sobre o
internacionalismo do neozapatismo
Another world is possible”: na interpretation
on neozapatismo’s internationalism
“Otro mundo es posible”: una interpretación sobre
el internacionalismo del neozapatismo
DOI: 10.21530/ci.v18n3.2023.1378
Daniel Sebastián Granda Henao1, 2
Resumo
Seria possível pensar sobre o campo disciplinar pela ótica das cosmopolíticas
insurgentes dos povos indígenas contra o Estado, o Capitalismo e o Patriarcado?
Neste trabalho considera-se o pensamento e práxis do movimento neo-zapatista e
procura-se uma possível chave de interpretação dessa meta-teoria como um discurso
sobre as relações internacionais de outra perspectiva. O trabalho faz então uma
revisão bibliográfica e reflexão teórica sobre os elementos da cosmopolítica em que
se baseia a Autonomia Zapatista e aponta as dimensões em que essa meta-teoria, a
partir da voz coletiva e do senti-pensamento situado dos povos, faz as suas leituras
da política global.
Palavras-chave: Zapatismo; América Latina; Cosmopolíticas; Povos Indígenas;
Decolonialidade.
1 Doutor em Relações Internacionais Pontiícia Universidade Católica do Rio de Janeiro – PUC-Rio. Professor
Visitante no Mestrado em Fronteiras e Direitos Humanos, UFGD. (dsghenao@gmail.com). ORCID: https://
orcid.org/0000-0001-8708-3707.
2 Dedico este texto as comunidades zapatistas em resistência, cuja sabedoria, luta e trabalho coletivo tem
guiado minha ação política e acadêmica para além da pesquisa. Agradeço ao CIESAS Sureste pela estância
de pesquisa como Estudante Hóspede em 2018 e à CAPES pela bolsa de doutorado, as quais possibilitaram a
pesquisa resultante neste trabalho.
Artigo submetido em 08/07/2023 e aprovado em 19/03/2024.
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Abstract
Is it possible to think about the disciplinary ield from the perspective of the
insurgent cosmopolitics of indigenous peoples against the State, Capitalism and
Patriarchy? This work considers the thought and praxis of the neo-zapatista
movement and seeks a possible interpretation of this meta-theory as a discourse
on international relations from a dierent standpoint. The work thus makes a
bibliographic review and theoretical reflection on the elements of cosmopolitics
on which Zapatista Autonomy is grounded and points out the dimensions in which
this meta-theory, from their collective voice and the situated feeling-thought of the
peoples, makes claims on global politics.
Key words: Zapatismo; Latin America; Cosmopolitics; Indigenous Peoples;
Decoloniality.
Resumen
¿Sería posible pensar el campo disciplinar desde la perspectiva de la cosmopolítica
insurgente de los pueblos indígenas frente al Estado, el Capitalismo y el Patriarcado?
Este trabajo considera el pensamiento y la praxis del movimiento neozapatista y
busca una posible clave para interpretar esta metateoría como un discurso sobre las
relaciones internacionales de otro modo. El trabajo hace una revisión bibliográfica
y relexión teórica sobre los elementos de la cosmopolítica que sustentan la
Autonomía Zapatista y señala las dimensiones en las que desde la voz colectiva y el
sentir-pensamiento situado de los pueblos, hace sus lecturas de la política global.
Palabras clave:
Zapatismo; América Latina; Cosmopolíticas; Pueblos Indígenas;
Decolonialidad.
Introdução
Muitos conhecem o movimento zapatista por seus bordões, tais como
outro mundo é possível”, ou pela capacidade performática de mobilização
midiática e de bases sociais ao redor do mundo desde seu início; ou, também,
pela forma de colocar em pauta a autonomia e reivindicação pelos direitos
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culturais dos povos indígenas e da população pobre do México, diante das
falhas de um sistema político e econômico cujas promessas nunca se tornaram
realidade e, pelo contrário, agravaram desigualdades estruturais nesse país.
Para além disso, busco explorar as questões epistêmicas que orientam
a ação política das comunidades zapatistas. Interrogo se poderia existir, no
seio dessas lutas e cosmopolíticas, como resistência indígena, uma maneira
de entender e praticar o que chamamos de Relações Internacionais (RI), nos
seus próprios modos. Neste escrito tentarei argumentar que, sim, entendendo
a política para além das instituições da modernidade/capitalismo, no qual
se serve como campo científico à empresa colonizadora. Antes, acredito ser
importante introduzir quem são os Zapatistas.
Os zapatistas vieram a público em 1º de janeiro de 1994 no estado de
Chiapas, o mais pobre e menos desenvolvido do México. Indígenas camponeses
tomaram armas e se levantaram em oposição às reformas para o ingresso
do país no Tratado de Livre Comércio da América do Norte – especialmente
a reforma do artigo 27 da Constituição, que garantia a propriedade coletiva
de terras. É necessário, contudo, considerar que foram mais de dez anos de
organização social e política para chegar à decisão de insurgir-se (Gunderson
2013). Desde então, passaram mais de 30 anos, indo do fogo e das armas às
palavras e à negociação de um possível acordo de paz, além da proposta
legislativa pelos direitos indígenas às suas terras, culturas e autonomias.
Posteriormente, dada a negativa dos poderes legislativo, executivo e judiciário
mexicanos em aprovar os acordos e conceder esse caráter autonômico como
sujeitos de direito, mantendo a tutela sobre os povos, se passa ao exercício
de facto dessas autonomias nos territórios zapatistas, (Khasnabish 2010;
Baschet 2018).
Por outro lado, tradicionalmente, pensa-se no EZLN (Exército Zapatista de
Libertação Nacional) como equivalente ao movimento neo-zapatista; porém, o
EZLN não emerge do vácuo, mas da confluência de lutas pela terra e pela vida,
de militâncias políticas e religiosas já existentes em Chiapas – especialmente
na Selva Lacandona – e do projeto de organização de células guerrilheiras da
FLN (Frente de Libertação Nacional) no interior do México diante da chamada
Guerra Suja do Estado mexicano contra seus opositores no fim dos anos 1970 (Le
Bot 1997; Gennari 2005).
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A partir dos anos 1940, a Lacandona passou pela colonização e ocupação
de camponeses indígenas sem-terra, expulsos das ncas de café e gado, com
incentivos estatais para reforma agrária e a promessa de participação nos
ejidos (terras comunitárias) (Leyva e Ascencio 1996; Fernández 2014). Esse
processo significou, igualmente, a aproximação de populações com distintas
línguas e origens étnicas, carregadas das onto-epistemologias tradicionais de
povos Maias (Chol, Tzeltal, Tsotsil, Tojolabal, Zoque, entre outros); assim como
a chegada de apoios eclesiásticos missionários, da Teologia da Libertação e do
Maoísmo revolucionário. É essa conjunção a base de sustentação epistemológica
e ideológica das organizações e alternativas, e do sentimento de comunidade
que surge na política da Lacandona (Leyva e Ascencio 1996; Gunderson 2013).
É aí que também se encontra a gênese da Autonomia Zapatista, o coração da
construção política do zapatismo (Baschet 2018).
Hoje, o EZLN não abarca a totalidade do movimento, sendo apenas
uma estrutura político-militar armada para a defesa territorial e dissuasão
frente aos ataques das forças estatais e paramilitares. Têm-se, ademais, as
comunidades zapatistas, chamadas de Bases de Apoio (BA-EZLN), organizadas
em assembleias regionais e comunitárias, autônomas e não-armadas, seguindo
a filosofia do mandar obedeciendo
3
. As Comunidades e o EZLN se complementam
e retroalimentam, com funções distintas sob os mesmos princípios, como uma
soma de formas de luta. A essa rede também se somam desde 1994 outros setores
do movimento indígena mexicano, da sociedade civil organizada e coletivos de
apoio no país e no mundo (Leyva 1998; Muñoz 2003; Rovira 2005; 2009).
Em Chiapas continua a guerra irregular de baixa intensidade e as
estratégias insurgentes contra as comunidades zapatistas. Há, incorporado
na guerra, um conlito ontológico, dada a forma distinta de interpretar a
realidade, se relacionar com o mundo e agir coletivamente dos zapatistas4.
Todavia, é necessário considerar a própria escolha em estar em resistência e se
rebelar contra o Estado mexicano – dada a continua negação dos seus direitos,
culturas e autodeterminação – e o capitalismo/modernidade e sua narrativa de
3 São sete princípios que guiam essa forma de governo popular: servir e não servir-se; representar, não
suplantar; construir e não destruir; obedecer, não mandar; propor, não impor; convencer, não vencer; descer
e não subir.
4 Sobre conlitos ontológicos, ver: de Almeida, Mauro. 2013. "Caipora e outros conlitos ontológicos." Revista
de Antropologia da UFSCAR 5 (1): 7-28.
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progresso em prol dos seus próprios modos de existência e cosmopolíticas. Para
essas comunidades, a globalização neoliberal representa uma ameaça às suas
formas de existência como povos; representa a continuidade de uma guerra de
500 anos que os tem expulsado, assim como seus ancestrais, dos seus territórios,
o local da vida e das relações mais-que-humanas.
A ideia de uma teoria e práxis própria dos zapatistas não é nova. Walter
Mignolo (2011) já se referia à Autonomia Zapatista como uma “revolução
teórica” que toma por base a recuperação da dignidade humana, tirada deles
pela violência colonial. Para ele, a ética serve como farol da ação política, pelo
mandar obedecendo como comando do governo autônomo. Assim os zapatistas
efetuam uma dupla tradução entre o pensamento considerado moderno e
o saber tradicional indígena, produzindo algo muito diferente, que não é o
primeiro nem o último e que vai além das formas iluministas de conceber o
saber, o poder e de orientar a ação coletiva.
Da mesma forma, para Michel (2003), a busca pela dignidade perdida em
500 anos de colonialismo e dominação constitui o fundamento da onto-ética
zapatista, como resposta à guerra genocida que eles enxergam como a estratégia
do ocidente para sua expansão; daí pode-se compreender a necessidade de
afirmar a resistência como caminho para a construção da sua autonomia.
Ramón Grosfoguel (2007) também teria se referido ao zapatismo em
termos do pensamento pluriversal e transmoderno como uma proposta
epistemológica embasada na diferença. Para ele, a forma de governança, apesar
de contra o estado mexicano, desafia as noções modernas de democracia e
poder, estabelecendo, em contrapartida, uma política do andar perguntando,
na qual não se propõe um programa de governo, mas se escuta e aprende
o que as populações demandam para seu autogoverno. O exemplo mais
claro disso foi dado na “Outra Campanha” em 2005, ano de pré-eleições
presidenciais no México. Na ocasião, os zapatistas percorreram o país
encontrando-se com coletivos e comunidades para articular um programa
de lutas que agregasse diferentes setores da sociedade. Assim, o programa
político é o resultado, não o início da campanha política representativa,
que seria trocada por uma democracia radical, feita por e para todos.
Na análise desse ilósofo, o ‘andar perguntando’ e ‘mandar obedecendo
seriam os pilares metodológicos de uma descolonização da política
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eurocentrada universalista, apontando para esse mundo onde cabem muitos
mundos.
Igualmente, Cynthia Enloe (2004) comenta sobre o levantamento zapatista
como resultado de uma análise das Relações Internacionais que muitos
comentaristas não fariam:
traçando conexões casuais entre as economias políticas locais, as
contradições do sistema de estados e as relações interestatais emergentes.
Eles conectaram a reverência do estado mexicano às pressões dos EUA
[...e as] tendências à violência crescente exercida por guardias blancas
contratadas por ricos proprietários de terras de Chiapas[...]. Em sua
soisticada análise internacional, os zapatistas foram ainda mais longe:
airmaram que nenhum desses movimentos teria sido possível se o PRI
não fosse capaz de controlar o sistema político nacional por meio de um
processo eleitoral que garantisse que as vozes dos camponeses pobres
não teriam impacto sobre tomada de decisão do estado (Enloe 2004, 35,
ênfases no original)
5
É importante destacar que Enloe, ao trazer a experiência zapatista, se
refere às subjetividades que a Teoria das RI deixa às margens, nos silêncios
e degraus inferiores da escala social. Ao se voltar preponderantemente para
a análise de assuntos como a segurança e a diplomacia das potências, das
organizações multilaterais, do comércio global, etc. (as high politics) impõe uma
forma de fazer política como uma verdade universal, imutável e eterna, sob a
premissa da igualdade soberana e o jogo de interesses de poder, com a simulação
de discurso científico sobre essa política eurocentrada de exclusões e violência
6
.
5 No original: tracing casual connections between local political economies, state system contradictions, and
emergent interstate relationships. They connected the Mexican state’s bowing to the U.S. state’s pressure [...and]
those trends to the escalating violence wielded by guardias blancas hired by wealthy Chiapas landowners [...].
In their sophisticated international analysis, the Zapatistas went still further: they contended that none of these
moves would have been possible were not the PRI able to control the national political system through an electoral
process that ensured that poor peasant’s voices could not have an impact on state decision-making.
6 Na crítica de Enloe faz-se referência ao realismo de Morgenthau como cânone basilar das Teorias de RI, a
partir do qual estrutura-se o corpo epistêmico e as teorias do campo; porém, o mesmo pode-se dizer de outras
perspectivas, tais como os liberalismos de Wilson e Keohane; os neorrealismos de Waltz e Mearsheimer, a
paz democrática ou inclusive os construtivismos mais convencionais. É importante também lembrar a crítica
de Cox (1981) sobre como o campo busca dar solução a problemas orientado pela manutenção de ordens
hegemônicas e que, de outro modo, poderia debruçar-se sobre forças e movimentos sociais e seus arranjos
na busca de outras correlações de força, gerativas de ordens anti-sistêmicas. Sobre as RI serem fundadas em
bases ilosóicas eurocentradas, colonialistas e racistas ver também: Krishna 2001; Hobson 2012; Anievas,
Manchanda e Shilliam 2014.
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As RI, em sua versão mais profusa, esquece, silencia e ignora as vidas de pessoas
reais, empobrecidas e exploradas, e o que têm a dizer sobre o mundo aqueles que
padecem das consequências da modernidade/colonialidade e a política de cima.
Dados esses referentes e contextualização histórica, passamos a descrever
do que se trataria essa outra forma de analisar o internacional, de baixo, à
esquerda e com a terra (ver: Escobar 2016). Este texto organiza-se então em
três seções, além desta introdução, na elaboração de uma interpretação do
pensamento-prática zapatista e sua aproximação ao internacional. A primeira
mostra uma onto-epistemologia política, uma cosmopolítica própria, que
dá sustentação à luta zapatista e demonstra uma posição anticapitalista,
antipatriarcal e antibélica, assim como um horizonte comunitário construído
como utopia concreta. Na segunda, abordo a organização política dos Caracoles
e do pensamento encaracolado como método de análise, relacionando o global
com o local, a dedução e a indução, o macro e o micro, a análise política e a ação
coletiva. Na terceira parte aponto a forma como o zapatismo se engaja com as
lutas de outras geografias, entendendo que o próprio zapatismo faz parte de
uma rede de solidariedades e resistências globais; dessa forma, efetiva-se a
premissa de ‘um mundo onde caibam muitos mundos’ e do pluriversal como
uma possibilidade concreta. Nas considerações inais, trago uma relexão
interpretativa de volta para o campo disciplinar das RI, oferecendo uma crítica
a partir da perspectiva da rebeldia epistêmica e a indisciplina do campo como
necessária para avançar em debates sobre pensamento relacional e outros
conceitos na seara das perspectivas pós-/de-/anti-/contra-coloniais e por outras
formas de pensamento e política além das fronteiras do Estado, da modernidade
e do capitalismo.
Em termos metodológicos, trata-se de um trabalho de revisão bibliográfica
em que se articulam visões e pensamentos de forma transdisciplinar, a partir
de relexões acadêmicas e relatos ativistas, da produção e publicação de
saberes autônomos das comunidades zapatistas e de observações participantes
da pesquisa em campo. Como já dito, procuro entender as bases onto-
epistêmicas que guiam a ação e performance política dos zapatistas e possíveis
interpretações do sentido da política global e da resistência planetária e
anti-sistêmica no zapatismo. No entanto, este é um trabalho acadêmico até
certo ponto convencional na sua forma e procedimentos de análise, mas que
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procura tecer-se com perspectivas decoloniais nas RI, averiguando sobre
outras concepções do mundo em que habitamos e nos relacionamos, os atores
e as formas da política e as estruturas globais de poder; nesse sentido, falha
também em se inserir e debater coletivamente na construção desses outros
mundos e, de certa forma, perpetua as maneiras do extrativismo e da alteridade
hierarquizada da academia ocidental.
A Hidra Capitalista e a IV Guerra Mundial contra
a Humanidade: uma episteme contra-hegemônica
Seguindo o ‘andar perguntando, as comunidades zapatistas têm
caminhado bastante na interrogação sobre o mundo, segundo suas geografias,
calendários e modos de ser. Para elas, a prática política da Autonomia seria
a meta-teoria que permite interpretar o mundo e direcionar suas ações.
O objetivo principal dessa práxis é ‘fissurar os muros, como forma de se referir
à constante e duradoura luta contra o capitalismo e a globalização neoliberal,
buscando, em oposição, abrir campo para outros mundos. O capitalismo,
multifacetado e em constante transformação, seria o inimigo real que ameaça
a existência dos povos e sua pluralidade, em Chiapas e no mundo (EZLN 2015).
A resistência a esse sistema não é de agora nem de 1994 em diante, é uma
luta que se enquadra em mais de 500 anos (EZLN 1994). Essa resistência é
contínua, já que as manifestações desse sistema são muitas e diferentes. Diante
desse muro, não se busca derrubá-lo de uma vez, mas pelo menos fratura-lo,
aos poucos, abrindo caminhos além do que esse sistema permite conhecer e
determinar como a realidade (EZLN 2015).
Há então alguns elementos que dão base à matriz de problemas da qual
parte a análise mundial dos zapatistas. Para isso, é importante entender que não
é só um muro que deve ser rachado para abrir horizontes. O capitalismo, para
os zapatistas, possui muitas cabeças que se multiplicam como a Hidra. Portanto,
são premissas elementares da concepção política zapatista, nas palavras do
subcomandante Galeano:7
7 Anteriormente conhecido como sub Marcos, por muito tempo o porta-voz da coletividade.
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1.
O sistema dominante atual é o capitalismo e é sua lógica a que é
dominante no mundo.
2. Esse sistema capitalista não é dominante apenas em um aspecto da
vida social, mas tem múltiplas cabeças, quer dizer, formas e modos
diversos de dominar em diferentes e diversos espaços sociais. Para
colocar nos termos da Defesa Zapatista: o capitalismo cabeçudo não
morde de um lado só, mas em muitos lados.
3.
Há um elemento inquietante na Hidra Capitalista. Se se toma a Hidra
como o animal mitológico, sabe-se que tem muitas cabeças, que se cortar
uma renascem duas, e que uma delas é como o coração da Hidra, a cabeça-
mãe. Mas tem outra hidra, o pequeno animal que não só reconstrói
seus tentáculos destruídos, também se adapta e é capaz de se regenerar
completamente desde uma das suas partes (EZLN 2015: 211)
8
.
Porém, há muito mais da reflexão do mundo do que saber o que se enfrenta.
Há também uma interpretação de como conhecer o mundo e transformá-lo:
agindo como sentinelas, atentos, reconhecendo que, para chegar a um saber
outro, é necessário sujar-se e desafiar os limites, assumir uma posição e refletir
sem ser doutrinário. É uma maneira de saber-se e aprender em coletivo,
somente juntos evita-se a ‘síndrome do vigia, perdendo a capacidade de
observação e surpresa, e pela fixação em um elemento perde-se o todo, não se
percebem as mudanças; para isso é necessário acompanhar-se, cobrir os pontos
de visão entre todos, mantendo uma visão periférica (EZLN 2015: 23-26). O ser e
pensar zapatista implicam pensamento crítico, atento às estruturas sistêmicas
de opressão e à ação coletiva como aquela que possibilitaria ir ‘fissurando o
muro’ em várias frontes.
O capitalismo não é uma Hidra qualquer, mas uma em ofensiva constante
contra a humanidade. Essa guerra do capitalismo, instrumentalizada nos
Estados e no neoliberalismo, apresenta-se como projetos de destruição e
8 No original: 1.– El sistema dominante actual es el capitalismo y que es su lógica la que es dominante en el mundo.
2.– Que este sistema capitalista no es dominante sólo en un aspecto de la vida social, sino que tiene múltiples
cabezas, es decir, formas y modos diversos de dominar en diferentes y diversos espacios sociales. Para ponerlo en
términos de la niña defensa zapatista: el capitalismo cabezón no te muerde en un sólo lado sino que en muchos
lados. 3.– Hay un elemento inquietante en esto de la Hidra Capitalista. Si se toma a la Hidra como el animal
mitológico, se sabe que tiene muchas cabezas, que si cortas una renacen dos, y que una de ellas es como el corazón
de la Hidra, la cabeza madre por llamarla de alguna forma. Pero hay otra hidra, el pequeño animal que no sólo
reconstruye sus tentáculos destruidos, también se adapta, muta y es capaz de regenerarse completa desde una
de sus partes.
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morte para os povos e todos os sujeitos dissidentes a esse sistema. Há um
tipo de conflito ontológico entre a boa vida do Capital, baseada na exploração
e acumulação, e outra, baseada em relações simbióticas com a terra, entre a
comunidade e seres mais-do-que-humanos, em resistência há mais de 500 anos.
De maneira mais concreta, o já falecido sub Marcos (2001) afirma que o
neoliberalismo, como sistema político-econômico globalizado, constitui uma
nova forma de guerra, para a ocupação e conquista de territórios e populações,
forçando os Estados-nação a redeinirem suas identidades. Essa guerra é
totalizadora mas não total – ocorre a todo momento, em qualquer lugar, sob
qualquer circunstância, mas sempre por partes. É a IV Guerra Mundial contra
a Humanidade.
Explica Marcos (2001; 2003a) que, após a Primeira e Segunda Guerras
Mundiais, a Terceira teria acontecido durante a Guerra Fria, com o confronto
por procuração entre as frentes capitalistas e socialistas, na busca por aliados
e por espaços de conquista. Após a queda do muro de Berlim, a dissolução
da União Soviética e seus aliados socialistas, e o triunfalismo do capitalismo
ocidental, segue-se a Quarta Guerra Mundial, travada na disputa por
recursos entre os maiores centros do capital financeiro, em escala global e
transfronteiriça, com intensidade alta e constante.
Uma das primeiras vítimas dessa nova guerra mundial seriam os mercados
nacionais, liquidados pela “artilharia da economia inanceira global”, do
qual a globalização liberal e a informatização seriam as faces de extensão
totalitária para todos os aspectos da vida, deixando os Estados desprotegidos
para defender os interesses de seus cidadãos. As fronteiras da soberania
nacional não são mais o artiício que definiria os lados, pois não interessam
mais ao neoliberalismo. Essa guerra destrói as ‘polis’ modernas, substituindo-
as pelas ‘megalópoles’ dos centros financeiros globais; designa novas funções,
limites e perspectivas às nações, que se converteriam em “departamentos dos
meganegócios neoliberais, em que o interesse econômico prevalece por cima
do social. A política não seria mais a força motriz do Estado-nação, os políticos
seriam gerentes dessa economia global. Para Marcos, seriam evidências dessa
nova guerra total – até meados dos anos 1990 – a separação dos antigos países
comunistas, a Guerra do Golfo e a constituição da União Europeia.
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Essa guerra responde a um quebra-cabeça global de sete peças: a
acumulação da riqueza e redistribuição da pobreza como polos da sociedade
planetária; a globalização da exploração; o pesadelo do desemprego e a migração
de grande parte da humanidade; a violência legítima do Estado de um poder
ilegítimo; a relação obscura entre poder e criminalidade pela globalização
financeira; os mistérios da mega-política (políticas nacionais centradas nos
interesses de um polo da acumulação global); e as pequenas pessoas e as
ltiplas formas de resistência da humanidade contra o neoliberalismo. (SCI
Marcos 2003a)
É nessa última peça que SCI Marcos insere a luta dos zapatistas. Porém,
Chiapas não é o único local de resistência, só um entre os vários que existem
ao redor do mundo. A conclusão de Marcos, enfim, deixa uma chamada para
construir um mundo no qual caibam outros mundos, todos os mundos; dado
que nesse quebra-cabeças da globalização não se encontram todas as peças
necessárias e as que estão ali colocadas não se encaixam.
Hoje, o contexto de violência no mundo corresponde ao empreendedorismo
neocolonial capitalista, reeditando a conquista e o genocídio para seu avanço.
A guerra é total contra todos os seres no planeta: humanos e não-humanos,
pela devastação ambiental e desterritorialização que apagaria as relações com
outras entidades, e, portanto, a existência delas.
A política do Caracol:
práxis, organização política e pensamento relacional
Sabendo então a base onto-epistêmica e cosmológica da qual parte o
pensamento zapatista (habita-se um mundo dominado pelo capital, que faz a
guerra em todo lugar, em todo momento, e a única alternativa é a resistência),
prosseguirei a detalhar as formas como, na experiência política do zapatismo,
aparece a igura do Caracol em seus sentidos polissêmicos: uma forma de
pensar e uma figura para a organização, base da Autonomia como autogoverno
e desenvolvimento alternativo.
Uma primeira questão que chama atenção ao analisar as declarações
blicas e escritos da voz coletiva, assim como a organização de eventos
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blicos, é a maneira como se realizam as análises e se propõem alternativas aos
problemas que são percebidos, vinculando, ao mesmo tempo, questões globais
e locais, coletivas e íntimas, da política em abstrato às ações territorializadas
na busca pela autodeterminação. Isto é evidente no relato de Cynthia Enloe
(2004) acima, mas mais do que isso, o pensamento e a prática política do Caracol
fazem um movimento de análise multinível, que percorre em forma de espiral
de fora para dentro e devolve o pensamento com ações de dentro para fora.
É uma maneira de ir do grande ao pequeno e depois começar construindo de
baixo, gerando um entendimento processual, holístico e crítico dos sistemas
econômicos, políticos, da ética e da epistemologia que orientam as ações do
coletivo. Seguindo com a reflexão do capitalismo como uma Hidra, os zapatistas
também postulam que
4.– Existe um elemento que não é explícito, mas é fundamental: a prática.
[...] O que está em jogo aqui, e depois no além de cada quem segundo seus
tempos, modos e lugares, é a transformação da realidade (EZLN 2015: 212).
9
Assim, a meta-teoria zapatista não se desliga da realidade prática, mas
propõe-se a realizar a utopia: se o pressuposto inicial é que o capitalismo é
um sistema dominante, assume-se que não é onipresente nem imortal;
resistências de cima e de baixo, sendo as últimas as que podem realmente
ameaçá-lo. A teoria deve, portanto, ir acompanhada da prática: “quem faz teoria
deve fazer também sua prática” (p. 213), já que se é apenas um pensamento,
não poderia ser crítico, explicam. Isso também implica um questionamento da
realidade que somente quem está no campo das lutas pode fazer, assim como
deve estar disposto a ser interpelado pelo diálogo com outras interpretações
do mundo e das suas situações concretas.
O pensamento zapatista anda perguntando sobre problemas e proposições.
É um pensamento em forma de caracol, que parte de uma situação maior e
desce para a compreensão do entorno pelas experiências encarnadas em
relação com o todo; depois, irá construindo com esses aprendizados e propondo
possibilidades para fissurar a muralha, decepar a Hidra. Explica o sub Marcos:
9 No original: 4.– Hay un elemento que no está explícito pero que es fundamental: la práctica. [ …] Lo que está en
juego acá, y después en los allá de cada quien según su tiempo, modo y lugar, es la transformación de una realidad.
Daniel Sebastián Granda Henao
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Por várias horas, esses seres de coração moreno traçaram, com suas ideias,
um grande caracol. Partindo do internacional, seu olhar e seu pensamento
foram se aprofundando, passando sucessivamente pelo nacional, regional
e local, até chegar ao que chamam de “El Votán. O guardião e o coração do
povo, os povos zapatistas. Assim, da curva mais externa do caracol, pensam-
se palavras como “globalização, “guerra de dominação, “resistência,
economia, “cidade, “campo, “situação política” e outras que o apagador
vai eliminando após a pergunta usual “Está claro ou há perguntas?”. No
inal do caminho de fora para dentro, no centro do caracol, restam apenas
umas siglas: “EZLN”. Depois há propostas e desenham-se, no pensamento
e no coração, janelas e portas que só eles veem (entre outras coisas, porque
ainda não existem). A palavra díspar e dispersa começa a fazer um caminho
comum e coletivo. Alguém pergunta ‘Tem acordo? “Tem, responde a voz
já coletiva, airmando. O caracol é traçado novamente, mas agora em
caminho inverso, de dentro para fora. O apagador também segue o caminho
inverso até que tudo o que resta, preenchendo o velho quadro-negro, é
uma frase que para muitos é delírio, mas para esses homens e mulheres
é motivo de luta: “um mundo onde cabem muitos mundos”. Depois disso
toma-se uma decisão. (SCI Marcos 2003b)
10
.
Outro elemento importante para entender as dimensões meta-teóricas
da luta zapatista é a importância da organização social para conseguir atingir
tudo aquilo que se propõem, a utopia viva nos seus territórios, segundo seus
próprios modos de ser e viver em coletivo. Essa organização é a que permite
articular o pensamento de modo coletivo e ter práticas do seu horizonte
político-ético-epistêmico: olhar o mundo para dentro de si e depois caminhar
juntos do menor ao maior, do pessoal ao global. O subcomandante Moisés, atual
porta-voz, fala sobre isso:
10 No original: Durante varias horas, estos seres de corazón moreno han trazado, con sus ideas, un gran caracol.
Partiendo de lo internacional, su mirada y su pensamiento ha ido adentrándose, pasando sucesivamente por
lo nacional, lo regional y lo local, hasta llegar a lo que ellos llaman "El Votán. El guardián y corazón del pueblo",
los pueblos zapatistas. Así desde la curva más externa del caracol se piensan palabras como "globalización",
"guerra de dominación", "resistencia", "economía", "ciudad", "campo", "situación política", y otras que el borrador
va eliminando después de la pregunta de rigor "¿Está claro o hay pregunta?". Al final del camino de fuera hacia
dentro, en el centro del caracol, sólo quedan unas siglas: "EZLN". Después hay propuestas y se dibujan, en el
pensamiento y en el corazón, ventanas y puertas que sólo ellos ven (entre otras cosas, porque aún no existen). La
palabra dispar y dispersa empieza a hacer camino común y colectivo. Alguien pregunta ‘¿Hay acuerdo? "Hay",
responde afirmando la voz ya colectiva. De nuevo se traza el caracol, pero ahora en camino inverso, de dentro
hacia fuera. El borrador sigue también el camino inverso hasta que solo queda, llenando el viejo pizarrón, una
frase que para muchos es delirio, pero para estos hombres y mujeres es una razón de lucha: "un mundo donde
quepan muchos mundos". Más despuecito, una decisión se toma.
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O que fazemos como zapatistas, sempre que possível, é dizer ao povo
que se organize para resistir, para lutar, para ter o que precisa. […]. As
soluções são feitas pelo povo, não pelos líderes, nem pelos partidários.
[...] Nós, zapatistas, dizemos que você não deve ter medo de que o povo
governe. É o mais saudável e criterioso. Porque as próprias pessoas vão
fazer as mudanças que realmente precisam. […] Nosso pensamento não
é dar receitas de como lidar com o problema do capitalismo. Também
não é impor o nosso pensamento aos outr@s […] Pensamos que temos de
nos forçar a pensar, a analisar, a reletir, a criticar, a encontrar o nosso
próprio ritmo, o nosso próprio caminho, nos nossos lugares e nos nossos
tempos. (EZLN 2015: 337-346)
11
Além dessa política e pensamento encaracolado, é importante apontar
que essa organização ocorre em torno da prática do que chamam Autonomia
Zapatista, como conceito-guia da luta. Sobre a autonomia, é importante destacar
que, segundo Pleyers (2009), para os zapatistas, a afirmação da sua dignidade
passa pela reivindicação do controle sobre suas vidas e sobre as decisões que os
afetam, mas que eram tomadas por mandatários políticos e econômicos muito
distantes da vida dos indígenas em Chiapas. A resistência e a autonomia partem
da síntese das próprias reivindicações pela reapropriação dos seus territórios
e da autodeterminação para viver segundo seus costumes. Assim, busca-se
alcançar mudanças globais desde o trabalho local.
Na minha interpretação, a prática da Autonomia Zapatista é uma resposta à
guerra. Essa prática poderia ser percebida também em um sentido polissêmico:
como organização no cotidiano e resistência ao capitalismo e à guerra pela
política em diferença e dissidência; como forma de interpretar e atualizar o
bem-viver do pensamento ancestral maia; e como oposição ao projeto de morte
neocolonial, por um projeto de vida coletivo (Henao 2019; 2021).
Em 2003, as comunidades decidiram que deviam exercer seu direito
à autodeterminação – como tinham pactado nos Acordos de San Andrés e
11 No original: Como zapatistas que somos lo que hacemos, cada que se puede, es decirle a la gente que se organice
para resistir, para luchar, para tener lo que se necesita. […]. Las soluciones las hace el pueblo, no los líderes, no los
partidistas. […] Nosotr@s zapatistas decimos que no se le debe tener miedo a que el pueblo manda. Es lo más sano
y juicioso. Porque el pueblo mismo va a hacer los cambios que verdaderamente necesita. […] Nuestro pensamiento
no es para dar recetas de cómo hacer frente al problema del capitalismo. Tampoco es para imponer nuestro
pensamiento a otr@s […] Pensamos que tenemos que obligarnos a pensar, a analizar, a reflexionar, a criticar, a
buscar nuestro paso propio, nuestro modo propio, en nuestros lugares y en nuestros tiempos.
Daniel Sebastián Granda Henao
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amparados pela Convenção 169 da OIT– sem/apesar do Estado mexicano, do
qual tinham sido traídos pela reforma do estatuto indígena pelo Congresso
Nacional. Assim, fundaram os Caracoles como lugar para exercer o Mandar
Obedecendo. Cada Caracol teria uma Junta de Buen Gobierno (JBG), nomeada
pelos companheiros em eleição, com mandato para resolver conlitos e
desavenças, cuidar dos recursos das comunidades e coordenar os trabalhos
coletivos e comissionados (Alonso 2003: 51-53). Isto já era algo que eles faziam
antes do levantamento em 1994, inclusive antes da formação do zapatismo como
tal, mas toma forma diante da necessidade de estruturar o que estava sendo
construído nos territórios rebeldes, aprofundar e concentrar forças na sua
Autonomia (Baschet 2018).
Já para Aidé Arévalo (2008), os Caracoles respondem também à necessidade
de fortalecer a organização e seus processos de autonomia de forma mais
equilibrada, entendendo que haveria desigualdades entre as comunidades.
Esses espaços, então, aparecem onde há maior assédio das autoridades, do
Exército e dos paramilitares. Além disso, implica uma transformação dos
modos e da ação do EZLN: os milicianos insurgentes icariam limitados a
velar pela segurança ísica das comunidades diante das possíveis ofensivas
armadas; as JGB fariam a luta política e as estratégias de relacionamento entre
as comunidades e junto à sociedade civil. O governo dos territórios recuperados
fica nas mãos das próprias BA-EZLN.
A Autonomia faz-se, como comentam nos cadernos da Escuelita Zapatista
EZLN 2013a;b;c;d), com projetos e sistemas próprios de educação, saúde, justiça
e produção (milho e milpas, café, gado, etc.). Ela é feita por todos: comunidades,
municípios autônomos, e as JGB nos Caracoles, com cuidado para a paridade
de gênero.
É mais do que uma experiência de autogoverno, está aí implícita a
construção dos outros mundos enquanto se defende o território; promove-se
uma forma de democracia participativa radical e uma justiça segundo seus
costumes. Mais do que a destruição da Hidra e outras estruturas de opressão,
se importa com a possibilidade real de viver em harmonia, em comunidade
e com a terra. Não representa apenas uma resistência frente ao Estado como
a organização política por excelência da modernidade/capitalismo; é uma
forma de governar respondendo aos interesses das próprias comunidades
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e se contrapor a esse sistema com alternativas radicais anti-sistêmicas;
estabelecendo relações sociais, econômicas e políticas a partir de uma
concepção própria do mundo.
Por outro lado, é importante apontar que a Autonomia Zapatista encarna
e atualiza o Lekil Kuxlejal, a boa-vida, o “florescer da árvore da vida” para as
comunidades Tzeltal e Tsotsil de Chiapas. O Lekil Kuxlejal representa falar
e fazer o bem-viver tanto no sentido material quanto em relação ao social, à
natureza e às entidades espirituais. A Autonomia guarda relação com o Lekil
Kuxlejal como uma forma de vida comunitária e uma luta por uma vida em
harmonia, com justiça e dignidade. Assim, é possível afirmar que na Autonomia
encarna-se e dá-se movimento ao Lekil Kuxlejal (Schittler 2012).
Em suma, a Autonomia, pensada em caracol e praticada nos Caracoles
transforma a experiência de vida coletiva dos zapatistas como um horizonte de
bem-viver frente à guerra imposta nos corpos e territórios deles pelo Estado
mexicano e a globalização neoliberal/neocolonial. Passadas as tentativas de
se fazer ouvir pelo fogo, ou diante da traição quando optaram pela palavra,
decidem que terão que fazer esses mundos pluriversais com as mãos, sem pedir
perdão nem permissão.
Do mesmo modo, deve-se destacar que esse caminhar como caracóis
(devagar e sempre) está acompanhado por outros coletivos e povos em
resistência e autonomia. Os zapatistas têm construído pontes e tessituras
com outros movimentos e organizações, dialogam e fazem redes com outras
propostas de alternativas ao capitalismo, à globalização neoliberal e pelo
exercício do direito à autodeterminação dos povos. Tendo adentrado o coração
da experiência zapatista, na sua Autonomia, vamos no caminho inverso,
pensando no impacto dessa experiência localizada para o internacional.
Altermundismo, Internacionalismo e os Bolsões de
Resistência
Desde a aparição pública em 1994, a sociedade civil mexicana e internacional
demonstraram simpatia e identiicação com os pleitos do levantamento
zapatista. Assim, conseguiram emplacar uma agenda nacional e mundial em
Daniel Sebastián Granda Henao
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defesa da pluralidade de formas de ser e multiplicidade étnica, enfatizando a
confrontação ao interior dos Estados nacionais com o modelo integracionista
neoliberal e reafirmando o direito à autodeterminação e posse de territórios
autônomos como garantias dessa diversidade (Leyva 1998).
A autonomia, a dignidade e a resistência como eixos do levantamento
zapatista e da meta-teoria que orienta suas ações cotidianas expressam a
preocupação pela preservação da vida ísica e cultural. O argumento ontológico
da luta zapatista sustenta-se na ideia que as culturas indígenas e camponesas às
quais seus integrantes pertencem estão sendo exterminadas e cooptadas pelo
avanço do capitalismo. A resposta seria pluridimensional, em outras formas de
organização social e governança autônoma, ao mesmo tempo que declaram uma
guerra discursiva às meta-narrativas do progresso, incorporadas pelos agentes
do Estado mexicano e seus pares no estrangeiro.
A palavra altermundismo é elencada aqui para vincular a luta zapatista a
muitas outras, em que caberiam, por exemplo, protestos globais, tais como a
‘Batalha de Seattle’ em 1999 contra as novas regras da OMC, movimentos pela
descarbonização e o decrescimento, o Fórum Social Mundial, entre outros.
Essas têm em comum uma maneira de pensar/fazer as relações internacionais
pelas pessoas e lutas de baixo, unidas por uma outra forma de globalização.
Situam-se na sociedade civil global, em um mundo de fronteiras ficcionais.
Então, o global passa a ser uma caraterística e um campo de muitas formas de
luta entrelaçadas (Rangel 2016).
Já Arturo Escobar (2004) entende o altermundismo como exercício
de contra-hegemonias diante do discurso da globalização neoliberal, pela
emergência de redes de movimentos sociais auto-organizadas sob uma nova
lógica de globalização anticapitalista. Ou bem, é a globalização das resistências
(Amin & Houtart, 2003). Para Souza Santos (2007), trata-se de formas de ação
coletiva globais por meio de redes transnacionais, por vínculos locais, nacionais
e internacionais; em lutas cujo sucesso impulsiona sua reprodução em outras
localidades.
Tal como informa Xochitl Leyva (2017), o movimento armado abriu
uma nova fase para os movimentos sociais em Chiapas ao atrair apoiadores
internacionais que abraçaram os zapatistas. Não se deve considerar uma
vanguarda revolucionária; pelo contrário, como falava o sub Moisés,
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o chamado é a que cada quem se organize seguindo os seus próprios modos e
possibilidades. Não são os zapatistas que irão determinar como deve ser feita
a revolução, mas cada quem, segundo seus tempos e condições (EZLN 2015).
Giomar Rovira (2005; 2009) descreve a rede de apoio ao movimento
zapatista em duas dimensões: uma nacional e outra transnacional. A primeira
marchou a partir de 1994 pelo cessar-fogo e pelo diálogo, participou da
Convenção Nacional Democrática de 1995 e dos diálogos em San Andrés em
1996, organizou e promoveu consultas cidadãs, acolheu e fez a logística para as
distintas marchas e caravanas indígenas e rebeldes que o EZLN convoca ainda
hoje. É uma rede que tem pensado e escrito sobre as denúncias de racismo,
sobre o indigenismo e a autonomia, e acompanha também o Congresso Nacional
Indígena. Já o zapatismo transnacional se constitui como uma rede de redes em
que convivem distintas interpretações simbólicas, lutas localizadas e processos
sociais nos territórios em que ocupam.
Como exemplo, a prática desse altermundismo pôde ser vista desde os
primeiros anos, em que era comum o chamado para encontros internacionais
temáticos, como foi o Encontro Intercontinental pela Humanidade e contra
o Neoliberalismo, em 1996. Já em 2005, no contexto da Outra Campanha,
chamando a atenção sobre a negação de parte da população mexicana à
democracia representativa (Lima 2009: 17), emitem a Sexta Declaração da Selva
Lacandona (EZLN 2005). Nela propuseram uma estratégia de coordenação
com outros setores sociais, para que pudessem transformar a política e deixar
claro que se deve estabelecer um campo de lutas planetário; isto é, deveria se
construir uma política diferente, explicitamente antipatriarcal e anticapitalista
(Starr, Martinez-Torres, e Rosset 2011; Baschet 2018, 212).
Em 2013, os zapatistas convocaram suas redes a conhecerem melhor e
mais de perto a prática da sua Autonomia e governo na Escuelita Zapatista,
por ocasião dos 10 anos dos Caracoles. Nessa experiência, os povos ensinam
aos outros, pessoas urbanas e quem se sentir compelido a esse ensinamento,
o significado da liberdade para eles, explicando o que é o Governo Autônomo,
qual o papel das mulheres na Autonomia, e quais as formas de resistência dessa
Autonomia, para que depois levem essa teoria para a prática nos seus lugares
de pertencimento (Ver: EZLN 2014a;b;c;d).
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Além da Escuelita, em 2018 foi organizado o II Encontro de Redes de
Resistência e Rebeldia, do qual pude participar. A agenda consistia em conhecer
a adesão e o andamento dos acordos que tinham sido feitos no encontro
anterior; analisar e socializar nossos mundos, contar as nossas dores e como
observamos o mundo, de acordo com as situações locais de cada um – houve
presença de argentinos, guatemaltecos, colombianos, brasileiros, espanhóis,
gregos, estadunidenses, entre outros –; e finalmente fazer propostas de como
tecer as lutas em rede.
Em 2021 empreenderam a Travessia pela Vida, procurando levar e colher
esperanças e alternativas em um momento de colapso civilizatório, no cenário
de morte, guerra, violência e desenraizamento, além da pandemia de COVID-19
e apesar do cerco militar, para marcar presença, somar, aprender e partilhar
das suas experiências junto às lutas da Europa insubmissa.
Por fim, é importante destacar que a dimensão internacional do zapatismo
não está expressa apenas nos encontros ou esforços por conhecer outras
lutas e se tecer como resistências globais; mas pela forma como esses contatos
influenciam, modestamente, a vida cotidiana nos territórios; e como essas
solidariedades também tomam o referente dos zapatistas para suas próprias
lutas. (Baschet 2018: 215). Assim, percebem-se conexões entre o que os zapatistas
apelam no sudeste mexicano e o que outros povos enunciam e promovem em
seus próprios territórios, entendendo-se como inseridos na mesma matriz de
opressões e violências. Afinal, a guerra que se vive nos territórios e corpos
zapatistas é a mesma que golpeia em todos os cantos do mundo em que a Hidra
Capitalista entra, desloca, expropria, explora e acumula para normalizar uma
vida de consumo. A luta do internacionalismo que os Zapatistas inspiram é uma
luta pela vida e com a terra (Gómez 2023).
Por umas RI desde abajo y a la izquierda:
insurgir o saber
A política zapatista toma por base um horizonte ético pluricultural,
necessário para sua própria existência como povos em resistência ao
avassalador unitarismo neoliberal. Há nessa forma de ser e fazer política
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uma outra epistemologia, feita na luta pela vida no seu senso mais radical, na
resistência cotidiana dos oprimidos, na escuta ativa e no diálogo, entendendo
que a luta deve ser globalizada, em coletivo (Fajardo 2021). Trata-se de uma
abordagem que apela ao internacional desde abajo y para los de abajo, na qual
se constrói um mundo outro desde a própria socialização cotidiana e o trabalho
coletivo pela Autonomia.
Na luta pela recuperação da terra, o sustento material das suas culturas,
há um apelo ontológico sobre sua capacidade de permanecer vivos no tempo.
Assim como em muitas outras lutas, a terra é o fundamento para a construção
dos elos comunitários, por isso recuperá-la é basilar; é com a posse e uso do
território que se podem estabelecer relações políticas e cosmopolíticas.
O zapatismo constitui uma ilosoia política e prática política outra
(Khasnabish 2010; Michel 2003; Grosfoguel 2007), contingente à própria
percepção da realidade que essas comunidades fazem, e com o convite a que
outras sociedades organizem suas próprias formas de resistência local e global;
e que derivado disso pode existir uma própria compreensão particular de
outra política mundial. Assim, mais do que ser ‘uma guerrilha pós-moderna,
trata-se de um movimento de/entre movimentos, para uma revolução mais
profunda, global e local, em que o próprio conhecimento ocidental e moderno
se coloca em xeque. Esta é uma busca pela descolonização do poder, pelo
resgate da dignidade e da autonomia como eixos de uma sociedade plural
e diversa.
As interpretações sobre a política em escala planetária também implicam
desafiar o modo eurocentrado de pensar a política feita em instituições e ficções
organizativas, como o Estado. Aqui, é sempre importante lembrar que a crítica
de Marysia Zalewski (1996) sobre a separação entre a teoria e seus teóricos,
entre a teoria e o mundo real que pretende explicar, pela supervalorização da
racionalidade abstrata do Iluminismo.
Caminhando e perguntando junto aos zapatistas e suas redes, uma reflexão
que vi se tecendo é que as teorias e os conceitos da nossa academia de RI ficam
limitadas ao se deparar com a vida cotidiana de povos, sendo discursos de
poder favoráveis à manutenção de violências e formas de dominação imperiais,
com pretensões universalistas e raízes no eurocentrismo. Isso já foi discutido
por Chowdhry e Nair (2002: 16), quando afirmam que as noções humanistas
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de racionalidade e universalidade mantêm a criação e exclusão de outros,
sobre os que se pensa, fala e escreve, tornando-os marginais, insignificantes
e invisíveis.
Nos textos e encontros com comunidades zapatistas nunca faltam menções
ao sistema capitalista como uma economia política dominante; a hegemonia
dos Estados Unidos e os problemas de uma eventual confrontação com China;
das dificuldades e trapaças impostas pelo governo mexicano; casos de violência
policial e militarismo contra comunidades indígenas na América Latina.
Solidarizam-se com a situação de migrantes e refugiados em trânsito pelo
xico, assim como os do Norte da África, do Oriente Médio e da Venezuela.
Compartilham notícias vindas do Curdistão, de Euskadi, das revoltas na França,
etc. Todos esses temas e tópicos são por demais conhecidos e debatidos nas RI
e em outras áreas das ciências sociais. A diferença está no conteúdo ético e
na sensibilidade com que são tratados para fazer uma própria percepção do
mundo, de fora para dentro, e agindo de dentro para fora.
Poderemos pensar indisciplinariamente, como sugere Laura Sjorberg
(2017), acompanhando o caminhar da cosmopolítica zapatista e de outras
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