A Burguesia Brasileira e o Mercosul: entre o Movimento Pendular e o Regionalismo Negociado [...]
Rev. Carta Inter., Belo Horizonte, v. 18, n. 3, e1371, 2023
18-28
OSSIÊD
Relações Internacionais:
da América Latina para o mundo
Granato, Uberti e Menger (2021) mostram que a burguesia agrária
brasileira apresenta maior constância nos posicionamentos sobre o Mercosul
após o golpe de 2016. Até o governo Dilma, existia o entendimento entre ABAG
e CNA de que a prioridade deveria ser para os acordos bilaterais em detrimento
do Mercosul, mas após 2016 há mudanças nesse entendimento. As associações
declararam, a partir de então, que o Mercosul era uma peça central na política
externa, mas, no mesmo sentido da burguesia industrial, o bloco precisaria ser
formatado, aproximando-se do modelo de regionalismo aberto.
A partir do governo Temer, com a burguesia compradora se fortalecendo
no bloco no poder, o Estado brasileiro adotou outra política externa e
estabeleceu como meta um Mercosul comercial. Já na nomeação de José Serra
para Ministro das Relações Exteriores as novas prioridades puderam ser
percebidas, com acenos à União Europeia para a conclusão das negociações
do acordo com o Mercosul, e ao Mercosul para “corrigir o que precisa ser
corrigido” (Serra 2016). Dado a curta duração do mandato, essas formulações
foram conduzidas de forma mais incisiva pelo governo seguinte, o governo
Bolsonaro, em especial destaca-se a conclusão das negociações do acordo
Mercosul-União Europeia e a proposta de reforma da TEC, bem como o
abandono da decisão 32/00 (Ministério da Economia 2021a; 2021b).
A conclusão do acordo Mercosul-União Europeia em 2019, após vinte anos
de negociação, foi um enorme marco do governo Bolsonaro. Mas, logo em
seguida, foi preciso lidar com um conjunto de reações e manifestações sociais
e estatais na Europa, que se colocaram contrárias à ratificação do mesmo.
Os movimentos de pequenos agricultores, ambientalistas e sindicalistas se
unificaram contra a política de desmatamento do governo Bolsonaro e contra
o modelo de produção do agronegócio brasileiro. E isso levou a mudança de
posição, em especial, dos Estados alemão e francês acerca da ratificação do
acordo, o que acabou produzindo efeitos na política brasileira.
Além disso, já havia uma diferença na configuração entre os blocos no
poder argentino e brasileiro, que durante a pandemia da Covid-19 foi bastante
visível. Barros, Gonçalves e Samurio (2020) argumentam que a tendência à
desintegração política da América do Sul foi acirrada durante a pandemia.
Granato e Berringer (2020), na mesma linha, apontam que as burguesias
argentina e brasileira apresentavam visões irreconciliáveis. Nesse mesmo