Stéfano Mariotto de Moura; Marcelo Milan
Rev. Carta Inter., Belo Horizonte, v. 18, n. 1, e1288, 2023
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Ideologia do consumismo e
dados digitais na ordem mundial
contemporânea: uma proposta
contra-hegemônica
Ideology of consumerism and digital
data in contemporary world order:
a counterhegemonic proposal
Ideología del consumo y datos digitales
en la orden mundial contemporánea:
una propuesta contrahegemónica
DOI: 10.21530/ci.v18n1.2023.1288
Stéfano Mariotto de Moura
1
Marcelo Milan
2
Resumo
Discute-se a ideologia do consumismo e sua manifestação na
ordem mundial contemporânea, marcada por transferências de
dados digitais (big data). Argumenta-se que tal ideologia cumpre
papel central na atualidade, naturalizando o ato de consumir
através de sua ferramenta de influência clássica, o anúncio, o
qual está potencializado pelas tecnologias usadas pelas empresas
transnacionais de dados. Como esse consumo massificado reforça
processos hegemônicos social e ambientalmente regressivos,
mobiliza-se o método das estruturas históricas de Cox para
1 Doutorando em Estudos Estratégicos Internacionais pelo Programa de Pós-graduação
em Estudos Estratégicos Internacionais da Universidade Federal do Rio Grande
do Sul. (stefanomdemoura@protonmail.com).
ORCID: https://orcid.org/0000-0002-3717-9409.
2 Doutor em Economia pela University of Massachusetts Amherst. Professor Associado
II de Economia e Relações Internacionais e no Programa de Pós-graduação em
Estudos Estratégicos Internacionais na Universidade Federal do Rio Grande do
Sul. (marcelo.milan@ufrgs.br). ORCID: https://orcid.org/0000-0001-7586-6528.
Artigo submetido em 13/07/2022 e aprovado em 07/05/2023.
ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE
RELAÇÕES INTERNACIONAIS
ISSN 2526-9038
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apresentação de uma proposta contra-hegemônica à estrutura vinculada à ideologia do
consumismo.
Palavras-chave: Consumismo; Big Data; Ideologia; Robert Cox.
Abstract
The paper discusses the ideology of consumerism and its manifestation in the contemporary
world order, marked by big digital data transfers. It is argued that such ideology plays a
central role today, naturalizing the act of consuming through its classic influencing tool, the
advertisement, which is enhanced by the technologies used by transnational data companies.
As this mass consumption reinforces socially and environmentally regressive hegemonic
processes, Cox’s method of historical structures is mobilized to present a proposal for a
counter-hegemonic structure to the one linked to the ideology of consumerism.
Keywords: Consumerism, Big Data; Ideology; Robert Cox.
Resumen
El trabajo discute la ideología del consumismo y su manifestación en el orden mundial
contemporáneo marcado por las transferencias digitales de datos (big data). Se argumenta
que dicha ideología desempeña un papel central en la actualidad, naturalizando el acto de
consumir a través de su clásica herramienta de influencia, el anuncio, potenciado por las
tecnologías utilizadas por las empresas transnacionales de datos. Como este consumo de
masas refuerza procesos hegemónicos social y ambientalmente regresivos, se moviliza el
método de las estructuras históricas de Cox para presentar una propuesta contrahegemónica
a la estructura vinculada a la ideología del consumismo.
Palabras-clave: Consumismo; Big Data; Ideología; Robert Cox.
Introdução
As empresas transnacionais de dados, como Google, Meta (antiga Facebook),
Amazon, Apple e Microsoft, são hoje tanto parte integrante quanto fundamentais
para o funcionamento da ordem social contemporânea em geral e do imperialismo
norte-americano em particular, conforme as propostas de Couldry e Mejias
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(2019) e Kwet (2019) sobre o colonialismo digital e dos dados. Nos últimos
anos, elas têm sido classificadas entre as mais influentes e lucrativas, e suas
inovações tecnológicas afetam de forma substancial a reprodução das diferentes
forças sociais, mudando comportamentos culturais, políticos e econômicos e
modificando as condições de acumulação e a hegemonia de diferentes frações do
capital (Poon 2016). Especificamente, essas empresas precisam de um fluxo de
consumo contínuo e intenso para alcançar um elevado lucro. E uma das formas
mais efetivas, historicamente, para convencer a sociedade a adotar determinado
comportamento, como o consumismo, é a reprodução de ideologias (Eagleton
1997; Schmitt, Brakus e Biraglia 2022).
A reprodução ideológica do fenômeno do consumismo permite às empresas
transnacionais de dados absorverem lucros elevados tanto através da venda
direta de produtos, como no caso da Amazon, quanto com a publicação de
anúncios, como no caso da Google e da Meta (Moore e Tambini 2018). Por outro
lado, este consumo massificado reforça lógicas e processos hegemônicos social e
ambientalmente regressivos e, portanto, entende-se que a reprodução intensificada
de tal ideologia nos marcos da atual estrutura histórica deve ser superada por
uma estrutura contra-hegemônica (Brand e Wissen 2013; Worth e Kuhling 2004).
O presente trabalho avalia, à luz da Teoria Crítica (TC) das Relações
Internacionais (RI) (Cox 1981), as articulações entre a ideologia do consumismo e
o contínuo uso de dados digitais, que consolidam uma nova hegemonia na ordem
social contemporânea, e as possibilidades de superar tal hegemonia. Argumenta-se
que o entrelaçamento entre o uso dos dados digitais pelas empresas do setor
e a ideologia do consumismo confere a esta última papel central na ordem
mundial contemporânea, naturalizando o ato de consumir através o anúncio,
o qual está potencializado, em sua forma, pelas empresas transnacionais de
dados através da captação de informações possibilitadas pelas novas tecnologias
(Birch, Cochrane e Ward 2021). Mas os efeitos regressivos sobre a sociedade e
sobre o meio ambiente podem indicar uma fissura a ser explorada pelas forças
sociais antagônicas dentro desta estrutura histórica, permitindo visualizar
possibilidades contra-hegemônicas.
O argumento é desenvolvido por meio de revisão da literatura sobre as
ideologias, aliada a análises sobre as empresas transnacionais de dados e a internet,
propondo-se uma abordagem à ideologia do consumismo que leva em consideração
as crenças, relações de poder e técnicas. A seguir, o método das estruturas históricas
de Cox (1981) é empregado para formular uma proposta contra-hegemônica à
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estrutura hegemônica, vinculada à ideologia do consumismo, sustentada pelas
transnacionais. A contribuição de Cox possui um compromisso ético: a busca
por uma teoria da mudança, pela emancipação política, de alternativas ao status
quo, e não apenas solving-problem theories3.
A primeira seção identifica uma insuficiência no estudo da Economia Política
Internacional (EPI) relacionada à esfera cultural, estabelecendo uma base para o
estudo dos efeitos da ideologia no âmbito material do consumo. A segunda seção
propõe uma definição para ideologia do consumismo que considera a dinâmica
atual do fenômeno, impulsionada pelas novas tecnologias da informação e
comunicação, e aborda a intensificação desta ideologia e de seus efeitos através da
atuação das empresas transnacionais de dados. A partir dessas reflexões, a última
seção se utiliza dos triângulos de Cox (cujos vértices são as capacidades materiais,
as ideias e as instituições) para sugerir uma alternativa contra-hegemônica à
estrutura histórica hegemônica que se reproduz em função da ideologia do
consumismo. Esta é a contribuição inédita do artigo, pois as abordagens críticas
não abordaram de forma articulada, até o momento, as questões da ideologia
do consumismo, dos dados trabalhados pelas transacionais e do seu papel na
reprodução das estruturas hegemônicas, estando a literatura revisada concentrada
em um ou outro aspecto desta formulação. As considerações preliminares, por
fim, examinam o argumento central.
A esfera cultural da EPI e a ideologia
A palavra cultura carrega muitas vezes uma carga conotativa ligada às artes
em geral. Por exemplo, Williams (2014) a relaciona ao desenvolvimento do
intelecto, do espírito e da estética, a modos de vidas particulares e também às
obras intelectuais e artísticas. Stelowska (2015) defende a importância da influência
3 O arcabouço teórico do trabalho, a Teoria Crítica de Cox, é pós-positivista, com implicações epistemológicas
e ontológicas. Em primeiro lugar, entende-se que não é possível “explicar” a “realidade”, pois ela não é
acessível à pesquisa; no máximo, é possível fornecer interpretações. Em segundo lugar, entende-se também
não ser possível a separação entre sujeito e objeto, pois isso varia de pesquisador (a) para pesquisador (a).
Conclui-se que não é possível o objetivismo metodológico típico das teorias positivistas porque, enquanto
para as últimas a realidade poderia ser explicada através de relações causais, para os pós-positivistas ela
não existe, pois depende do observador. Além disso, para estes últimos, teoria e empiria se confundem, e
as produções teóricas são também objetos empíricos. Como decorrência, no máximo pode-se aproximar, de
forma interpretativa, do mundo ao redor, através das diferentes vias metodológicas disponíveis – qualitativa
ou quantitativas, empiristas ou não.
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da abordagem alemã, que limita a cultura à alta cultura, isto é, à ópera, música
clássica, artes visuais e literatura. Aos poucos, porém, a cultura deixou de ser
entendida como estando limitada às artes, e se ampliou o escopo do conceito,
passando a abarcar os aspectos do poder ideacional, das ideologias ou os modos
de vida particulares identificados por Williams. Para Eagleton (1997), a definição
antropológica de cultura engloba todas as práticas e instituições de uma forma
de vida. Azevedo (2017) argumenta que, dentro do materialismo cultural de
Williams, a cultura é um meio para as manifestações concretas da organização
social, em sua concepção e experiência. Convergente com esses entendimentos
acerca da esfera cultural está a definição de Indústria Cultural dos frankfurtianos
(Adorno 2002) sobre como a cultura popular na sociedade capitalista tardia
funciona como uma indústria na produção de produtos-padrão, os quais criam
comportamentos padronizados. Essa noção de cultura converge para a esfera
cultural da EPI. Para Gonçalves (2005, 21), esta se traduz no “poder das ideias,
dos valores e dos ideais. Esses são, de fato, os componentes fundamentais da
cultura”. Este é o espaço para as ações de reprodução ideológica, identificando,
portanto, o papel das ideias e das ideologias nas RI.
Porém, existe uma percepção de carência de estudos abordando a esfera
cultural da EPI (ou o vértice ideacional nos triângulos de Cox a seguir) (Gonçalves
2005; Shields, Bruff e Macartney 2011; Strange 2015), com poucas exceções (Jessop
e Sum 2006; Worth e Kuhling 2004). A cultura muitas vezes foi tratada como efeito
derivado de outras esferas (Moran 2014) quando, de fato, a produção cultural
reforça as desigualdades e contribui para formação do senso comum (Jenkins
2004). No mesmo sentido, a produção ideológica historicamente tem ajudado a
gestar a formação de novas ordens mundiais. Trentmann (1998) aponta como o
livre comércio, entre o fim da Era Vitoriana e o da Era Eduardiana, foi trabalhado
ideologicamente a ponto de se tornar algo racional, posto que herdeiro de uma
visão em que o Estado estaria dominado pelas paixões enquanto os mercados
seriam dominados pela pura racionalidade instrumental da teoria econômica.
A ideologia liberal havia conseguido, de certa maneira, transformar a economia
em um paradigma científico, aceito pela sociedade como se assim naturalmente
o fosse, e não o que de fato era. A noção de ideologia carregava, assim como na
atualidade, uma conotação pejorativa, como se não abarcasse uma construção
intelectual profunda, mas apenas opinião ou crença.
Há também interpretações que qualificam as ideologias. Cassels menciona a
distinção feita por John Plamenatz acerca dos níveis em que elas atuariam. Um
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deles é menos sofisticado, o das ideologias parciais. Essas tratariam de alguns
valores implícitos da sociedade sem o mesmo rigor que possuiriam as ideologias
totais, as quais operariam no nível sofisticado. Estas últimas parecem ser as
de que trata Gilpin (2016) quando relaciona as teorias de RI com a noção de
ideologia. Isso porque as ideologias totais de Plamenatz são aquelas que, concebidas
por intelectuais, carregam a noção de um futuro predeterminado (Cassels 2002).
Cassels identifica o nacionalismo como uma ideologia parcial, pois este não
possui a mesma estrutura intelectual que alguns outros “ismos” e nunca chegou
a produzir pensadores históricos (Cassels 2003). Mesmo assim, o nacionalismo
subverteu racionalidades e promoveu revoluções ao longo da história, mostrando
a força que pode ter qualquer ideologia, independentemente de ser ou não sólida
em termos teóricos. O nacionalismo, aliás, enquanto ideologia, assemelha-se à
ideologia do consumismo discutida na próxima seção. Ambas são baseadas em
símbolos e prescindem de uma construção intelectual robusta. Elas refletem valores
implícitos da sociedade como, por exemplo, as necessidades de pertencimento
a um grupo social determinado (nacionalismo) e de projeção de identidade no
meio social (consumismo).
Cassels (2003) e Eagleton (1997) concordam que a definição de ideologia
envolve aspectos de difícil tratamento. O primeiro concebe ideologia como
sendo, concomitantemente, um conjunto de ideias intimamente relacionadas,
mantidas por um grupo e uma interpretação ampla da condição humana, uma
espécie de fé emocional. Entende-se que a questão do grupo deve estar presente
na formação de uma ideologia porque um indivíduo pode ter uma ideologia
própria, naturalmente, mas será apenas uma figura singular dessa ideologia.
O pensamento ideológico em si deve ser compartilhado por um grupo, explícita
ou implicitamente. Como Gilpin, Cassels afirma que a ideologia deve conter,
ainda, uma interpretação ampla da condição humana. Isso é consequência de
a ideologia possuir um propósito sociopolítico, tornando necessário que ela
se proponha a explicar, de maneira tão acessível quanto bem fundamentada
teoricamente, diversos aspectos da vida em sociedade, possibilitando a qualquer
partidário ideológico uma ação sociopolítica embasada.
Já Eagleton (1997) apresenta múltiplas abordagens para classificar as
ideologias. Menciona um total de 16, que giram em torno das noções de crença,
poder e construção teórica. Ele defende que existem contradições entre estas
definições, tornando muitas delas incompatíveis. Argumenta também que algumas
definições para o termo são pejorativas, ambiguamente pejorativas ou nada
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pejorativas, fazendo com que tanto se possa dizer que o pensamento de um
opositor político é “ideológico”, bem como descrever as próprias opiniões como
“ideológicas” sem fazer menção ao fato de que possam ser falsas ou fantasiosas.
Assim, Eagleton (1997) propõe seis maneiras diferentes para definir ideologia:
a) um processo material geral de produção de ideias, crenças e valores na
vida social;
b) ideias e crenças (verdadeiras ou falsas) que simbolizam as condições
e experiências de vida de um grupo ou classe específico, socialmente
significativo;
c) promoção e legitimação dos interesses de grupos sociais em face de
interesses opostos;
d) unificação de uma formação social de maneiras que sejam convenientes
para seus governantes;
e) ideias e crenças que ajudam a legitimar os interesses de um grupo ou
classe dominante, mediante sobretudo a distorção e a dissimulação;
f) crenças falsas ou ilusórias, porém, oriundas não dos interesses de uma
classe dominante, mas da estrutura material do conjunto da sociedade.
O autor explica as razões que motivam essa busca por uma definição
progressiva para a ideologia. Suas duas últimas definições são as mais relevantes
para este trabalho. Na penúltima, afirma o uso “sobretudo de distorção e
dissimulação”. Já na sexta ele avança para defender que ideologias são um
conjunto de crenças falsas, derivadas da estrutura material da sociedade. Isso
evita a crítica de que ideologias não poderiam ser adotadas por uma classe
que não fosse dominante. Assim, é possível alterar uma ideologia, dominante
ou não. Essa última definição inclusive apresenta uma analogia à definição
de poder ideológico de Bobbio, Matteucci e Pasquino (1993), se sustentando
na influência social das ideias de um agente em posição de autoridade, sendo
estas ideias expressas de uma certa maneira, em uma determinada situação e
difundidas por dados processos.
Portanto, pode-se argumentar que um pensamento é ideológico inde-
pendentemente de seus defensores estarem no poder político. Isso porque as
circunstâncias e a autoridade podem ser as ideias de um comerciante burguês
em uma grande vila medieval, cuja difusão pode desafiar o poder da nobreza
a curto prazo, ou a de um proletário comunista discursando para centenas de
trabalhadores em meio a alguma organização sindical na Rússia czarista.
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A ideologia do consumismo e os dados digitais na ordem mundial
contemporânea
Propõe-se como desdobramento da discussão anterior, além de avaliar o
papel das empresas transnacionais de dados, a seguinte definição de ideologia do
consumismo: Um conjunto de ideias, implicitamente aceito pela sociedade, de que
o consumo é um eixo estruturante da vida social, seja como forma de projeção da
identidade no meio social ou como consequência de estímulos direcionados pelas
empresas capitalistas. Esse estímulo é realizado mediante sobretudo distorção e
dissimulação para naturalizar o ato de consumir. É uma ideologia parcial. Esta
definição é estruturada a partir dos trabalhos de Adorno (2002), Bobbio, Matteucci
e Pasquino (1994), Bourdieu (1983), Baudrillard (2009), Cassels (2003), Eagleton
(1997), Jenkins (2004), Schor e Holt (2011) e Trentmann (1998). Seis aspectos
desta definição merecem maior elaboração:
a) A ideologia do consumismo é um “conjunto de ideias, implicitamente
aceito pela sociedade, de que o consumo é um eixo estruturante da vida
social. Isso em virtude da dinâmica da publicidade, através de sua
ferramenta discursiva clássica, o anúncio, que estimula explicitamente o
consumo. Mas uma de suas principais consequências é manter na psiquê
social a noção permanente de que se vive com o objetivo de utilizar o
fruto material dos esforços laborais para a aquisição de bens que causem
conforto e satisfação.
b) O consumo funciona como “forma de projeção da identidade no meio
social. Isso porque se acredita que um dos fatores mais importantes a
justificar o ato de consumir é que este tem muitas vezes o significado
de projetar uma identidade para os demais grupos de referência, seja
através de bens ou serviços ou mesmo por meio de narrativas estéticas,
a partir dos bens consumidos, possibilitadas pelas redes sociais.
c) O consumo é ainda “consequência de estímulos direcionados pelas empresas
capitalistas. Isso porque são as empresas as que mais se beneficiam,
em especial materialmente, do consumo intensificado, dado que são
as proprietárias dos meios de produção. Assim, produzem, vendem ou
financiam os bens consumidos. Mas as classes dominantes se beneficiam
também em termos mais abstratos, pois as preferências burguesas acabam
sendo reproduzidas nos objetos de consumo.
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d) O consumo é estimulado por tais classes “mediante sobretudo distorção e
dissimulação” porque a principal forma de a ideologia do consumismo se
reproduzir é através da publicidade, que não necessariamente precisa ser
falsa, mas no mínimo supervalorizar as qualidades do produto à venda.
e) “Naturalizar o ato de consumir” é consequência direta dessa normalização
amplamente reproduzida pela publicidade, mas também das relações de
exploração do trabalho. Isso porque estas geram rotinas tão desgastantes
que negam o tempo necessário para o lazer não mercantilizado, oferecendo,
em troca, as relações de consumo.
f) A ideologia do consumismo é do tipo “parcial”, pois trata de valores
implícitos da sociedade sem o mesmo rigor, em sua elaboração, das
ideologias totais – ou seja, carece de uma maior fundamentação teórica.
Também a ideologia do consumismo não aponta um futuro inescapável,
predeterminado.
A definição adotada enfatiza:
As crenças que tanto motivam as pessoas a consumirem como também
auxiliam na naturalização da prática: consumo como eixo estruturante
da vida das pessoas e projeção da identidade.
A relação de poder que justifica a reprodução da ideologia: classes
hegemônicas economicamente e culturalmente.
A técnica, na linha de Eagleton, de distorção e dissimulação utilizada
para tal reprodução: o anúncio.
A publicidade é uma função da indústria cultural, uma estratégia do capital
que protege interesses monopolistas (Sweezy e Baran 1966). Em um mundo
marcado pelo monopólio das empresas transnacionais de dados, os efeitos da
publicidade se tornam, portanto, ainda mais acentuados, pois a técnica da função
publicitária, o anúncio, qualifica-se por meio dos mecanismos tecnológicos que
podem ser utilizados pelas empresas atualmente (dados de navegação online,
informações individualizadas obtidas através de data brokers4, etc.). O anúncio
é também a expressão discursiva da ideologia do consumismo, operando através de
dissimulação e distorção, ou seja, embala um produto sob um discurso de forma a que
4 As empresas conhecidas como data brokers operam reunindo e organizando dados sobre milhões de pessoas
para vendê-los a empresas interessadas em usá-los para levar seus produtos a esses potenciais consumidores.
No caso dos Estados Unidos, onde estão nove das dez maiores data brokers do mundo, tais empresas reúnem
até mesmo dezenas de milhares de dados sobre um único indivíduo (Sherman 2021), atuando em um mercado
quase que totalmente desregulamentado (Ramirez et al. 2014).
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aquele seja mais valorizado do que seria apenas em termos de suas funções práticas.
Essa dinâmica de operação faz com que a ideologia do consumismo se ramifique e se
integre à sociedade (Artz 2016). Note-se que o anúncio, enquanto instrumento da
reprodução da ideologia do consumismo, prescinde de ideólogos específicos. Ou
seja, não é através da retórica, palanques, debates ou discursos que a ideologia do
consumismo é reproduzida por seus agentes, mas sim através do fluxo contínuo
de anúncios na vida social.
Para compreender os efeitos desta ideologia, é necessário entender sua
manifestação material, o próprio consumismo. A relação de benefício das empresas
de dados com esse fenômeno é direta, pois seus balancetes financeiros dependem
do consumismo. Meta e Google, por exemplo, têm cerca de 90% de seus lucros
compostos pela renda dos anúncios (Gráfico 1), enquanto a Amazon se beneficia
diretamente do crescimento exponencial das vendas online (Gráfico 3).
Gráfico 1 – Participação das receitas derivadas de anúncios nos
rendimentos totais da Google e da Meta (2011-2021, em bilhões de US$)
Fonte: Elaboração própria com base em Statista (2022a, b, c, d).
O fenômeno do consumismo, segundo Schor e Holt (2011), possui duas
variantes: o velho consumismo e o novo consumismo. Tais definições possuem
recorte temporal e espacial. O velho consumismo é próprio do período pós-guerra
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e basicamente era a tentativa de acompanhar um estereótipo de família classe
média na quantidade de posses. Ou seja, buscar ter o mesmo, em termos materiais,
que os vizinhos, familiares, amigos ou famílias próximas conhecidas, o que já
havia sido antecipado por Thornstein Veblen no início do século XX. Já o novo
consumismo deve sua origem, por volta dos anos 1980, ao crescimento do acesso
à televisão (em especial) nas residências, o que muda (ou amplia) o grupo de
referência para o consumo.
Com o advento das empresas transnacionais de dados, tais definições devem
ser atualizadas. Um novíssimo consumismo, vinculado também à mudança do
grupo de referências possibilitado pelas redes sociais, que colocam o usuário em
uma posição de acesso a uma quantidade maior de personalidades e modismos.
Esse impulso dado ao ato de consumir pelas facilidades tecnológicas está atrelado
ainda a premissas norteadoras de concepção econômica individualista. Nessa
concepção do consumo, o bem público é pouco relevante. O estímulo ideológico
ao consumo privado desenfreado é parte crucial do modo como se estrutura a
ordem social contemporânea, em especial em termos de rotina. O trabalho é tanto
realizado durante mais tempo quanto é mais explorado, satisfazendo assim a
necessidade de ampliar o consumo privado e particular (necessidade estimulada
ainda pelas técnicas mencionadas). O assalariado precisa trabalhar mais horas
para ganhar um pouco a mais e honrar eventuais dívidas e necessidades de
consumo (ILO, 2022). E o capitalista pode explorar com maior intensidade a
mais-valia desse empregado na desigual relação de trabalho. Nessas condições,
os empresários têm justificativa até mesmo moral para poder explorar a força de
trabalho, dado que os próprios objetos da exploração estão alienados da noção
mais ampla de sua posição nesta relação e, assim, sentem que poder trabalhar
mais e ganhar mais, em termos absolutos, é uma vantagem. Essa descrição não
é exclusiva, mas certamente é própria (e foi exponenciada pelo) capitalismo de
plataforma contemporâneo. Esse fenômeno, também chamado de uberização,
plataformização, entre outros termos5, retirou ainda mais tempo do trabalhador.
A argumentação de Schor e Holt (2011) é herdeira da Escola de Frankfurt
e dos trabalhos dos anos 1960 e 1970 acerca da indústria cultural, através da
qual os empresários do meio monopolizavam a produção cultural, impondo
padrões e modelos para satisfazer seus interesses econômicos. Adorno (2002)
5 O fenômeno é abordado com diferentes termos na literatura, por vezes é atrelado à discussão sobre “prosumers”
(Chandler e Fuchs 2019; Muldoon 2022; Bolaño e Vieira 2014).
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identificava, assim como Veblen antes e Pierre Bourdieu depois, essa tendência
de replicar formas de existência das classes econômicas dominantes: “E assim
como a moral dos senhores era levada mais a sério pelos dominados do que
pelos próprios senhores, assim também as massas enganadas de hoje são mais
submissas ao mito do sucesso do que os próprios afortunados”. Atualmente, a
explosão das redes sociais, nas quais a exposição da vida privada projeta imagens
para outros grupos de referência, colabora para que o consumo competitivo
se transforme em uma disputa mais acessível. A possibilidade contínua de ter
acesso a exposições de modos de vida particulares (Williams, 2014) estimula
um padrão comportamental, reproduzindo uma lógica de consumo que só pode
ser emulada por subterfúgios (Bourdieu, 1983). Para destacar a importância de
fenômenos originários da dinâmica de funcionamento das empresas de dados na
reprodução da ideologia do consumismo e do próprio fenômeno em sua novíssima
configuração, alguns dados sobre acesso à internet são úteis e apresentados nos
gráficos 2 e 3.
Gráfico 2 – Acesso à internet (em % da pop. mundial – 2019)
100
90
80
70
60
50
40
30
20
10
-
28,6
54,6
44,5
72,8
82,5 76,7
África
Estados Árabes
Ásia e Pacífico
Common wealth (CIS
)
Europa
América
Fonte: Elaboração própria com base em União Internacional de Telecomunicações (ITU 2021). A Commonwealth
of Independent States (CIS) é uma das 6 regiões da UIT e abrange Armênia, Azerbaijão, Belarus, Cazaquistão,
Quirguizistão, Federação Russa, Tajiquistão, Turcomenistão e Uzbequistão.
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No mundo, havia, em 2019, cerca de 4 bilhões de pessoas com acesso à
internet, ou seja, 51% da população mundial (ITU 2021). Além disso, em apenas
13 anos (2005-2018), os países ricos ampliaram o acesso à internet de 51,3% de
suas populações para 80,9%. Parte deste contingente de usuários gastou $ 4,3
trilhões online em 2020:
Gráfico 3 – Vendas pela internet no mundo (2016 a 2020)
5
4,5
4
3,5
3
2,5
2
1,5
1
0,5
0
2016 2017 2018 2019 2020
2
2,43
2,93
3,46
4,29
Fonte: Elaboração própria com base em Young (2021). A linha pontilhada mostra a tendência linear
de crescimento.
Ou seja, o potencial de alcance de qualquer ideologia reproduzida através
desses meios é comparativamente muito maior do que foi anteriormente o do
rádio, o do telefone e o da televisão do novo consumismo. Assim, não se trata
mais apenas de uma personalidade do mundo do espetáculo que aparece na
televisão para ordenar “comprem”. É toda uma estrutura que funciona no sentido
de estimular as pessoas a comprarem cada vez mais, não importa o que isso
represente para a sociedade em termos de alienação e para o meio ambiente em
termos de recursos naturais. Mas há alternativa a este modo de vida particular?
Uma proposta contra-hegemônica a la Cox à ideologia
do consumismo em sua nova configuração digital
Ao identificar o poder transformador das ideias e ideologias, Worth e Kuhling
(2004) argumentam que autores como Hall e Laclau, ao analisarem Gramsci,
Ideologia do consumismo e dados digitais na ordem mundial contemporânea [...]
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não interpretam as relações de poder como articuladas por um conjunto fixo de
estruturas sociais, e sim por uma série de fatores culturais, sociais ou práticos
que, contudo, remetem a relações de produção. Dessa maneira, seria possível
confrontar a legitimidade de uma dada estrutura histórica através de um ataque
ideológico frontal e total ao poder hegemônico (guerra de movimento) ou,
alternativamente, através de avanços estratégicos e sutis, visando a contestar
o senso comum formado dentro de um bloco histórico, desestabilizando a
hegemonia ali presente (Worth e Kuhling 2004).
O objetivo da TC em RI é desafiar o poder material e ideológico instituído,
observando fraturas em uma dada configuração social específica, e como dessas
fraturas podem emergir novas possibilidades de emancipação humana. Para tanto,
Cox propôs um modelo analítico crítico, o das estruturas históricas. Estas são:
“(...) uma imagem de uma configuração particular de forças. Essa
configuração não determina ações de maneira mecânica direta, mas impõe
pressões e restrições. Indivíduos e grupos podem se mover com as pressões
ou resistir e se opor a elas, mas não podem ignorá-las. Na medida em que
resistem com sucesso a uma estrutura histórica predominante, eles reforçam
suas ações com uma configuração alternativa emergente de forças, uma
estrutura rival
6
” (Cox 1981, 97-98, grifo adicionado e tradução nossa)
Na Teoria Crítica, “particular” diz respeito tanto ao espaço quanto ao tempo.
Uma das principais constatações realizadas pelos seguidores desta abordagem
sobre as teorias problem-solving é sua a-historicidade. Isto é, o entendimento
implícito que carregam de que relações causais explicam situações sociais em
todo e qualquer momento da história. Apesar das críticas, a teoria de Cox se
mostra apropriada para entender a ordem social contemporânea. Um exemplo de
proposta crítica é proporcionada por Casier (2018). O autor utiliza as estruturas
históricas para oferecer um modelo aplicável a sua abordagem sobre hegemonia,
inserindo a taxonomia do poder de Barnett e Duvall (2005) às possibilidades
contra-hegemônicas da China e da Rússia em relação à estrutura histórica
estadunidense/ocidental.
6 “(...) a picture of a particular configuration of forces. This configuration does not determine actions in any
direct mechanical way, but imposes pressures and constraints. Individuals and groups may move with the
pressures or resist and oppose them, but they cannot ignore them. To the extent that they do successfully
resist a prevailing historical structure, they buttress their actions with an alternative, emerging configuration
of forces, a rival structure”
Stéfano Mariotto de Moura; Marcelo Milan
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Ou seja, as estruturas históricas investigadas têm uma temporalidade e são,
portanto, mutáveis. Este entendimento se adapta à estrutura histórica que sustenta
a dinâmica da ordem capitalista, e logo mundial, contemporânea, em muito
baseada no papel das empresas transnacionais de dados e nas novas tecnologias.
Ademais, o método analítico das estruturas históricas deve ser encarado como
um mecanismo heurístico que ignora deliberadamente parte da complexidade
real para facilitar a análise. Por exemplo, a Figura 1 apresenta a interpretação de
Casier sobre uma estrutura hegemônica na esfera econômica e uma possibilidade
contra-hegemônica chinesa a partir dos triângulos de Cox (1981):
Figura 1 – Estruturas hegemônica e contra-hegemônica de
Casier (2018) para a esfera econômica mundial
Material
capabilities
Ideas Institutions
Neo-liberalism
Normative
Free trade /Beijing
consensus
Non-interference
WB / IMF
position of
USD
AIIB
Foreign exchange
reserves &
RMB
US econ.
power
Chinese
econ. power /
Infrastructure
(OBOR)
Fonte: Casier (2018)
No que diz respeito ao foco do presente trabalho, propõe-se as seguintes
estruturas hegemônica e contra-hegemônica no que diz respeito ao consumismo
e sua ideologia (Figura 2).
Ideologia do consumismo e dados digitais na ordem mundial contemporânea [...]
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Figura 2 – Estruturas históricas hegemônica e contra-hegemônica
centradas no consumismo contemporâneo
Estrutura histórica hegemônica Estrutura histórica contra-hegemônica
Capacidades
materiais
Capital e
tecnologias
Ideias Instituições
Ideologia do
consumismo
Empresas
transnacionais
de dados
Capacidades
materiais
Capacidade
de produção
cultural
Ideologia da
sustentabilidade
Ideias Instituições
Mecanismos
de governança
global
Fonte: Elaboração própria, 2023
Os vértices da estrutura histórica, conectam-se uns aos outros como mostram
as figuras, reforçando-os de forma interligada. Assim, não há uma ordem nesse
recorte. No caso da estrutura hegemônica, as instituições estão representadas
pelas empresas transnacionais de dados que, com o capital e as tecnologias que
possuem (no âmbito das capacidades materiais) reproduzem a ideologia do
consumismo. Esta última, no âmbito das ideias, reforça os demais vértices da
estrutura hegemônica visualizada. Nesse sentido, elas foram destacadas para se
refletir sobre uma possibilidade contra-hegemônica que tenha como eixo o desafio
imposto pela forma contemporânea de geração, organização, disseminação e
utilização de dados. No caso da estrutura histórica contra-hegemônica, entende-
se que, em cada um dos três vértices propostos, há potenciais que podem ser
trabalhados, seja no plano da regulamentação estatal, negociação entre atores
globais (Estados, empresas e sociedade civil) e ainda formas de resistência civil
organizada, como já ocorre hoje, embrionariamente, com as atitudes, tanto
coletivas quanto individuais, pró-privacidade online. Estes elementos podem
ser elaborados e desenvolvidos da seguinte forma:
1) Ideologia da sustentabilidade (ideias): Reproduzir a ideologia da sustentabili-
dade permite enfrentar diretamente a ideologia do consumismo. Pode-se retomar
Trentmann (1998), que aponta como a ideologia do livre comércio, na passagem
do século XIX para o XX na Inglaterra, foi defendida não apenas pelas classes
dirigentes, como também pelo restante da sociedade civil, para pensar na
possibilidade de uma ideologia como a da sustentabilidade triunfar mesmo em
meio a uma sociedade que preza por ideários atualmente contrários, como o do
neoliberalismo. Afinal, Trentmann demonstrou como a aceitação da ideologia
Stéfano Mariotto de Moura; Marcelo Milan
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do livre comércio ocorreu em uma nação já desenvolvida em comparação com
as demais candidatas a potência da época. A Alemanha Imperial, por exemplo,
foi vendida pelos partidários do livre comércio como uma analogia do que o
protecionismo causava de mal às sociedades que o adotavam. Contudo, ao contrário
das imagens de alemães famintos vendidas pelos liberais, os germânicos vinham
se tornando progressivamente mais igualitários. Se não por meio do olhar da
cultura política, como explicar o “significado histórico especial do livre comércio
em uma sociedade que desfrutava do mais alto padrão de vida e superava a
escassez sistêmica de alimentos muito antes de seus vizinhos?7” (Trentmann
1998, 223, tradução nossa). Da mesma forma, a ideologia da sustentabilidade
pode ter alguma chance de triunfo.
Há uma base teórica de onde partir para defender algo como a ideologia
da sustentabilidade: a proposta decrescentista (D’alisa, Demaria e Kallis 2016;
Georgescu-Roegen 2012). Para os decrescentistas, por exemplo, o PIB não pode
ser o índice utilizado para medir o bem-estar, e sim outros, como o IDH, o que
confronta diretamente a dinâmica do consumismo. Nesse trajeto, é importante
manter permanente atenção para as armadilhas instrumentalistas do mercado,
como as que cooptaram resistências contra-hegemônicas tais como contra a
heteronormatividade e o machismo (não se discutindo o mérito das lutas em si).
2) Capacidade de produção cultural (capacidades materiais): beneficiando-
se da condição de quase monopólios globais em suas áreas de atuação na atual
dinâmica digital do capitalismo, as empresas de dados possuem uma imensa
riqueza (Interbrand 2021; (Moore e Tambini 2018). No entanto, esta riqueza
advém da concepção da informação como bem privado associada às tecnologias
em posse de tais empresas, que permitem-nas explorar essa informação para
reproduzir o ato de consumir e expandir, por consequência, a quantidade de
capital que possuem. Nesse sentido, propõe-se que, para transformar a estrutura
histórica vigente e enfrentar as capacidades materiais do sistema dependente
do consumismo, são necessárias discussões acerca da informação como bem
público de primeira geração. Assim, tem-se a dimensão do desafio imposto
pelas capacidades materiais da estrutura histórica mundial contemporânea, e
por isso se propõe que é somente com a criação desse entendimento político
que a riqueza poderia ser realocada para a constituição de uma esfera pública
7 “How to account for free trade’s special historical significance in a society which enjoyed the highest standard
of living and had overcome systemic food shortages long before its neighbours?”
Ideologia do consumismo e dados digitais na ordem mundial contemporânea [...]
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mundial, ou o que Vaidhyanathan (2011), chama de Projeto de Conhecimento
Humano. Esta contemplaria: uma infraestrutura legal que permita o fluxo barato do
conhecimento, superando questões sobre propriedade intelectual; preenchimento
do fosso digital entre ricos e pobres; um conjunto de protocolos e normas que
permita diferenciar conhecimento confiável de boatos. Também importantes
nesse mesmo sentido são iniciativas como o software livre (Simpson 2004) e
cooperativismo de plataforma (Digilabour 2022; Muldoon 2022).
3) Mecanismos efetivos de governança mundial (instituições): Implícita
neste eixo da estrutura contra-hegemônica proposta está a relação entre Estados
e empresas de dados. A discussão sobre a governança da internet (Pires 2008;
2012) ocorre hoje em fóruns especializados, como IGF ou o NETMundial. Porém,
tais fóruns são dominados pelo mainstream hegemônico estatal ocidental (Pires
2012), o que inclui também as empresas transnacionais de dados. China e Rússia,
por exemplo, buscam, com medidas de soberania estatal, regular a internet em
seus territórios, diferenciando-se das demais nações ocidentais, que utilizam
as mesmas redes controladas pelos Estados Unidos e se submetem ao modelo
multistakeholder de governança da internet sob a mesa da Internet Corporation
for Assigned Names and Numbers (Icann).
Esse modelo consiste em uma mesa de negociações que reivindica equiparar
Estados, empresas e entidades civis. Em teoria, um modelo razoável. Porém,
conforme descrito por Chenou e Fuerte (2019), o fato de Estados não terem
pesos superiores a empresas e entidades civis na mesa enfraquece ainda mais
aquelas instituições já fragilizadas por sua posição econômica, política e social.
O multitakeholdismo, conforme é mencionado eventualmente (Mueller 2010),
inclusive com carga pejorativa (Pires 2014), é resultado de um processo histórico
que, no Ocidente, começou durante a Guerra Fria e culminou na internet comercial
atual (Pires 2008; 2012).
Tal e qual no advento da internet, também hoje o Estado é muitas vezes
parceiro das empresas transnacionais de dados que monopolizam o mercado
global. Isso ocorre por diferentes motivos: falta de recursos para criar e manter
os serviços que tais empresas oferecem “gratuitamente”, mas também relações
intrínsecas ao frágil modelo representativo da democracia ocidental – leia-se,
lobbies nos Parlamentos europeu e estadunidense. Grosso modo, é dessa dinâmica
que decorre a falta de interesse, evidente ou disfarçada, em regular de fato a
atividade dessas empresas, em que pese outras iniciativas importantes (além
das regulações severas a lá China e Rússia) como a General Data Protection
Stéfano Mariotto de Moura; Marcelo Milan
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Regulation (GDPR) europeia. Para os Estados alegadamente “falidos” resultantes
do triunfo do neoliberalismo após o Choque Nixon, aproveitar-se da estrutura do
capitalismo de vigilância (Zuboff 2018) facilita o cumprimento de suas funções
básicas, notadamente a intensa securitização da sociedade independentemente
das populações atingidas por algoritmos, muitas vezes, estruturalmente racistas.
Além disso, o convite ao uso de soluções tecnológicas para problemas sociais e
políticos, o que Morozov (2018) denomina “solucionismo tecnológico” é tentador
para políticos sedentos de poder. Por fim, as empresas de dados estão situadas
em espécies de fissuras institucionais do sistema regulatório. Através dessa “face
de Janus” (Atal 2020), elas conseguem driblar o sistema legal. Um exemplo:
podem alegar serem empresas sediadas em território de determinado país e que,
portanto, não poderiam ser taxadas por outros países.
Dessa maneira, entende-se que é necessária a construção de fóruns alternativos
da sociedade civil, nos moldes do contraponto apresentado pelo Fórum Social
Mundial ao Fórum Econômico Mundial (Gonçalves 2005), para dar alternativas
democráticas às demandas de construção de uma nova estrutura de governança da
internet que tenha foco em um mundo baseado na ideologia da sustentabilidade,
e não do consumismo; na capacidade de produção cultural tanto quanto nas
capacidades de produção material; e em uma internet que não se possa chamar
apenas de mercado de dados, mas sim num espaço livre de informação pública.
Em 2014, a iniciativa da então presidenta do Brasil, Dilma Rousseff, de criação
do fórum NetMundial foi esvaziada por um movimento político norte-americano
em relação à gestão da Icann (Taylor 2014). Esse tipo de iniciativa, portanto,
tem poder, dado que mobilizou o aparato diplomático da maior potência do
capitalismo global ao longo dos últimos cem anos.
A economia política dos dados pode ser reconfigurada. Reformas contra-
hegemônicas podem ser empreendidas, pois os recursos estão disponíveis para
serem mobilizados. O advento da China como possível nova principal potência
global somado à estratégia da Nova Rota da Seda, que envolve tanto a construção
de nova infraestrutura para tecnologias (Agbebi 2022; Paulo 2018; Shen 2018)
quanto o China Standards 2035, com pretensão de refazer os padrões de uso
para tecnologias vindouras, são ativos que podem se mobilizados em uma
configuração contra-hegemônica que envolva países fora do eixo da internet
ocidental. As disputas entre EUA e China em torno da tecnologia 5G (Gonzalo e
Haro Sly 2022; Marzinotto Jr., 2021; Majerowicz 2020) dão conta da força que o
país asiático tem em termos tecnológicos, sendo que demais países dos BRICS
Ideologia do consumismo e dados digitais na ordem mundial contemporânea [...]
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também têm potenciais contra-hegemônicos a oferecerem. A Rússia, além de
sua força política, possui reconhecido know-how tecnológico (Coursera 2021).
A Índia também (Moinuddin 2021; Thorat 2019; Parayil 2016), além de possuir
uma população enorme, que se traduz em potencial de usuários para a internet
global e, em consequência, em ativo político indiano. O Brasil também possui
população relevante a nível global, além de uma história política em termos
do caso de espionagem e as ações tomadas (como o Netmundial) que pode
ser mobilizado como ativo político; ademais, possui ainda grandes reservas de
matéria-prima necessárias às novas tecnologias (bauxita/alumínio, lítio, nióbio).
Considerações finais
O presente trabalho problematizou a insuficiência da dimensão cultural da
EPI em termos do tratamento dado às ideologias. O campo precisa avançar no
sentido de aprofundar a importância deste fenômeno para a cultura no âmbito das
RI. Em particular, a ideologia do consumismo representa um importante desafio
na compreensão da ordem mundial capitalista, principalmente pela atuação das
empresas transnacionais de dados com força institucional central. Procedeu-se
assim à identificação de uma estrutura hegemônica contemporânea, a qual se
nutre, por meio da ideologia, da falta de elucidação acerca das práticas que
possibilitam a reprodução indiscriminada do consumismo através das tecnologias
da informação e comunicação. A apresentação dos debates sobre cultura, ideologia
e consumo permitiu uma análise que selecionou alguns processos do passado para
ilustrar elementos materiais e ideologias da estrutura histórica contemporânea.
Assim, lógicas de disseminação ideológica de interesses burgueses do passado
encontram paralelo com dinâmicas contemporâneas potencializadas pelas novas
tecnologias.
Argumentou-se que o entrelaçamento entre o uso dos dados digitais pelas
empresas do setor e a ideologia do consumismo confere a esta última papel central
na ordem mundial contemporânea, naturalizando o ato de consumir através do
anúncio, o qual está potencializado, em sua forma, pelas empresas transnacionais
de dados através da captação de informações pelas novas tecnologias, permitindo
absorver a produção massiva dada pelas capacidades materiais capitalistas.
O artigo defendeu como, na ordem mundial contemporânea, as empresas de dados
lograram individualizar, no que foram sustentadas por uma série de mecanismos
Stéfano Mariotto de Moura; Marcelo Milan
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tecnológicos, seus anúncios, o que permite um alcance muito mais efetivo dos
interesses potenciais de consumo por parte dos usuários, além de uma presença
constante no cotidiano dos mesmos, ao contrário da lógica capitalista de anúncios
de massa vinculada à publicidade do século XX. Essa personalização facilita a
naturalização do consumo, objetivo da ideologia do consumismo.
A partir de uma crítica às implicações desta configuração específica da
ordem mundial contemporânea, o trabalho propôs, na linha da Teoria Crítica
e através do modelo das estruturas históricas de Cox, uma estrutura histórica
contra-hegemônica à construção hegemônica contemporânea, centrada no
consumismo. Esta estrutura alternativa está baseada na capacidade material de
produção cultural, na ideologia da sustentabilidade ambiental no vértice ideacional
e na governança democrática da tecnologia enquanto elemento institucional do
triângulo de Cox.
Por fim, sobre a estrutura contra-hegemônica proposta, são necessárias
pesquisas adicionais, em especial no que diz respeito às forças institucionais,
principalmente sobre como formatar fóruns cujas orientações tenham validade na
orientação da política internacional e que possam prescindir das potências atuais
da internet, sejam estas Estados, como os Estados Unidos, ou empresas como
as aqui discutidas. No âmbito das ideias, a proposta de vincular a abordagem
“decrescentista” à ideologia da sustentabilidade para se contrapor a ideologia do
consumismo precisa de maior fundamentação teórica do ponto de vista da EPI.
E a articulação desta visão com a produção cultural enquanto força produtiva
material é igualmente necessária, dada a capacidade da cultura em proporcionar
satisfação de necessidades com menos impacto ambiental.
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