Felipe Lira Paiva; Rafael Mesquita
Rev. Carta Inter., Belo Horizonte, v. 17, n. 1, e1223, 2022
1-28
Liderando do meio? Dimensionando a
liderança das potências intermediárias
nas organizações internacionais
(1975-2017)
Leading from the middle? Gauging
the leadership of middle powers in
international organizations
(1975-2017)
Liderando desde el medio? Dimensionando
el liderazgo de las potencias intermedias
zen las organizaciones internacionales
(1975-2017)
10.21530/ci.v17n1.2022.1223
Felipe Lira Paiva*
Rafael Mesquita**
Resumo
As últimas décadas testemunharam a ascensão de novos atores
intermediários no sistema internacional, como as potências
regionais. Dentre as características atribuídas a elas, está a
preferência por arenas multilaterais e a busca por proeminência
nelas. Assim, convém investigar se a autoridade em tais instituições
acompanhou a redistribuição de poder mundial. Este artigo busca
responder a essa pergunta utilizando dados do IO BIO Project e do
Word Power Index e estatística descritiva. Os dados indicam que o
ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE
RELAÇÕES INTERNACIONAIS
ISSN 2526-9038
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que o autor e a fonte
originais sejam creditados.
* Mestrando e bacharel em Ciência Política pela Universidade Federal de Pernambuco.
(felipelirapaiva@gmail.com), ORCID: https://orcid.org/0000-0002-7878-4576.
** Doutor em Ciência Política pelo PPGCP- Universidade Federal de Pernambuco.
É professor adjunto no Departamento de Ciência Política da UFPE. (rafael.
mslima@ufpe.br), ORCID: https://orcid.org/0000-0001-6042-1606.
Artigo submetido em08/09/2021 e aprovado em 11/04/2022.
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imediato pós-Guerra Fria foi marcado por menor atuação dos intermediários nas instituições
multilaterais, enquanto a crise financeira de 2008 inaugurou uma maior participação desse
grupo.
Palavras-chave: Potências Intermediárias; Potências Regionais; Organizações Internacionais;
Liderança.
Abstract
The last decades witnessed the rise of new intermediate powers, such as regional powers,
in the international system. Preference for multilateral arenas and a search for primacy
within them are characteristics associated with these states. Therefore, it is worthwhile to
investigate if leadership in these institutions followed the redistribution of world power.
This article aims to answer this question through datasets from the IO-BIO Project and the
World Power Index, along with descriptive statistics. Results show that, while the early
post-Cold War was marked by the low performance of intermediate powers, the post-2008
financial crisis witnessed an increase in their participation.
Keywords: Middle Powers; Regional Powers; International Organizations; Leadership.
Resumen
Las últimas décadas testificaron el ascenso de nuevas potencias intermedias en el sistema
internacional, como las potencias regionales. La preferencia por arenas multilaterales y la
búsqueda por prominencia en ellas son características atribuidas a esos actores. Por lo tanto,
vale la pena investigar si la autoridad en tales instituciones ha acompañado la redistribución
del poder mundial. Este artículo propone responder a esta pregunta utilizándose de datos
del IO-BIO Project, del World Power Index y la estadística descriptiva. Los resultados
indican que, mientras el inmediato Pos-Guerra Fría fue marcado por menor desempeño de
los intermedios, la crisis financiera de 2008 inaugura mayor participación de ellos.
Palabras clave: Potencias Intermedias; Potencias Regionales; Organizaciones Internacionales;
Liderazgo.
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Introdução1
As potências intermediárias aumentaram sua liderança nas Organizações
Internacionais (OIs) após o fim da Guerra Fria? Parte da literatura enfatiza o papel
das instituições multilaterais como arenas privilegiadas para as quais tais países
canalizam seus esforços, tanto por permitirem maior influência diplomática,
mesmo para países de capacidades modestas, quanto por viabilizarem uma
ordem mais previsível e institucionalizada — resultado igualmente desejável para
países sem superávits de poder. Quanto ao pós-Guerra Fria, a literatura assinala
desenvolvimentos que poderiam desencadear tanto um maior protagonismo
quanto um retraimento desses atores medianos na governança global.
Diante dessa ambiguidade, o objetivo desta pesquisa é descrever o número
de potências intermediárias, tanto clássicas quanto emergentes, que ocuparam o
cargo máximo de OIs entre 1975-2017, averiguando a proposição da literatura de
se os intermediários aumentaram ou não seu protagonismo no pós-Guerra Fria. Os
resultados sugerem que, ao invés de maximizarem sua liderança no pós-Guerra
Fria, eles tenderam a perder espaço para as potências mundiais. Apenas nas
últimas duas décadas vê-se um declínio das potências globais e uma retomada
do protagonismo dos intermediários, com novas oscilações de 2010 em diante.
Este artigo dialoga frontalmente com Valente, Lopes e Oliveira (2019), que
observaram qual país presidiu cada OI global entre 1945-2016 e, tendo em
conta que o número de OIs cresceu de 6 (1945) para 37 (2016), propuseram
um índice de concentração como forma de comparar os valores por ano. Os
autores encontram alguns períodos de maior concentração de OIs em poucos
países líderes (1945-1957, 1978-1997, 2010-2016) e outros de desconcentração
(1958-1977, 1998-2009). Embora o presente artigo difira em recorte temporal e
no agrupamento nãogeográfico dos países, alguns resultados convergem. Por
exemplo, o período de concentração de 2010-2016 é chamado, pelos autores,
de “concentração desconcentrada”, pois, apesar do alto índice de concentração
duplicar, é o período com mais países (8) liderando mais que 5% dos casos
e, também, de destaque de países africanos e asiáticos — em especial, como
apontaremos na seção de resultados, Quênia e China. Semelhantemente, os
autores frisam a importância dos BRICS após a crise financeira de 2008 — aspecto
corroborado por nossa comparação entre potências emergentes e middle powers.
1 Os autores agradecem ao prof. Dawisson Belém Lopes por seus comentários, bem como aos pareceristas
anônimos da Carta Internacional.
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Este artigo está organizado da seguinte forma: a próxima seção discute
como definir potências intermediárias teoricamente, a importância das OIs em
sua política externa, e expectativas da literatura quanto à sua liderança nesses
espaços. A seção subsequente lida com os aspectos metodológicos, os critérios
de classificação utilizados e outros dados empregados. Em seguida, os resultados
são apresentados e discutidos. Por fim, são feitas as considerações finais e os
apontamentos para futuras agendas de pesquisa.
Potências intermediárias e instituições internacionais
Potências intermediárias e sua classificação
As potências intermediárias não são novidade no sistema internacional (SI).
Giovanni Botero e Abbé de Mably ainda nos séculos XVI e XVIII já se debruçavam
sobre uma divisão tripartite do SI e sobre o comportamento dos intermediários
(Wight 2002). O interesse acadêmico nos países médios não foi, entretanto,
constante. Holbraad (1984) aponta os anos 1960 como marco das discussões
modernas do tema. Desde então, proliferaram tipologias definindo quem são
os intermediários e quais suas características. Estudos buscando sintetizar as
diferentes formas de se caracterizar uma potência intermediária identificaram
entre quatro e seis esquemas teóricos concorrentes sobre quem são esses Estados.2
Keohane (1969) ofereceu uma das definições mais longevas, defendendo
quatro níveis de Estados em relação à sua capacidade em afetar o SI: grandes
potências (determinam o SI), secundárias (influenciam), intermediárias (afetam)
e pequenas (não afetam).
Esforços subsequentes usaram tanto a divisão em quatro níveis (Valencia e
Ruvalcaba 2014) quanto em três (Neack 1993). Uma solução intermediária proposta
por Holbraad (1984) adiciona às potências grandes, intermediárias e pequenas
um subgrupo chamado “potências intermediárias superiores”, no qual ele incluiu
Alemanha, China, França, Japão e Reino Unido. Em comum, essas taxonomias
tomam como ponto de partida aspectos materiais e relativos à capacidade dos
países na hierarquia internacional de poder. Tais autores buscam dessa forma
2 Cooper, Higgott e Nossal (1993) resumem quatro definições para middle powers: posicional, geográfica, normativa
e comportamental. Secches, Vadell e Ramos (2020), inspirados em sínteses anteriores, propõem seis categorias:
funcional, comportamental, sistêmico-estrutural, comportamental-estrutural, inserção regional e crítica.
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oferecer uma classificação menos idiossincrática e mais objetiva, calcada em
indicadores clássicos como PIB. A opção traz consequências analíticas, visto
que, assim, agrupam-se em um mesmo nível mediano de capacidades materiais
países muito dessemelhantes em sua conduta externa, como o Canadá e a Índia.
De fato, essa diversidade no estrato intermediário do SI foi posta em realce
com a ascensão das chamadas potências emergentes no pós-Guerra Fria (Paes,
Cunha e Fonseca 2017; Schoeman 2000; Jordaan 2017; Prys 2010). Após a era
bipolar, para Valencia e Ruvalcaba (2014, 9, tradução nossa), “Estados situados na
área do capitalismo periférico e semidesenvolvido aumentaram suas capacidades
materiais e começaram a desenvolver projeções geopolíticas e geoeconômicas
de alcance regional e — de forma incipiente — global”.
O alargamento da classe de atores medianos estimulou esclarecimentos
conceituais para melhor diferenciar entre os intermediários. Tipicamente,
identificam-se como potências intermediárias tradicionais ou middle powers as
democracias industrializadas do Norte. O rótulo é aplicado, desde o pós-Segunda
Guerra, a países como Austrália, Canadá e aos países nórdicos por acadêmicos e
estadistas, visando a assinalar um perfil peculiar. Atributos destacados incluem:
inclinação cooperativa vis-à-vis à ordem liberal, o que habitualmente torna os
middle powers pró-status quo — conquanto alguns deles creiam introduzir um
elemento de moderação ao great power politics; especialização diplomática
como forma de majorar sua relevância internacional (diplomacia de nicho); e
cultivo da institucionalidade e do multilateralismo (Cooper 1997; Henrikson
1997; Hurrell 2000).
Embora alguns autores tentassem aproximar da categoria de middle powers
os países subdesenvolvidos de maior destaque (e.g. Cooper 1997), a tendência
recente tem sido enfatizar a distintividade analítica entre medianos desenvolvidos
e emergentes do Sul Global (Jordaan 2017). Assim, as potências emergentes, em
alguns casos também classificadas como potências regionais, denotam o grupo
nucleado nos BRICS e extensivo a outros Estados semelhantes, partilhando de
atributos como uma ascensão econômica tardia, sociedades mais desiguais e
menos democráticas, maior insatisfação com a ordem liberal e desejo de reformá-
la de maneira a refletir sua crescente influência (Jordaan 2017; Nolte 2010; Prys
2010; Destradi 2010; Valencia e Ruvalcaba 2014).
Em que pesem as diferenças entre medianos novos e antigos, o apreço de
ambas as gerações por arenas multilaterais parece oferecer um ponto de comunhão
em seu comportamento externo, como exploramos a seguir.
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A importância das organizações internacionais na política externa das
potências intermediárias
Quais os meios pelos quais os Estados medianos preferem agir no SI?
A literatura sugere que organizações multilaterais são um habitat propício para
atores desse porte.
Hurrell (2000) defende que as potências intermediárias agem por meio
de instituições internacionais, pois elas (1) empoderam os intermediários ao
reduzirem a margem de atuação das grandes potências; (2) possibilitam a criação
de coalizões para defesa de interesses comuns; e (3) dão oportunidades (voice
opportunities) para suas demandas serem conhecidas.
Com respeito ao primeiro ponto, enquanto na época bipolar instituições
globais achavam-se paralisadas devido à rivalidade entre os blocos capitalista e
comunista, o momento unipolar desbloqueou as arenas multilaterais.
Apesar da diferença entre middle powers tradicionais e potências emergentes
quanto à satisfação com a liderança estadunidense (Jordaan 2017), a posição
estrutural de ambas as torna igualmente desejosas de um SI previsível e formalizado.
Mais do que uma visão ou projeto particular, potências médias apreciam a ordem
(Cox 1996). Como resume Holbraad (1984, 209, tradução nossa):
Sendo mais fracas e mais expostas que grandes potências, elas são menos
capazes de sobrepor-se à lei ao lidar com outros Estados e são mais dependentes
de um sistema de regras e convenções protetoras dos direitos soberanos dos
Estados. Sendo mais ricas e menos dependentes de outros que a maioria dos
Estados pequenos, elas têm mais a perder de um estado de anomia internacional
e talvez mais a ganhar de um grau de organização internacional.
Organizações permitem a formação de coalizões, que, como sugeriu Keohane
(1969), serão tanto mais necessárias para um grupo de Estados quanto maior
for a fraqueza destes em impactar o sistema sozinhos. Essa é a situação dos
intermediários, que frequentemente privilegiam a ação concertada ao invés da
unilateral (Henrikson 1997).
Ademais, as instituições explicam como as normas são difundidas e como
o interesse dos Estados muda ao longo do tempo (Hurrell 2000). Em razão da
sociedade internacional ter, hoje, objetivos mais ambiciosos, abre-se espaço para
a agência dos intermediários. A maior adoção de normas, por sua vez, ocorre
porque os intermediários aliam-se às grandes potências — que estão interessadas
no cumprimento de normas.
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Por fim, OIs concedem oportunidades de voz mais equânimes, abrindo
outro canal por meio do qual intermediários aumentam sua influência e seu
status para além dos seus recursos modestos. Esse palanque é valioso tanto
para middle powers, que buscam demonstrar expertise em nichos diplomáticos
(Cooper 1997), quanto para potências regionais, que pretendem agir em fóruns
globais como porta-vozes de suas regiões (Mesquita e Seabra 2020).
A relevância das instituições para os intermediários justifica, portanto, a
investigação da atuação destes nas OIs. Uma das facetas privilegiadas pela literatura
sobre organizações diz respeito à sua liderança. Intermediários teriam incentivos
a tentar ocupar a presidência de tais entidades pelos ganhos de influência e de
status. Encontramos na literatura estudos de caso qualitativos acompanhando os
esforços de potências regionais em assegurar seguidores para suas campanhas
por liderança de órgãos multilaterais (Schirm 2010; Malamud 2011). Já na tradição
quantitativa, Valente, Lopes e Oliveira (2019) analisaram os cargos máximos
de 37 OIs entre 1945 e 2016, detectando, como exposto previamente, períodos
de concentração e desconcentração. Os autores, entretanto, não fizeram uma
discussão acerca dos intermediários.
A contribuição deste trabalho é, portanto, estender a análise ao incluir os
países medianos. Afinal, as potências intermediárias aumentaram sua participação
nas OIs, sobretudo após o fim da Guerra Fria?
O debate sobre o protagonismo dos intermediários ao final da Guerra Fria
O desfecho do conflito bipolar motivou prognósticos diversos sobre o futuro
da liderança global, de forma geral, e sobre o papel dos intermediários, em
específico. Alguns autores defendiam que a globalização inaugurava uma era
qualitativamente diferente no SI. Quatro novas circunstâncias, em especial, criavam
um ambiente habilitador para o protagonismo dos intermediários. Primeiramente,
o fim da tensão bipolar relaxava o SI e acomodava maior empreendedorismo.
Concomitantemente, sem a ameaça soviética, a política externa dos EUA poderia
perder coesão, gerando um vácuo de liderança — o qual outras potências reputadas
à época, Alemanha e Japão, teriam demasiada cautela em ocupar. Segundo, a
interdependência e a globalização eclipsavam fontes clássicas de poder soberano
de modo que a influência de um país já não seria função de seu lugar na
hierarquia de hard power. Terceiro, a agenda do SI se tornava mais complexa e
ambiciosa, tornando indispensável a contribuição e a expertise dos middle powers.
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Por fim, com a vitória do liberalismo, satélites soviéticos ao Leste e economias
autárquicas ao Sul buscavam participar ativamente das organizações liberais
tanto para reverter suas credenciais quanto para lock-in de reformas domésticas
(Cooper 1997; Higgot 1997; Henrikson 1997). A agenda sobre regionalismo de
então também sugeria maior autoridade residual para as potências regionais
(Fawcett e Hurrell 1995).
Em contraponto, outros acreditavam que a unipolaridade consolidaria a
primazia dos EUA e das grandes potências em lugar dos medianos. O conflito
entre Leste e Oeste oferecera aos intermediários oportunidades de mediação
e protagonismo criativo. Agora já sem oponentes, os EUA poderiam moldar
a nova ordem sem muita adversidade, quer pelo enorme gap de poder, quer
pelo caráter democrático e guiado por normas de sua agenda (David e Roussell
1996/7; Ikenberry 2017).
A chamada “Nova Ordem Mundial” dos anos 1990 chega a um ponto de
inflexão, segundo Pape (2005), com os ataques do 11/9. Se, até então, a hegemonia
dos EUA era aceita mais benignamente, o unilateralismo da Guerra Terror desperta
receio nos Estados mais fracos. Mesmo antes dos atentados, potências do Sul
Global manifestavam insatisfações após as instabilidades financeiras do final dos
anos 1990 (Mielniczuk 2013). As OIs tornam-se então canais para soft balancing
contra Washington.
Por fim, a literatura aponta 2008 como outro ponto de inflexão. Com a crise
financeira, as potências globais reconhecem a necessidade de incluir atores
medianos na governança global, como exemplificado pela ascensão do G20
(Lima 2018, 56; Paes, Cunha e Fonseca 2017; Valente, Lopes e Oliveira 2019).
Em síntese, para parte da literatura, o imediato pós-Guerra Fria deveria ser
um momento de menor asserção das grandes potências e maior protagonismo
dos medianos nas arenas globais. Para outros, os medianos se destacariam na
Guerra Fria, mas, nos anos 1990, se retrairiam em favor das potências globais.
Nos anos 2000, possivelmente haveria declínio das grandes potências e ainda
mais de 2008 em diante. Para verificar se tal padrão materializou-se, nos tornamos
à análise de papéis de liderança em OIs.
Dados e metodologia
Este artigo é essencialmente descritivo. Os dados foram analisados com
o auxílio do software R. Seguindo os padrões de replicabilidade (King 1995) e
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transparência, as bases de dados e o script estão disponibilizados no GitHub.3 Esta
seção divide-se em duas. Na primeira, discutiremos os critérios de seleção das
OIs. Na segunda, abordaremos os parâmetros para a classificação das potências.
Selecionando as organizações internacionais
Valente, Lopes e Oliveira (2019) analisaram o período de 1945-2016. Aqui,
analisamos 1975-2017. O recorte justifica-se devido à limitação temporal do Word
Power Index, mas também pelo fato do processo de descolonização já estar em
encerramento no momento, de modo que nos anos 1970 já existem como unidades
soberanas muitos dos países que consideramos na análise. O intervalo abarca
outros momentos de inflexão no SI, como o fim da Guerra Fria, os atentados
de 11 de setembro e a crise financeira de 2008. Ao todo, foram coletados 1.375
casos, sendo a maioria retirada do Biographical Dictionary of Secretaries-General
of International Organizations (IO BIO)4; e para os casos omissos e o ano de
2017, consultou-se o website de cada OI. Cada caso corresponde a um país que
ocupou o cargo máximo da organização em um dado ano.
Os parâmetros de classificação seguiram Valente, Lopes e Oliveira (2019).
Assim como eles fizeram, optou-se por excluir os interinos. Cada caso consiste
em um só país-ano e, havendo dupla nacionalidade, escolheu-se o país onde
o secretário fez a maior parte da sua carreira. Os autores contaram o primeiro
ano de mandato e excluíram o último. Essa mesma estratégia foi adotada em
eleições no meio do ano. Nos casos em que os secretários deixaram o cargo em
31 de dezembro, optou-se por contar, também, o último ano.
Os critérios utilizados para a seleção das OIs seguiram Valente, Lopes e Oliveira
(2019): (a) cem ou mais países membros; e (b) membresia distribuída entre 3
ou mais grupos regionais da ONU. Dessa forma, as organizações são as mesmas
utilizadas pelos autores, totalizando 37 OIs. Algumas OIs mudaram de nome ao
longo da série. Para não superestimá-las, contou-se cada entidade apenas uma
vez — mesmo com mudança de nome. Por fim, destacamos que a população de
OIs aderindo a nossos critérios cresceu ao longo do período estudado: em 1975,
havia 27 OIs e, em 2017, 37. O Quadro 1 apresenta as OIs analisadas.
3 Dados e scripts para replicação disponíveis em <https://github.com/felipelirapaiva/PISI>. Acesso em: 28 mar. 22.
4 Disponível em <ru.nl/politicologie/io-bio/io-bio-biographical-dictionary-sgs-ios/>. Acesso em: 07 dez. 2021.
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Quadro 1 — Organizações Internacionais (sigla em inglês)
Organização das Nações Unidas para a
Alimentação e Agricultura (FAO)
Conferência das Nações Unidas sobre Comércio
e Desenvolvimento (UNCTAD)
Acordo Geral de Tarifas e Comércio /
Organização Mundial do Comércio (GATT /
WTO)
Programa das Nações Unidas para o
Desenvolvimento (UNDP)
União Interparlamentar (IPU) Organização das Nações Unidas para a
Educação, a Ciência e a Cultura (UNESCO)
Painel Intergovernamental sobre Mudanças
Climáticas (IPCC)
Entidade das Nações Unidas para a Igualdade
de Gênero e o Empoderamento das Mulheres
(UNWOMEN)
Agência Internacional de Energia Atômica
(IAEA)
Programa das Nações Unidas para o Meio
Ambiente (UNEP)
Organização da Aviação Civil Internacional
(ICAO)
Altocomissariado das Nações Unidas para os
Refugiados (UNHCR)
Fundo Internacional de Desenvolvimento
Agrícola (IFAD)
Programa das Nações Unidas para os
Assentamentos Humanos (UNHABITAT)
Organização Internacional do Trabalho (ILO) Organização das Nações Unidas para o
Desenvolvimento Industrial (UNIDO)
Organização Consultiva Marítima
Intergovernamental / Organização Marítima
Internacional (IMCO / IMO)
Escritório das Nações Unidas sobre Drogas e
Crime (UNODC)
Fundo Monetário Internacional (IMF) Fundo de População das Nações Unidas
(UNFPA)
Organização Internacional para as Migrações
(IOM) União Postal Universal (UPU)
Agência Internacional para as Energias
Renováveis (IRENA) Banco Mundial (IBRD)
Autoridade Internacional dos Fundos Marinhos
(ISA) Organização Mundial das Alfândegas (WCO)
Organização Internacional de
Telecomunicações por Satélite (ITSO) Programa Alimentar Mundial (WFP)
União Internacional de Telecomunicações (ITU) Organização Mundial da Saúde (WHO)
Escritório do Alto Comissário das Nações
Unidas para os Direitos Humanos (OHCHR)
Organização Mundial da Propriedade
Intelectual (WIPO)
Organização para a Proibição de Armas
Químicas (OPCW) Organização Meteorológica Mundial (WMO)
Organização das Nações Unidas (UN) Organização Mundial de Turismo (UNWTO)
Fundo das Nações Unidas para a Infância
(UNICEF)
Fonte: adaptado de Valente, Lopes e Oliveira (2019).
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Classificando as potências
A literatura coleciona diversos indicadores para estratificação internacional.
Holbraad (1984) utilizou o Produto Nacional Bruto (PNB) e selecionou, em cada
continente, quais seriam as potências intermediárias — o que significa que o
valor demarcando os intermediários variou de acordo com a região. Neack (1993)
utilizou população, gasto militar, PNB, taxa de alfabetização e mortalidade
infantil em análises de cluster, abrangendo 1945-1979.
Keohane (1969) conectou capacidades materiais e comportamento. Para ele,
estão interligadas: a capacidade do país de influenciar — e de ser influenciado
— pelo SI e as atitudes e percepções do chefe de Estado. Outros autores
também focam no comportamento, como a atuação por meio de instituições
(Hurrell 2000) e a diplomacia de nicho (Cooper 1997).
Frente a essa multiplicidade de critérios, como classificar as potências?
Ruvalcaba (2019) calculou e disponibilizou o World Power Index (WPI), que
combina hard e soft power, sendo composto por 3 índices: um Índice de
Capacidades Materiais, um Índice de Capacidades Imateriais e um Índice de
Capacidades Semimateriais. O primeiro é composto por: PIB, extensão territorial,
defesa, comércio internacional, finanças e pesquisa e desenvolvimento. O segundo:
gasto governamental, apelo turístico, ajuda externa, linhas telefônicas, influência
acadêmica e cosmopolitismo. O terceiro: população, consumo, energia, educação
e saúde.
Os dados cobrem o período de 1975-2017 para 177 países. Os escores variam
entre 169 (Serra Leoa, em 1999) e 965 (EUA, em 1997, 1999 e 2000). Para
classificar os países entre potências “mundiais”, “intermediárias” e “menores”,
adotamos dois limiares: 820 (separando mundiais e intermediárias) e 600 (entre
intermediárias e menores). O principal critério para a escolha desses valores foi
a aderência à literatura. Ou seja, estes limites permitem que um maior número
de países pertença à classificação esperada pela literatura.
A literatura revisada tende a convergir indicando, para cada grupo, alguns
casos cuja classificação é incontroversa, por exemplo, a presença do Reino Unido
dentre as potências mundiais, ou ainda Canadá e Turquia como intermediárias.
Ao escolhermos o limiar de 820, o Reino Unido é classificado como mundial na
maior parte do período entre 1975-2017, enquanto o Canadá, como intermediário.
No limiar inferior, a Turquia pertence aos intermediários durante quase toda a
série. Após sucessivos ajustes nos limiares, buscando maximizar o encaixe para
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esses e outros países incontestes, os valores atuais foram escolhidos. Os grupos
resultantes constam no Quadro 2.
Quadro 2 — Classificação das potências que lideraram ao menos uma OI
entre 1975-2017
Classificação País
Potências mundiais Alemanha, Estados Unidos, França, Japão, Reino Unido*.
Potências
intermediárias
África do Sul, Arábia Saudita, Argentina, Austrália, Áustria, Bélgica,
Brasil, Canadá*, China*, Coreia do Sul*, Dinamarca, Espanha, Finlândia,
Grécia, Holanda, Índia, Irã*, Irlanda*, Itália*, Kuwait*, México, Nova
Zelândia, Portugal*, Rússia*, Suécia, Suíça, Turquia*.
Potências menores
Argélia, Bulgária, Camarões, Chile*, Egito, El Salvador, Equador, Etiópia,
Fiji, Filipinas, Gana, Jordânia, Líbano, Mali, Marrocos, Nigéria, Noruega,
Panamá, Paquistão, Peru, Quênia, Senegal, Serra Leoa, Sri Lanka, Sudão,
Tailândia*, Tanzânia, Togo, Tunísia, Uganda.
Fonte: elaborado pelos autores a partir do WPI. Países com (*) oscilaram entre categorias.
Sendo os limiares fixos, mas os países livres para aumentarem ou diminuírem
seu WPI com o passar dos anos, segue-se que, ao longo da série, alguns migram
entre categorias. Esses casos estão reunidos na Figura 1. Em sua maioria, são
países que orbitam em torno do limiar ou alteraram sua classificação apenas
momentaneamente (Canadá, Itália, Irlanda, Kuwait, Portugal, Reino Unido e
Turquia). Apesar de o Chile, o Irã e a Tailândia terem tido alterações consideráveis,
os grandes destaques são a China, a Coreia do Sul e a Rússia.
Pequim e Seoul possuem uma trajetória notadamente ascendente: a
primeira indo de potência intermediária até mundial (transição em 2010) e a
segunda de menor a intermediária (1978), com curva especialmente acentuada,
aproximando-se, nos últimos anos, do limiar de 820. A Rússia, por sua vez,
descendeu de potência mundial a intermediária em 1986, apenas 5 anos antes
da dissolução da URSS. Linhas verticais no gráfico destacam três datas julgadas
importantes para a discussão proposta: 1991, 2001 e 2008, por representarem,
respectivamente, o fim da Guerra Fria, os atentados de 11 de setembro e a crise
financeira de 2008.
Felipe Lira Paiva; Rafael Mesquita
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Figura 1 — Potências que mudaram de classificação (1975-2017)
Fonte: elaborado pelos autores a partir do WPI.
A classificação atual tem limitações. Primeiramente, apesar dos ajustes,
não se pode escusar completamente os limiares de alguma arbitrariedade ou
conveniência (e.g. 820 e não 818). Segundo, ao invés de escolher limiares
arbitrários, seria também possível tratar as categorias como fixas de modo que
os países não mudassem de classe. Essa abordagem é empregada tanto pelos
criadores do WPI (Valencia e Ruvalcaba 2014; Ruvalcaba, Valencia e González
2016) quanto, implicitamente, pela literatura que encara middlepowermanship
como um atributo identitário (e.g. o Canadá “é um middle power”). Por fim, os
limiares impactam diretamente no tamanho e na composição de cada grupo e,
portanto, na contagem de lideranças de cada segmento. Dessa forma, a resposta
à pergunta “as potências intermediárias aumentaram sua liderança nas OIs após
o fim da Guerra Fria?” dependerá, fundamentalmente, de quantos e de quais
países foram contados como intermediários.
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Apesar desses desafios, o esquema atual se justifica pelos seguintes motivos.
Primeiramente, embora o uso de categorias fixas acompanhasse parte da literatura
e evitasse fronteiras arbitrárias, incorreria em outras distorções, e.g., a Rússia
ou a China seriam incorretamente classificadas como intermediárias em todo o
tempo apesar de suas drásticas mudanças. Ao buscar aderência entre categorias
e literatura, concentrando-se em casos incontestes, nossa abordagem busca o
melhor dos dois mundos: maximizar integridade conceitual e refletir as mudanças
no SI. Reconhecendo, contudo, que diferentes agrupamentos produzirão respostas
diferentes à pergunta de pesquisa, faz-se necessário testar classificações alternativas
como forma de averiguar a consistência dos resultados. Assim, o Anexo a este
artigo, disponível online, analisa a mesma base de dados, porém com uma
classificação fixa derivada de Valencia e Ruvalcaba (2014) e Ruvalcaba, Valencia
e González (2016).5
Resultados
Esta seção está dividida em três. Primeiro, apresentamos os países (62)
que lideraram alguma OI entre 1975-2017. Segundo, descrevemos a trajetória
dos grupos de potências em relação ao número de OIs lideradas. Finalmente,
tecemos breves comentários acerca dos resultados desse texto e da classificação
fixa do Anexo.
Ranking e distribuição das lideranças de OIs entre países
A Tabela 1 apresenta o número de anos em que cada país liderou OIs
(1975-2017). Ao todo, 62 países estiveram à frente de 1.375 casos (organização-
ano). Dentre as dez primeiras posições, os EUA encabeçam o ranking (221),
distantes em 81 OIs-anos da França (140). As oito potências seguintes possuem
valores mais próximos entre si: Japão (60), Suécia (58), Egito (45), Brasil (44),
Nigéria (34), Austrália e Índia (31), Senegal (30) e Reino Unido (29).
5 Anexo disponível em: <https://github.com/felipelirapaiva/PISI/blob/main/Anexo.pdf>. Acesso em 28 mar. 22.
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Tabela 1 — Número de organizações-ano que cada país liderou (1975-2017)
País N País N
Estados Unidos 221 Coréia do Sul, Líbano 19
França 140 Quênia 17
Japão 60 Arábia Saudita, Argentina 16
Suécia 58 Paquistão 14
Egito 45 Bélgica, Fiji, Jordânia 13
Brasil 44 Finlândia, Turquia 12
Nigéria 34 África do Sul, Áustria, Nova Zelândia, Sudão,
Tailândia 11
Austrália, Índia 31
Senegal 30 México, Peru, Sri Lanka, Tanzânia 10
Reino Unido 29 Bulgária, Grécia, Holanda, Kuwait, Mali,
Marrocos, Noruega, Rússia, Serra Leoa, Tunísia 8
Canadá, Suíça 28
Gana 27 Irlanda 7
Argélia, Chile, Dinamarca, Itália 25 Camarões 4
Alemanha, Espanha 23 Equador, Irã 3
China 21 El Salvador 2
Filipinas, Portugal 20 Etiópia, Panamá, Togo, Uganda 1
Fonte: elaborado pelos autores a partir do IO BIO Project (2021).
Os dados da Tabela 1 são categorizados na Figura 2, que apresenta o quinhão
de organizações-ano que cada classificação — e cada país — liderou. A área
total da figura corresponde à totalidade de organizações-ano. Dentre os 11 países
nas 10 primeiras posições, 4 deles são potências mundiais: EUA (1º), França
(2º), Japão (3º) e Reino Unido (10º). Os intermediários são representados por:
Suécia (4º), Brasil (6º), Austrália (8º) e Índia (8º). As menores, por Egito (5º),
Nigéria (7º) e Senegal (9º).
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Figura 2 — Distribuição de OIs lideradas por cada grupo e cada país
Fonte: elaborado pelos autores.
Legenda: potências mundiais em vermelho; intermediárias, verde; menores, amarelo. Países que oscilaram entre
níveis e lideraram OIs podem aparecer em mais de um grupo (e.g., Canadá). Dada a possibilidade de migração, o
total de nomes na figura (69) é maior do que o número de países (62).
A área verde da Figura 2 (intermediários) é a maior do mapa de árvore:
no total, os 31 países lideraram 507 OIs-ano. Os intermediários são seguidos de
perto pelas potências mundiais (n = 8) com 491 OIs-ano. Por fim, as potências
menores (n = 30) lideraram 363 OIs-ano. Em síntese, das 1.361 organizações-ano
existentes6, as potências mundiais lideraram 36,1%, as intermediárias, 37,2%
e as menores, 26,7%.
Essa distribuição pode ser explorada por outro ângulo: a concentração de
lideranças simultâneas por ano. Sabendo que, em um dado ano, um país pode
liderar 0, 1 ou mais OIs, podemos comparar com que frequência um país se
achou à frente de apenas uma organização ou várias de uma só vez. Contabilizar
para cada um dos 62 países qual foi seu total de OIs lideradas em cada um dos
43 anos da série totaliza 2.666 possibilidades em que um país pode ter liderado
6 Ao todo, existem 1.375 organizações-ano disponíveis. Não há, entretanto, valores para o WPI do Líbano entre
1975-1988, período em que o país esteve à frente de 14 OIs-ano. Dada a impossibilidade de classificá-lo sem
o WPI, o total de OIs-ano utilizado para calcular a porcentagem foi de 1.361.
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0, 1 ou mais OIs. Desses casos, em apenas 909 (34,1%) um país liderou, pelo
menos, uma OI.7 Dos 909, em 674 um país liderou apenas uma OI por ano
(74,1%) e nos demais casos houve concentração, isto é, um país capitaneando
2 ou mais OIs num ano. Esses valores, porém, variam bastante entre os grupos,
como observado na Tabela 2.
Tabela 2 — Concentração relativa de lideranças por grupo
Quantidade de OIs lideradas por um
país num ano (%)8
Total de anos em que os países
do grupo lideraram 1 ou mais OIs
1 OI 2 OIs 3 OIs 4+ OIs
Mundiais 27,4 25,6 9,5 37,5 168
Intermediários 79,6 17,7 2,7 0 412
Menores 91,2 7,3 1,5 0 329
Fonte: elaborado pelos autores.
Os EUA foram o país que liderou mais OIs simultaneamente: entre 1992-
1998, eles alcançaram valores de 7, 8 e 9 OIs-ano. Além dos EUA, a França foi o
único país a liderar 5 e 6 OIs concomitantemente (2005-2012). Esse desempenho
se reflete na performance das potências mundiais, para as quais a liderança de 4
ou mais OIs é relativamente comum (37,5%), mas é inatingível para os demais
grupos. Além desses dois países, apenas a China liderou 4 OIs num mesmo ano
(2015-2016), somente após se tornar uma potência mundial de acordo com o WPI.
Coincidentemente, 4 OIs-ano é o menor valor alcançado pelos EUA em toda a
série (1975-1983, 2005-2016), o que demonstra quão extensa foi a sua liderança.
Quando comparamos os demais dados, as discrepâncias tornam-se ainda
mais evidentes. Há tendência de maior concentração conforme o nível de poder
aumenta: em 91,2% dos anos, as potências menores lideraram apenas uma OI.
À medida em que subimos na hierarquia, vemos os intermediários liderando
apenas uma OI por ano em 79,6%, enquanto as potências mundiais lideraram
7 Não deve surpreender que, em 65,9%, dos casos tenhamos países liderando nenhuma OI. Afinal, o total de
OIs disponíveis é, em todo o tempo, menor que o de países candidatos, o que implica que sempre haverá
algum quantitativo de países excluídos da liderança todo ano.
8 O cálculo da porcentagem de OIs lideradas num ano foi feito a partir do valor alcançado e não pelo máximo
possível. Na tabela 2, equivalem à proporção considerando o total de cada linha (i.e. dos 168 casos em que
as potências mundiais lideraram ao menos uma OI, em 37,5% elas lideraram 4 ou mais OIs).
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uma OI em apenas 27,4% dos seus casos. Isso mostra que enquanto é raro
uma potência menor ou intermediária liderar 3 ou mais OIs (1,5% e 2,7%,
respectivamente), as mundiais o fizeram em quase metade dos casos (47%).
Liderança das potências nas OIs ao longo do tempo
Esta subseção foca na questão central deste artigo: afinal, as potências
intermediárias aumentaram sua presença nas OIs após o fim da Guerra Fria?
As Figuras 3 e 4 apresentam o número de organizações que cada grupo liderou
entre 1975-2017. As figuras destacam novamente os anos do fim da Guerra Fria
(1991), dos ataques de 11 de setembro (2001) e da crise financeira (2008).
Figura 3 — Número de OIs por classificação (1975-2017)
Fonte: elaborado pelos autores.
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Figura 4 — Porcentagem de OIs lideradas por grupos de potências (1975-2017)
Fonte: elaborado pelos autores.
Nas Figuras 3 e 4, fica evidente a alternância entre as potências mundiais e
intermediárias como grupo com mais OIs lideradas. Na primeira década da série
(1975-1984), não houve grande distância entre os grupos, mas, como saldo final,
os intermediários estiveram à frente de mais OIs em 8 dos 10 anos. A partir de
1985, nota-se um aumento paulatino dos intermediários, cujo ápice é em 1989
(13 OIs-ano), seguido por uma série de vales e picos até o ano de 1999. Nesse
mesmo período, as potências mundiais aumentaram seu número de OIs-ano,
atingindo 15 OIs em 1997.
A partir do novo milênio, a ascensão dos intermediários acentua-se, enquanto
as potências mundiais mantêm uma estabilidade em 12 OIs-ano entre 2002-2009.
A tendência dos anos recentes mostrou um crescimento das mundiais e um
decrescimento dos intermediários, mas, entre 2016 e 2017, esse movimento parece
inverter-se. Ao longo de toda a série, as potências menores nunca detiveram o
maior destaque, alcançando a segunda posição apenas em 1984. Analisaremos
cada categoria detidamente, começando pelas menores.
As potências menores tiveram estabilidade entre 1975-1992, oscilando entre
7 e 9 OIs por ano. Entre 1993-1995, o grupo liderou entre 6 e 7 OIs, os valores
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mais baixos para toda a série. A partir de meados de 1990, no entanto, há um
crescimento notável, que leva o grupo a 11 OIs (2003) — quase o dobro de 8 anos
antes (1995). A partir de 2006, o grupo entra em outro vale, que dura até 2010
(7 OIs), mas a superação deste ocorre rapidamente e, já em 2014, as potências
menores alcançam novamente 11 OIs-ano e mantêm 10 entre 2015-2017.
Os números alcançados pelo grupo parecem resultar mais da quantidade
de países do que de algum destaque individual. O país com mais lideranças
simultâneas é o Quênia (2013-2017), mas estas somam apenas 3. Apesar do Egito
e da Nigéria serem as potências menores com mais OIs lideradas (Figura 2), eles
nunca estiveram à frente de mais de duas OIs ao mesmo tempo. A Argélia, as
Filipinas e a Jordânia são os únicos outros países da categoria que já lideraram
mais de 2 OIs em um ano.
O caso queniano merece atenção: o país esteve à frente de 17 OIs-anos, o
que o coloca como a 8ª potência menor que mais liderou OIs. Deve-se considerar,
no entanto, que a primeira eleição de um secretário-geral queniano ocorreu em
2011 (IRENA) e, apenas dois anos depois, o país emplacou outros dois (UPU
e UNCTAD). Ou seja, em apenas 6 anos, o Quênia não só fez sua estreia na
liderança de OIs, como alcançou o teto de OIs-ano do grupo.
As potências mundiais, no início da série, aumentam seu número de OIs-ano
de 6 (1975) para 10 (1979). Essa escalada possui dois motivos: primeiro, a França
liderava 2 OIs (1975) e passou a 4 (1979) e, segundo, 2 OIs foram acrescentadas
à soma, pois a classificação de potência do Reino Unido foi alterada — WPI indo
de 815 (1975) para 823(1979). Entre 1979-1990, há estabilidade: as mundiais
lideraram entre 9 e 10 OIs-ano. Dentro do grupo, não houve grandes modificações:
na maior parte do tempo, EUA e França lideraram 4 OIs e, em 1984, Washington
alcançou 6 OIs. Percebe-se que o momento de maior destaque das potências
mundiais ocorre na década imediatamente após o fim da Guerra Fria.
A partir de 1991, as mundiais não lideraram menos que 11 OIs em um ano.
Na década de 1990, o pico da concentração está em 1995 e 1996, momento em
que os EUA, sozinhos, lideraram 9 OIs — 3, inclusive, antes comandadas pelos
intermediários. Com o novo milênio, entretanto, o crescimento foi interrompido
e as mundiais encabeçaram 12 OIs entre 2002-2009. Tal estabilidade, porém, não
capta uma dinâmica interna: enquanto os EUA diminuíram o número de OIs
(5 em 1999 e 4 a partir de 2005), a França foi de 2 OIs (2003) para 6 (2007).
Imediatamente após a crise de 2008, no entanto, observa-se aumento de
OIs lideradas pelas mundiais e, a partir de 2015, vê-se um declínio de 15 para 12
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OIs-ano. Embora a guinada pós-crise de 2008 contrarie as expectativas da literatura,
é necessário fazer uma ressalva. Nota-se que há mais diversidade no grupo: desde
2005, os EUA não lideraram mais que 4 OIs. O aumento das potências mundiais
encontra explicação em outros países que ou conquistaram mais presidências
ou voltaram a liderar OIs: Alemanha, Japão e Reino Unido. O fator principal,
porém, parece ser a ascensão da China à potência mundial: no ano de transição
(2010), o país liderava apenas uma OI e, no biênio 2015-2016, passou a liderar 4,
igualando com os EUA o número de OIs chefiadas simultaneamente.
Os intermediários, por sua vez, foram o grupo que começou a série com mais
lideranças (11 em 1975) e, em dez anos, tornou-se o com menos lideranças (8 em
1984). Há, porém, um aumento vertiginoso em meados de 1980, culminando em
13 OIs (1989). As duas principais razões são novos países liderando e o aumento
da liderança simultânea. Se em 1984, 4 países lideravam 1 OI cada (Índia, Itália,
Suécia, Suíça) e 2 países lideravam 2 OIs cada (Austrália e Dinamarca), em 1989,
há 5 países liderando uma OI (Áustria, Bélgica, Brasil, Espanha e Finlândia) e
outros 4 liderando 2 OIs (Austrália, Índia, Suécia e Suíça).
Entre 1990-2000, não há tendência clara para a trajetória dos intermediários:
houve 3 momentos de vales em 10 OIs (1992, 1996 e 1999-2000) intercalados com
2 picos de 13 OIs (1993 e 1998). Nesse período, o maior destaque é o Brasil, com
3 lideranças simultâneas (1997-2002): UNCTAD, ICAO, OPCW (até 2001) e OHCHR
(a partir de 2001). Além do Brasil, as únicas potências intermediárias a liderarem
3 OIs simultaneamente foram a Dinamarca (1980-1983) e a Coreia do Sul (2016).
A partir de 2001, há uma escalada dos intermediários, que culminará, em
2010, em 16 OIs lideradas — valor não alcançado pelos dois outros grupos.
Nessa década, diferentes países assumem uma OI pela primeira vez ou após um
longo intervalo. Dentre os estreantes, encontram-se: Coreia do Sul (2003), Grécia
(2004), Tailândia (2004), Portugal (2005), Turquia (2005), Chile (2007), China
(2007, ainda como intermediária), África do Sul (2008), Rússia (2010). Dentre os
de retorno, estão: Arábia Saudita (2001, após 18 anos ausente), Holanda (2001,
após 24 anos) e Austrália (2008, após 15 anos).
Os últimos sete anos da série sugerem uma retração dos intermediários (2011-
2015) seguida de uma recuperação (2016 e 2017). É preciso, no entanto, fazer uma
ponderação. Em 2017, o Reino Unido assumiu a liderança de duas novas OIs e
seu WPI estava em 817. Ou seja, contam-se essas lideranças nos intermediários,
o que gera uma discrepância que, se corrigida, daria aos intermediários 13 OIs
e às mundiais, 14 OIs — alterando as posições na Figura 3.
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Além dessa contribuição do Reino Unido, dois países voltaram a liderar
OIs após mais de uma década: Finlândia (2016, após 18 anos) e Noruega (2016,
após 14 anos). Dentre os países que passaram muito tempo sem liderar OIs,
middle powers tradicionais como Austrália, Holanda e Noruega — além
da Bélgica e da Dinamarca, que estão sem liderar OIs desde 1998 e 1987,
respectivamente. Apesar disso, o intermediário que mais liderou OIs foi um middle
power tradicional: a Suécia, que, além de ser o quarto colocado dentre todos os
países (58 OIs-ano) é, também, o intermediário que esteve mais anos à frente
de OIs: a Suécia só não esteve com um secretário-geral em 1997 e no quadriênio
2014-2017.
Pode-se observar essa dinâmica interna dos intermediários repartindo-os
de acordo com o que a literatura chama de tradicionais e regionais. Seguindo a
literatura citada na revisão teórica, no primeiro grupo, consideramos Austrália,
Bélgica, Canadá, Coreia do Sul, Dinamarca, Holanda, Noruega e Suécia. No
segundo, consideramos os BRICS, o México e a Turquia. O critério do WPI foi
mantido, ou seja, as OIs lideradas pela China não são consideradas após 2010
— quando ela transiciona para potência mundial.
Figura 5 — Liderança de intermediários tradicionais e regionais (1975-2017)
Fonte: elaborado pelos autores.
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Ao observar os resultados dessa maneira, percebe-se dois fenômenos. Primeiro,
a aparente estabilidade na porcentagem de OIs lideradas por intermediários
(Figura 4) ou o ligeiro aumento em seu total (Figura 3) esconde uma mudança
interna à categoria. Segundo, o marco da ascensão dos regionais pode ser
associado à crise financeira de 2008. Apesar da subida do grupo ter começado
já em 2006, é apenas em 2010 que os regionais ultrapassam os middle powers
tradicionais, chegando, dois anos depois, à inédita marca de 5 OIs-ano — mesmo
com um país a menos contabilizado (China) — e mantêm-se entre 5 e 7 OIs
entre 2013-2017. Em contrapartida, os tradicionais desceram em número de OIs
lideradas — com a subida recente correspondendo, em grande medida, à Coreia
do Sul, que liderou entre 2 e 3 OIs nos últimos três anos.
Categorização alternativa
Para verificar a estabilidade dessas tendências, as análises foram repetidas
empregando uma categorização fixa dos grupos. Procedimento e resultados
são exibidos no Anexo online. Destacamos como principais achados: primeiro,
enquanto na classificação móvel, de todas as OIs-ano disponíveis, as potências
mundiais lideraram 36,1%, as intermediárias 37,2% e as menores 26,7%, na
classificação fixa, esses valores são 38,2%, 34,1% e 27,6%, respectivamente, de
modo que os intermediários não representam mais, nesse último esquema, o grupo
predominante. Segundo, a concentração relativa de lideranças simultâneas das
potências mundiais é maior na classificação fixa, mas, para os demais estratos,
não apresenta grandes mudanças.
Terceiro, a série histórica do número de OIs presididas por cada grupo
é semelhante para o período imediatamente anterior a 1991 (ascensão dos
intermediários) e década de 1990 (crescimento das mundiais), porém destoante no
que concerne aos anos 2000 (a arrancada dos intermediários é mais pronunciada
na classificação móvel) e 2010 (as potências mundiais estão subestimadas na
classificação fixa desse período, afinal, a classificação móvel conta com a
presença da China no grupo a partir de 2010). De modo geral, contabilizam-se
no esquema fixo mais anos em que o grupo dos intermediários esteve abaixo das
potências mundiais, além de uma instância de ultrapassagem pelas potências
menores entre 2004-2012 que não se observa aqui. Quarto, a dinâmica interna à
categoria dos intermediários demonstra semelhanças. Os resultados encontrados
na divisão entre tradicionais e regionais sob classificação móvel vão ao encontro
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dos padrões evidenciados nas subdivisões “médias” e “regionais” utilizadas no
Anexo. Nota-se que houve um incremento no número de OIs lideradas pelos
regionais — acompanhado de diminuição dos tradicionais ou, no Anexo, de
estabilidade dos médios.
Esse contraste demonstra que alguns dos resultados são contingentes à
forma de agrupamento, enquanto outros não. Ainda que ambas as classificações
não deixem dúvidas sobre o período imediatamente posterior ao fim da Guerra
Fria — marcado, como assinalamos, por um avanço das potências mundiais —,
há uma dissonância sobre quando a ascensão dos intermediários começa. Na
classificação móvel, principia em 2000 — com uma descida a partir de 2010,
causada pela saída da China do grupo —, enquanto, na fixa, esse movimento
dos intermediários poderia ser datado a partir de 2009. De qualquer forma,
fica evidente que os anos recentes foram marcados por maior protagonismo
dos intermediários, pois estes lideraram mais OIs do que em qualquer outro
momento — seja pela classificação fixa ou móvel.
Conclusão
Propusemo-nos a responder se as potências intermediárias aumentaram a
sua liderança nas OIs após o fim da Guerra Fria. A partir dos dados do IO BIO
e da classificação do WPI, afirmamos que as últimas décadas da bipolaridade
deram primazia aos intermediários, mas o imediato pós-Guerra Fria promoveu
acelerada ascensão das potências mundiais — puxadas, sobretudo, pelos EUA,
Alemanha, Japão e Reino Unido. Parece-nos, então, uma reafirmação da ordem
unipolar inaugurada, consoante à David e Roussell (1996/7) e Ikenberry (2017).
Entre 2001 e 2008, há estabilidade dentre as potências globais e ascensão das
intermediárias. Após a crise financeira de 2008, as potências globais oscilam
por movimentos internos ao grupo: como a França (de 6 OIs-ano em 2008 para
1 em 2016) e a China (entrando no grupo em 2010 e chegando a liderar 4 OIs
emum ano entre 2015 e 2016).
O grupo das potências regionais é uma das vedetes do crescimento dos
intermediários nas últimas décadas. Boa parte disso deve-se aos BRICS. Quando
observamos a distribuição de OIs-ano da classe, vemos o período posterior à
crise financeira de 2008 como o de maior crescimento, o que confirma a noção
de que este foi um ponto de inflexão importante. A proximidade da performance
dos regionais (muitos do Sul Global) e as médias (muitas do Norte) vai ao
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encontro da literatura sobre a maior diversidade na camada mediana da política
internacional hoje (Cooper 2013).
Esses achados contribuem para a literatura empírica acerca das potências
intermediárias e dialogam diretamente com Valente, Lopes e Oliveira (2019).
A ascensão das potências mundiais visualizada na década de 1990 está de
acordo com o que Valente, Lopes e Oliveira (2019) encontram no que chamam
de segundo período de concentração, que finda em 1997. Convém destacar o
terceiro período de concentração (2009-2016), que é posterior à crise de 2008,
pois os autores enfatizam a participação da China e da Coreia do Sul (dentre
os cinco países com mais OIs-ano) e que, aqui, se sobressaíram como maiores
aglutinadores de seus respectivos grupos.
Devemos considerar, por fim, algumas limitações deste trabalho. Primeiro,
o intervalo temporal não pôde ser mais longo. Essa omissão nos priva de um
referencial mais amplo do comportamento dos grupos ao longo da era bipolar.
Segundo, não levamos em conta as organizações regionais, que são instituições
caras, sobretudo, aos intermediários não clássicos. Terceiro, a nossa análise é
contingente na classificação do WPI, o que gera casos curiosos, como o Reino
Unido sendo classificado, por vezes, como potência intermediária. Por fim,
sabe-se que grupos regionais no interior das OIs variam no grau de organização e
formalidade em eleições para postos de liderança: uns convencionando rodízios
e listas sucessórias, outros não (Dreher et al. 2014). Isso pode ser uma fonte não
controlada de heterogeneidade afetando a concentração/dispersão da chefia de
OIs. Pesquisas futuras podem se beneficiar da disponibilização de dados deste
artigo e, assim, avançar com novas classificações, outro grupo de instituições
e maior recorte temporal.
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